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Nada é mais perigoso do que ter razão

por Rodolfo Fonseca em Autoconhecimento
Atualizado em 16/09/2024 17:18:16


A busca pelo autoconhecimento me leva a um pensamento inquietante. O ato de querer "ter certeza" me coloca dentro de uma prisão intelectual e emocional, onde o crescimento e a adaptação se tornam impossíveis.

A história da filosofia e do pensamento humano está repleta de exemplos de como a certeza pode ser uma armadilha. Sócrates, talvez o mais famoso dos sábios da Grécia antiga, afirmou que sua maior sabedoria residia em saber que nada sabia. Este reconhecimento de sua ignorância o mantinha em um estado constante de abertura para aprender, questionar e descobrir novas verdades. Para ele, acreditar que se tem razão, ou que se possui a verdade, é fechar a porta para a contínua exploração intelectual e moral.

Ter certeza pode nos tornar rígidos e inflexíveis.

Quando acreditamos firmemente que estamos certos, tendemos a ignorar ou rejeitar informações que desafiam nossa visão de mundo. Esse fenômeno, conhecido como viés de confirmação, impede o autoconhecimento, pois nos coloca em uma bolha de segurança intelectual, onde a dúvida é evitada a todo custo. Se não duvidamos, deixamos de questionar nossas motivações, nossos comportamentos e, por fim, nossa própria identidade.

Se a certeza pode ser um obstáculo para o autoconhecimento, a dúvida se revela como a chave para o crescimento. "Idolatrar a dúvida" não significa viver em constante incerteza ou paralisia; ao contrário, significa manter uma mente aberta, disposta a questionar crenças antigas e a aceitar que o mundo -e nós mesmos- estão em constante mudança.

Os estoicos, uma das escolas filosóficas mais influentes da antiguidade, praticavam a dúvida como um meio de manter o controle sobre suas emoções e reações. Sêneca, por exemplo, sugeria que devemos duvidar não apenas das circunstâncias externas, mas também de nossas próprias reações e interpretações. Ao questionar nossos julgamentos iniciais, podemos evitar decisões impulsivas e agir de maneira mais sábia e ponderada.

A ciência moderna, assim como a filosofia, tem suas bases na dúvida. A metodologia científica, por exemplo, é fundada na ideia de que nenhuma teoria é permanente ou absoluta. Cada hipótese deve ser testada e reavaliada constantemente, em um ciclo interminável de dúvida e revisão. Foi essa postura de questionamento incessante que levou às maiores descobertas da humanidade. Cientistas como Galileu Galilei, que duvidaram das verdades aceitas de sua época, revolucionaram nosso entendimento do cosmos.

Descartes, o pai do racionalismo moderno, também cultivava a dúvida. Em sua obra Meditações, ele começou sua jornada filosófica duvidando de absolutamente tudo, incluindo a existência do mundo externo e até mesmo de seu próprio corpo. O famoso cogito ergo sum "penso, logo existo" foi o resultado de sua busca por uma verdade inabalável, mas foi somente através da dúvida radical que ele pôde alcançar essa certeza.
A dúvida, portanto, não é o oposto da verdade, mas o caminho para ela.

As vezes, duvidar muito de sí mesmo pode levar a um diagnóstico errado de "síndrome do impostor", que é um estado emocional debilitante, onde a pessoa duvida cronicamente de suas habilidades e conquistas, acreditando que é uma fraude, mesmo diante de evidências do contrário. Essa dúvida não leva ao crescimento, mas ao medo constante de ser "descoberto" como incompetente. Ao contrário da dúvida filosófica que nos estimula a questionar o mundo, a síndrome do impostor nos paralisa e nos impede de reconhecer nosso próprio valor e progresso. A chave está em compreender que a dúvida filosófica nos liberta, enquanto a síndrome do impostor nos aprisiona.

O filósofo Friedrich Nietzsche, em sua obra Além do Bem e do Mal, nos alerta sobre o perigo de verdades absolutas. Para ele, a busca pelo conhecimento é uma jornada interminável, na qual a dúvida desempenha um papel central. Ele sugere que devemos amar a dúvida, pois é através dela que mantemos nossa vitalidade intelectual e emocional.

A dúvida é a base da sabedoria, pois abre espaço para a reflexão e o questionamento, o que nos permite evoluir e nos transformar René Descartes.

Ao aplicar esse princípio ao autoconhecimento, somos chamados a questionar nossas suposições sobre quem somos. Muitas vezes, nossas crenças mais profundas sobre nossa identidade e nossos valores são moldadas por influências externas -família, sociedade, cultura- e não por uma compreensão autêntica de nós mesmos.


Hoje, conversando com meu pai pelo whatsapp, encaminhei essa tira do Antônio Abujamra (1932-2015), seu xará, e ele me disse: "não me sinto confortável em sentir dúvida... mas ele deve ter razão". E isso inspirou esse textão. Obrigado pai.


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Rodolfo Fonseca é co-fundador do Site Somos Todos UM
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