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Como ter compaixão por aqueles que nos fazem sofrer

por Bel Cesar em Espiritualidade
Atualizado em 22/10/2009 16:06:07


Como vimos na semana passada, não é tão difícil de reconhecer um psicopata: eles são narcisistas, pensam muito e sentem pouco. Tomam decisões com base em como podem ser beneficiados com prazer, auto-satisfação, poder, status e diversão. O livro “Mentes Perigosas”, da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, revela-nos uma realidade difícil de ser assimilada: uma pessoa pode ter uma limitação biológica que a faz sedutora, inteligente e nada empática.

Em geral, o termo psicopatia nos leva a pensar numa pessoa de mau caráter, como os criminosos, estupradores e golpistas. Por isso, temos de ser cuidadosos ao reconhecer as características de uma pessoa que sofre de psicopatia leve: ela pode não ser uma pessoa com intenções negativas, mas será, sim, um narcisista em busca de satisfazer apenas os seus prazeres imediatos. Vai mentir e manipular. Com as desculpas mais nobres, justificará seus atos, tornando-se uma vítima declarada diante de qualquer circunstância.

É muito duro conviver com pessoas que não são capazes de se responsabilizar por seus atos conscientes, porém, inconseqüentes. Afinal, eles sabem o que fazem, mas como não sentem culpa, remorso, nem temem punição, seguem em frente agindo por interesse próprio, justificando seus atos, racionalmente. Aliás, alguns costumam pedir “desculpas” quando são flagrados. Eles gentilmente dizem: “Você tem razão, desculpe”. Mas eles não mudam! Continuam sendo descaradamente como são: abusivos.

Se admitirmos que certas pessoas são assim e não vão mudar, cabe a nós mesmos reconhecer os limites de uma relação baseada na falta de trocas afetivas e ter atitudes coerentes com essas constatações. Por exemplo, uma vez que já sabemos que elas não vão cumprir suas repetidas promessas, temos de parar de lhes dar “novas chances”.

Em outras palavras, temos que agir conforme a realidade se mostra possível. Portanto, seja realista quanto ao que esperar de uma pessoa que não sabe se colocar no seu lugar e pede constante atenção.

A vida não é um mercado livre. É preciso ter clareza do quanto somos capazes de oferecer sem trocar. De fato, muitas vezes damos sem pensar em receber algo em troca. É natural ser generoso e compartilhar o que temos para oferecer. Mas isto só é possível e saudável enquanto não estivermos sendo prejudicados, nem prejudicando outras pessoas ao nosso redor em prol de uma pessoa que não mede seus atos inconseqüentes.

O fato é que temos de lidar com a frustração de que esta não é, nem será, uma relação equilibrada. Conforme o grau de envolvimento e proximidade, muitas vezes temos que aceitar esta limitação, pois não há como nos afastarmos totalmente das situações geradoras de frustração.

A frustração é um sentimento decorrente do não recebimento de uma gratificação esperada. Ela “apaga” nosso impulso de vida, uma vez que gera sentimentos de incompetência, desvalor, vulnerabilidade e uma percepção de fracasso iminente.

Por isso, temos que conhecer muito bem a natureza da situação na qual nos encontramos, para não identificarmos suas limitações como sendo de nossa própria pessoa.

Não podemos resolver tudo! Não podemos ser aquele que sempre cede e nega suas necessidades porque pensa que fazendo assim, “tudo estará resolvido”.

Se quisermos continuar evoluindo internamente, não podemos ficar paralisados pela dor da frustração. Então, o que fazer?
O budismo nos inspira a sermos guiados pela sabedoria da compaixão. Yongey Rinpoche, em seu livro Alegria de Viver (Ed. Campus), escreve: “Quanto mais claramente vemos as coisas como são, mais dispostos e capazes nos tornamos de abrir nossos corações a outros seres”. Ao aprender a ver de onde a outra pessoa está vindo, qual é sua real condição, teremos menos chances de nos envolvermos num conflito, pois a clareza de saber distinguir as nossas limitações das limitações criadas pela outra pessoa irá nos proteger de não continuarmos a agir unilateralmente.

O budismo nos ensina que, para cultivarmos a compaixão, temos que seguir um caminho gradual. Ir percorrendo gradualmente três níveis de evolução. O nível Um envolve aprender a desenvolver um tipo de atitude compassiva em relação a si mesmo, assim como aos outros ao seu redor. O nível Dois significa desenvolver uma bondade amorosa baseada no altruísmo. O nível Três trata de cultivar uma compaixão suprema, baseada no reconhecimento de que este é o potencial mais puro de um ser humano.

Por enquanto, vamos praticar o nível Um. Para ter compaixão, é preciso sentir algo de positivo que você queira compartilhar. Ou seja, só podemos dar felicidade com felicidade. Por isso, o primeiro passo é reconhecer a sua própria força.

Yongey Rinpoche explica que a palavra sânscrita para “ser humano” é purusha, que basicamente significa “algo que tem força”. Esta é a base do nível Um: despertarmos nossa força para realizarmos algo que queremos muito: continuar evoluindo interiormente. Para tanto, Rinpoche sugere uma meditação:

“Após alguns momentos repousando sua mente na meditação sem objeto, faça um rápido ‘exercício de escaneamento’, observando gradualmente, seu corpo físico. À medida que escaneia seu corpo, permita-se reconhecer como é maravilhoso ter um corpo, bem como uma mente capaz de escaneá-lo. Permita-se reconhecer como esses fatos são básicos de sua existência são magníficos, como você tem sorte de ter os dons deslumbrantes de um corpo e de uma mente! Repouse nesse reconhecimento por um momento e então, gentilmente, inclua o seguinte pensamento: ‘Como seria bom se eu pudesse sempre desfrutar esse senso de bem-estar. Como seria bom se eu pudesse sempre desfrutar esse senso de bem-estar e todas as causas que me levam a me sentir feliz, tranqüilo e bem’. Então, somente permita que sua mente repouse, aberta e relaxada. Não tente manter essa prática por mais de três minutos se estiver praticando formalmente ou mais de alguns segundos durante sessões de meditação informal”.

Parece óbvio, mas não é: a base da compaixão está em nossa capacidade de reconhecer nosso bem-estar. Em geral, focamos nossa mente nos problemas. Mas, ao treinar a compaixão, iremos aprender a focar as soluções!

Depois que desenvolvemos a compaixão por nós mesmos, somos capazes de sentir o que os outros sentem, ao mesmo tempo em que nos mantemos fiéis à nossa base de equilíbrio. Assim, podemos acolher o outro sem nos desconectarmos da sensação básica de bem-estar. Ajudar sem nos auto-anular é bom para ambas as partes.



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bel
Bel Cesar é psicóloga, pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo Tibetano desde 1990. Dedica-se ao tratamento do estresse traumático com os métodos de S.E.® - Somatic Experiencing (Experiência Somática) e de EMDR (Dessensibilização e Reprocessamento através de Movimentos Oculares). Desde 1991, dedica-se ao acompanhamento daqueles que enfrentam a morte. É também autora dos livros `Viagem Interior ao Tibete´ e `Morrer não se improvisa´, `O livro das Emoções´, `Mania de Sofrer´, `O sutil desequilíbrio do estresse´ em parceria com o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz e `O Grande Amor - um objetivo de vida´ em parceria com Lama Michel Rinpoche. Todos editados pela Editora Gaia.
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