Pela janela...
por Rosana Braga em Almas GêmeasAtualizado em 10/09/2020 15:28:53
Abri a janela. Respirei profundamente, como quem tem sede de vida. Senti como que apreendendo o inesperado aprendizado. Repleta de mim mesma, voltei-me para dentro, certa de que este era o lado inquestionável para se estar.
Eis que me perdi. De costas para a luz, deixei de ver a essência. Agora, não era mais a minha que me traria a clareza tão necessária à alquimia do despertar. Era a coletiva. Era o sol do mundo, o invisível dos outros, dos tantos, dos nossos
Precisava agregar e apenas me calei. Esvaziada da compreensão do todo, emudeci. E as palavras se foram pela janela. Sento-me na velha cadeira de balanço na varanda. Busco o embalo do acolhimento. Oca, cabe em mim o mundo inteiro. Mas o vento nada permite aquietar.
Insistente, intenso, de uma frieza que, embora aparente insensibilidade, carrega em seu movimento a profundidade de que anseio. Ele leva de mim o que não pude ler. O que não soube escrever. O que jamais será meu.
Espero. Danço com a cadeira e com o vento. Me canso. Me quero. Nova, outra, mas sem perder a vida vivida. Retomo minha alma na ponta do lápis. Reencontro a paixão que me toma. Somente ela pode transmutar ausência em presença.
Palavras são apenas instantes. Efêmeras. Voláteis. Eternizam-se delicadamente através dos olhos de quem as decifra. Nunca de quem as escreve. Essas, agora, são novas, inéditas. As únicas possíveis, gestadas pelo medo dilacerante da infertilidade literária.
Sou mãe. Sou pai. Sou filha das palavras que me nutrem e me salvam. Letras que dão sentido a quem me torno no momento de parir. Pronto! De novo, eu!
Fecho a janela. Fico do lado de fora. É tempo de se reconectar com a vida que acorda. Lenta, assustada, descansada. Ávida por pulsar todo o amor que está por vir.