A renovação da esperança
por Rodolfo Fonseca em AutoconhecimentoAtualizado em 02/01/2025 12:02:50
O tempo é uma das criações mais intrigantes da humanidade. A ideia de dividi-lo em fatias - anos, meses, dias - é ao mesmo tempo uma necessidade prática e uma ferramenta simbólica que molda nossa forma de ver o mundo.
Recentemente conheci um poema de Carlos Drummond de Andrade, narrado em parte por Antônio Abujamra, com sua característica profundidade e ironia que adoro... Nele o autor observou que dividir o tempo dessa forma, em fatias, foi uma jogada mercadológica brilhante, pois nos leva a um ciclo constante de esgotamento e renovação.
Essa industrialização da esperança, como ele bem aponta, opera em um esquema preciso: 12 meses são suficientes para que nos sintamos desgastados pelas exigências da vida moderna. Trabalhamos, planejamos, enfrentamos desafios e, quase inevitavelmente, chegamos ao final do ano exaustos. E é nesse momento que o milagre da renovação nos abraça.
As festas de fim de ano, mais do que celebrações, são rituais de renascimento. Ao trocar o calendário e comemorar a chegada de um novo número, alimentamos uma poderosa ilusão: a de que tudo pode ser diferente. Esse "milagre" é tanto psicológico quanto cultural. Ele nos permite renovar energias e crenças, mesmo que os problemas e desafios que enfrentamos no ano anterior ainda estejam presentes.
O simbolismo do Ano Novo carrega uma promessa: a de um novo começo. Fazemos listas de resoluções, traçamos metas e, mesmo que inconscientemente, damos a nós mesmos a permissão de acreditar novamente.
Embora o texto de Drummond traga um toque inicial de ceticismo, ele também ilumina uma verdade essencial sobre a natureza humana: a necessidade de esperança. Sem ela, a vida seria um eterno fardo. Mesmo que essa renovação seja, muitas vezes, mais simbólica do que prática, ela nos oferece algo crucial - a oportunidade de recomeçar, de repensar e de, quem sabe, fazer diferente.
As festas de fim de ano são também momentos de pausa, algo cada vez mais raro em nossa sociedade. Elas nos convidam a refletir sobre o que foi vivido e a sonhar com o que está por vir. Mesmo que nem todas as metas sejam atingidas e nem todas as resoluções se concretizem, o ato de acreditar é, em si, transformador.
A divisão do tempo é uma convenção criada para organizar nossas vidas, mas ela se tornou muito mais do que isso. É um alicerce para a cultura, a economia e para as nossas próprias expectativas. Ao final, o que importa não é tanto a precisão da contagem dos dias, mas o que fazemos com eles.
O desafio, então, é usar essa "fatia de tempo" com sabedoria. Reconhecer os limites do milagre da renovação, mas ainda assim abraçá-lo. Afinal, se há algo que aprendemos ao longo dos anos, é que acreditar no novo é o primeiro passo para construí-lo.
Feliz Ano Novo para Você!