Agitação mental: quando a mente pula de galho em galho
por Bel Cesar em EspiritualidadeAtualizado em 30/09/2005 12:18:47
A consciência relativa é simbolizada por um macaco que pula de galho em galho. Assim como explica Lama Gangchen Rinpoche em seu livro Autocura Tântrica III (Ed. Gaia): “O resultado da causa e condição do surgimento interdependente negativo das ações projetoras é nossa consciência-macaco surgida interdependentemente, que se move ininterruptamente para cima e para baixo da árvore do samsara, sem conseguir ficar quieta nem por um momento. Nosso fluxo de consciência e de energia de vida está sempre instável, sempre movendo-se em meio à escuridão e à luz dos reinos inferiores e superiores. Nossa consciência surgida interdependentemente faz com que as sombras de nosso apego e raiva egoístas se desenvolvam e cresçam: a autodestruição - o oposto da autocura”. A mente inquieta, movida pelo condicionamento do apego e da raiva, busca então, freneticamente, por equilíbrio.
Certa vez Lama Gangchen disse em seus ensinamentos: “Nossa mente é como uma bolinha solta no ar, ao mais leve toque ela se agita e move-se sem parar. Meditar é ensinar a nossa mente a ficar estável no ar”. No entanto, este é um longo caminho. Por meio da meditação podemos aprender a estabilizar a nossa mente, isto é, experimentar as coisas diretamente como são, no momento presente.
No entanto, nossa mente condicionada em geral está agitada, lembrando do passado e preocupando-se com o futuro. Na meditação, como uma forma de autoconhecimento profundo, treinamos nossa mente a voltar-se para o momento presente. Pois é preciso desacelerar a mente para observá-la melhor. Desta forma, ao passo que nos soltarmos gradualmente dos padrões de pensamentos repetitivos, poderemos recuperar o equilíbrio interno e nos tornarmos cada vez mais próximos do fluxo natural de nossa mente, não contaminado pelo apego ou pela raiva.
Apesar de associarmos a palavra consciência a um estado de clareza mental, a denominação consciência relativa para o terceiro Elo de Interdependência indica um baixo nível de elaboração mental, pois ele refere-se à dinâmica do movimento de nossa mente e não ao conteúdo que ela revela. Assim como esclarece Heloisa Gioia em seu livro Um caminho Iluminado (Editorial Cone Sul): “O nível de Consciência neste elo da cadeia interdependente é o mesmo nível de Consciência que tem o pular do macaco, de galho em galho, sem saber por quê e para quê. É como nós, que pulamos de uma situação para outra, de um interesse para outro, de uma paixão para outra, sem termos a clareza do por quê e para quê. É uma consciência ainda parcialmente estruturada, uma simples decorrência da Motivação Ignorante que a impulsionou. É a energia de base sobre a qual estão nossos pensamentos”.
Se esta energia de base for positiva, o resultado do impulso de nossos pensamentos também será positivo. Lama Gangchen denomina esta energia de base positiva de Mente de Paz.
Lama Gangchen Rinpoche nos ensina: “Uma mente tensa é como estar com as mãos tensas: você não consegue tocar nada. Por isso, precisamos nos decidir por não cultivar uma mente estúpida e nos programar com algo muito preciso. É só uma questão de não seguir as emoções negativas, de aceitar a paz e segui-la. Depois de ter paz, tudo passa a vir automaticamente de modo positivo. Assim, é possível criar a interdependência positiva. Se você quer deixar o seu namorado feliz, esteja interiormente bem, porque assim criam-se condições de harmonia para a relação. Nossa inquietação afasta o outro”. De fato, a inquietação interna nos afasta até de nós mesmos: ficamos deprimidos. A falta de concentração indica que estamos sofrendo queda na produção de um neurotransmissor, a dopamina.
A dopamina orienta a atenção e produz uma sensação de expectativa prazerosa. Ela age diretamente sobre os neurônios responsáveis pela memória de trabalho. Stefan Klein explica em A Fórmula da Felicidade (Ed. Sextante): “Na opinião de alguns cientistas, uma das principais funções dessa substância é fazer com que o cérebro saiba distinguir entre informações importantes e ruídos, definidos como estímulos que não contêm dados relevantes para nós. É possível que o ato da concentração esteja associado a um lubrificante do intelecto. Sob sua influência reagimos e pensamos com mais rapidez. Além disso, fazemos associações com mais facilidade, e as idéias nos surgem aos borbotões, pois o cérebro é capaz de processar as informações com mais eficiência. Isso explicaria o aparente paradoxo de que uma concentração intensa e um máximo de esforço mental produzam simultaneamente sentimentos agradáveis”. Portanto, o que nos desgasta não é o esforço mental em si, mas ter uma dinâmica mental desordenada e confusa.
No entanto, se quisermos evoluir internamente não basta encontrarmos atividades mentais que organizem nossa mente. Precisamos desenvolver também um bom coração.
Os mestres budistas nos ensinam a aprender a diferença entre a mente-coração e a mente pensante. A mente pensante está sempre insatisfeita, enquanto que a mente-coração manifesta-se sempre tranqüila. Quando acessamos a mente-coração vemos tudo com clareza. Pois ela é o fluxo natural de nossa energia de base positiva, a mente de paz.
Ao passo que relaxamos em nossa qualidade de base energética positiva, conseguimos pouco a pouco romper o hábito de atacar ou defender, seja de nós mesmos ou dos outros. Uma vez menos reativos, nos tornamos mais suaves. A suavidade é uma qualidade inerente a essa energia de base pura: ela indica que finalmente acessamos a mente-coração.
Última atualização em 21/8/6