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Confiar no futuro nos ensina a morrer em paz

por Bel Cesar em Espiritualidade
Atualizado em 23/07/2004 11:22:30


Certa vez, perguntei a Lama Gangchen como poderia saber quando estaria preparada para lidar positivamente com a minha própria morte. Ele me respondeu: “Quando a sua mente não tiver dúvidas quanto ao seu futuro. No momento da morte, a idéia que temos de nosso futuro servirá de base para a projeção das vivências que virão a seguir”.

Associei esta idéia a algo similar a ligar uma TV: a primeira imagem que surge na tela nos indica o canal em que ela estava quando foi desligada pela última vez.

Em seu livro NgelSo Autocura Tântrica III (Ed.Gaia), Lama Gangchen explica porque isso ocorre “A última mente grosseira do momento da morte (quando a respiração cessa) ativa o karma que nos projeta para a próxima vida. Morrendo com uma mente feliz e em paz, teremos uma próxima vida feliz e em paz. Por isso, temos que enfrentar a morte agora”. Portanto, ao acompanhar uma pessoa que está falecendo, a principal meta deve ser ajudá-la a ter uma mente positiva no momento de sua morte.

O Budismo não vê a morte como um evento isolado, mas sim como uma das mudanças de um ciclo infindável de mudanças. Ele nos ensina a viver positivamente as mudanças e é, neste sentido, que ele nos prepara para a morte.

Se cultivarmos o hábito de lidar positivamente com as mudanças cotidianas, estaremos educando nossa mente a direcionar-se ao que é luminoso: ausência de medo e dúvidas.

Uma visão positiva de nosso futuro gera, simultaneamente, confiança em nosso presente. Assim como o futuro é menos assustador quando sentimos segurança no presente. Neste sentido, se aprendermos a ver além do momento imediato e a confiar no fluxo de continuidade positiva, não teremos dificuldade em nos soltar no presente.

Para compreender melhor como nossa mente avalia o futuro, podemos, diariamente, observar como lidamos com as oportunidades que surgem: sou capaz de me ver numa situação próspera ao confrontar algo novo e desconhecido?

Vivenciamos a morte na vida cotidiana nos momentos em que as coisas não estão funcionando como desejávamos ou prevíamos. Podemos aprender a lidar com nossas dificuldades cotidianas como uma prática de aceitação emocional de nossa morte futura. “Ter um relacionamento com a morte na vida diária significa ser capaz de esperar e de relaxar na insegurança, no pânico, no constrangimento, naquilo que não vai bem”, escreve Pema Chödron em Quando tudo se desfaz (Ed Gryphus).

Algumas pessoas sabem lidar com os imprevistos de modo natural, sem alarmes. Mas, a maioria de nós, não está preparada para lidar com o caos: tememos as situações que estão fora de controle. Não estamos familiarizados com a idéia de contar apenas com a nossa capacidade interna. No entanto, existem momentos na vida em que a única esperança de sair de uma situação caótica é termos capacidade de transformação interior. Como diz o mestre Zen Suzuki Roshi: “Apenas esteja disposto a morrer continuamente”.


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Bel Cesar é psicóloga, pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo Tibetano desde 1990. Dedica-se ao tratamento do estresse traumático com os métodos de S.E.® - Somatic Experiencing (Experiência Somática) e de EMDR (Dessensibilização e Reprocessamento através de Movimentos Oculares). Desde 1991, dedica-se ao acompanhamento daqueles que enfrentam a morte. É também autora dos livros `Viagem Interior ao Tibete´ e `Morrer não se improvisa´, `O livro das Emoções´, `Mania de Sofrer´, `O sutil desequilíbrio do estresse´ em parceria com o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz e `O Grande Amor - um objetivo de vida´ em parceria com Lama Michel Rinpoche. Todos editados pela Editora Gaia.
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