Abrir o coração
por Bel Cesar em EspiritualidadeAtualizado em 07/04/2006 11:12:48
Uma vez Lama Gangchen me disse diretamente: “O Caminho do Tantra é maravilhoso, mas só se você quiser abrir o seu coração. Senão, ele se torna um caminho muito difícil de percorrer, e aí não vale a pena”.
As diversas tradições espirituais nos ensinam sobre a importância de abrirmos nossos corações e abandonarmos nossa atitude comumente egocentrada para que haja paz no mundo. A mensagem essencial da filosofia budista consiste, justamente, em nos esclarecer que o apego à nossa auto-imagem é a raiz de todo nosso sofrimento. Pois o hábito de considerar nosso próprio Eu como o único referencial verdadeiro na percepção da realidade está arraigado em nossa atitude mental desde que nascemos.
Abrir o coração é uma atitude pouco familiar em nossa cultura ocidental. Aprendemos tantas vezes a fechar nosso coração para nos proteger, que abri-lo é um grande desafio.
No entanto, conviver com Lama Gangchen Rinpoche nos inspira a enfrentar este desafio. Pacientemente, ele nos ensina a superar o hábito de pensar no que se restringe somente a nós mesmos. Ao seu lado, testemunhamos o valor de um coração verdadeiramente aberto. “Com o coração aberto algo acontece” disse-me ele, certa vez.
O budismo nos mostra que, enquanto nos interessarmos apenas por nós mesmos, nada acontece e os nossos problemas sempre parecerão intransponíveis. Contaminada pela avareza, a mente egocentrada está continuamente preocupada com a idéia do Eu, e torna-se, assim, tensa e angustiada.
Nas rezas da prática de meditação Autocura Tântrica NgelSo elaboradas por Lama Gangchen Rinpoche, recitamos: “Por favor, corte a minha atitude Egocêntrica e abençoe-me para que eu desenvolva a Bodhichitta pura”.
Os Bodhisattvas (Bodhi: iluminação; Sattva: ser) dedicam suas vidas a atingir a Iluminação com o propósito de beneficiar a todos os seres, ou seja, a felicidade alheia está incluída em seu processo de evolução. Eles não visam apenas o bem-estar pessoal, pois compreenderam que a atitude mental egocentrada impede de manter a mente estável e livre de estados mentais negativos. Buscam, assim, desenvolver a Bodhichitta (Bodhi: iluminação; chitta: mente): um estado mental conhecido como “mente de Iluminação” ou seja, um estado mental que favorece a Iluminação. Esta é uma atitude que requer sabedoria, uma mente clara e também aberta.
O caminho espiritual nos chama para a abertura: ter empatia pelos outros, reconhecer que estamos todos interligados. Enquanto estivermos presos por uma visão egocentrada, intensificada pela idéia de que somos seres separados uns dos outros, não poderemos ser empáticos, pois estaremos limitados pela carência de ser constantemente reconhecidos por eles.
Somente quando estamos bem conosco, temos energia disponível para perceber o outro. De fato, precisamos, antes de tudo, abrir nosso coração para nós mesmos. Cultivar a auto-estima, portanto, reconecta-nos com a sabedoria da interdependência.
Pema Chödrön, escreve em seu livro Quando tudo se desfaz: instruções para tempos difíceis (Ed. Gryphus): “Quando nos tornamos mais perspicazes e compassivos diante de nossas próprias dificuldades, espontaneamente sentimos mais ternura pelos outros seres humanos. Ao conhecer nossa própria confusão, ficamos mais dispostos e capazes para colocar a mão na massa e tentar para colocar a mão na massa e tentar aliviar a confusão dos outros”.
Extraído do livro “O livro das Emoções” de Bel Cesar, Ed. Gaia.