Equilíbrio
por Maria Guida em EspiritualidadeAtualizado em 13/10/2003 10:39:46
Lentamente, tirei os pés dos sapatos e pisei no tatame.
Um arrepio delicado, quase nada, pouco mesmo, subiu pelas minhas pernas, espinha dorsal acima, em direção ao alto da cabeça.
Senti a conexão firme, como um raio laser, um fio de luz lilás, transparente como cristal.
Não havia nenhuma outra certeza. Dúvidas também não.
Meu corpo não sabia o que era Tai-chi. Mas isso não o impedia de mover-se, quase alegre, ao compasso lento e ritmado da respiração.
Reparei que os movimentos nasciam um do outro, o peso do corpo instintivamente transferido, de uma perna para outra, sem complicação.
Assim que a mente saiu do estado inicial de espanto, percebi claramente a voz do instrutor.
- Está gostando?
- Com certeza que sim.
- Então sorria... Não é tão difícil mover para cima os cantos da boca.
Quando foquei a atenção nos músculos faciais, já estava sorrindo.
Depois do Tai-chi veio a dança. E depois da dança, um tempo enorme de completa imobilidade. Ficamos assim, por mais de uma hora, naquela sala enorme e vazia.
Ele falava lento, bem dentro da minha caixa craniana, com sua voz grave, seu leve sotaque britânico, suas frases curtas.
Não queria nada de mim além de abandono, confiança e integridade.
Não fazia exigências, nem me dava lições de moral.
Apenas me transmitia seu imenso amor, incondicional.
Numa seqüência de imagens mentais, que eu podia revisitar à vontade, indo e voltando, como numa ilha de edição digital, me contou a nossa história.
Nossos elos de cooperação eram muito fortes, quase impossíveis de ser quebrados.
Nossas muitas vidas se entrelaçavam, formando um emaranhado, às vezes denso, outras vezes luminoso, cruzando todas as dimensões.
Vi dias negros. Vi muita luz. E agora, aquela paz. O chacra do coração era uma esfera que emitia raios, em rosa e dourado, para fora do peito.
Meus olhos ficaram marejados. Não havia mais nada a desejar. Apenas ser. Apenas estar.
Isso não é fragmento de um conto.
Também não é fruto da minha imaginação.
Aconteceu de fato, no dia do meu aniversário, em Nazaré Paulista. Mais exatamente, no Centro de Meditação criado por Trigueirinho e Sara Marriott
Eu estava completando quarenta e sete anos, e queria ficar sozinha.
Confidenciei isso a um casal de amigos com quem fazia biodança, e logo, o que deveria ser um retiro espiritual virou uma pequena festa.
Era uma tarde de Sábado.
Havíamos terminado um vivência muito intensa.
O grupo se dispersou, e eu acabei ficando para trás.
O dia estava lindo, a vista era maravilhosa. O sol se punha.
Eu já havia calçado os sapatos para me retirar, quando percebi que o som estava ligado. Resolvi atravessar o salão para desligar.
E foi assim que tudo começou.
Vou estar mentindo se disser que foi a primeira vez.
Também mentiria se dissesse que tinha, naquela altura, o mesmo domínio sobre mim mesma ou os conhecimentos sobre conexão e canalização de que disponho hoje.
Mas não minto quando afirmo que foi uma experiência reveladora e inesquecível, assim como outras que ocorreram antes e depois.
Se há entre vocês, amados freqüentadores deste site, alguém que deseja intensamente experimentar a conexão com seus instrutores internos, apenas acredite que todo ser humano é capaz de obtê-la, em todo o seu esplendor, não apenas uma vez, mas sempre que desejar.
Muitos já conseguiram e nos contaram os passos que deram para chegar até lá.
Basta trabalhar muito sobre si mesmo, abrir-se para o novo, aceitar o que vier, como uma bênção, e nunca, nunca, desistir de tentar.
O que está embaixo é como o que está no alto.
O essencial é invisível aos olhos.
Tudo o que precisamos está dentro de nós.
Porque somos todos um.