Finais e Recomeços
por Elisabeth Cavalcante em EspiritualidadeAtualizado em 23/12/2004 18:47:28
Embora já tenha se tornado lugar comum, ao final de cada ano, realizarmos um balanço daquele que passou e traçarmos metas e objetivos para o que se inicia. Vou abordar, mais uma vez, esse tema, porém tentando colocá-lo sob uma outra perspectiva.
Quero dirigir-me especialmente àquelas pessoas para as quais o ano de 2005 foi difícil e trouxe acontecimentos e desafios quase impossíveis de serem transpostos.
Notem que eu disse quase impossíveis, e é exatamente aí que reside a diferença. Quando nos encontramos no meio de uma tormenta emocional e nossa vida passa por mudanças radicais, com as quais não contávamos, é natural que tenhamos a impressão de que não vamos conseguir encontrar forças para nos reerguer.
A diferença entre o ‘quase’ e o ‘totalmente’ impossível reside dentro de cada um de nós. Se colocarmos em nossa mente a crença de que jamais conseguiremos voltar a sorrir, sem dúvida alguma essa realidade se manifestará em nossa vida.
Porém, se ao contrário, buscarmos interiormente a força, a confiança e a certeza de que este ano difícil, ao terminar, encerrará de maneira definitiva um ciclo em nossa trajetória, conseguiremos atrair, de modo infalível, a energia do renascimento, de um novo recomeço.
É exatamente assim que precisamos encarar cada ano que termina, como uma etapa já cumprida de nossa vida, ficando com as boas lembranças dos frutos que colhemos e abandonando de vez as memórias negativas, deixando para trás tudo o que nos causou mágoa e sofrimento.
Só assim estaremos prontos para a verdadeira renovação.
Numa situação confusa, de perturbação, o que fazer?
Por favor, não faça nada. Você criou uma confusão por causa do seu fazer excessivo. Você é um tamanho fazedor, você confundiu tudo à sua volta - não somente para si mesmo, mas para os outros também. Seja um não-fazedor; isso será compaixão para consigo mesmo. Seja compassivo. Não faça nada, porque com a mente falsa, com uma mente confusa, todas as coisas se tornam mais confusas. Com uma mente confusa, é melhor esperar e não fazer nada de forma que a confusão desapareça. Ela desaparecerá; nada é permanente neste mundo. Você só precisa uma profunda paciência. Não seja apressado.
Vou lhe contar uma história. Buda estava viajando através de uma floresta. O dia estava quente. Era exatamente meio-dia e ele sentiu sede; assim, disse para seu discípulo Ananda: "Volte. No caminho, nós atravessamos um pequeno riacho. Volte lá e traga um pouco d’água para mim".
Ananda voltou, mas o riacho era muito pequeno e algumas carroças estavam atravessando-o. A água estava agitada e tinha se tornado suja. Toda a sujeira que estava assentada nele tinha vindo para cima e a água não era mais potável agora. Assim, Ananda pensou: "Eu tenho que voltar". Ele voltou e disse para Buda: "Aquela água se tornou absolutamente suja e não está boa para se beber. Permita-me ir à frente. Eu sei que existe um rio a apenas alguns quilômetros de distância daqui. Eu irei e buscarei água para você".
Buda disse: "Não! Volte ao mesmo riacho". Como Buda tinha dito isto Ananda tinha que seguir a ordem. Mas ele a seguiu sem entusiasmo, pois sabia que a água não podia ser trazida. E tempo estava sendo desnecessariamente perdido! E ele estava com sede, mas como Buda disse para ir, ele tinha que ir.
Novamente ele retornou e disse: "Por que você insiste? A água não está potável".
Buda disse: "Vá novamente". E como Buda havia dito para voltar, Ananda teve que ir.
A terceira vez que ele chegou ao riacho, a água estava tão clara quanto ela sempre esteve. A sujeira tinha ido embora, as folhas mortas tinham ido embora e a água estava pura novamente. Então Ananda riu. Ele trouxe a água e veio dançando. Ele caiu aos pés de Buda e disse: "Seus meios de ensinar são miraculosos. Você me ensinou uma grande lição - que apenas a paciência é necessária e que nada é permanente".
E este é o ensinamento básico de Buda: nada é permanente, tudo é transitório - assim por que ser tão preocupado? Volte ao mesmo riacho. Então, tudo deve ter mudado. Nada permanece o mesmo. Apenas seja paciente: vá novamente e novamente e novamente. Apenas alguns momentos e as folhas terão ido embora e a sujeira terá se assentado novamente e a água estará pura novamente.
Ananda também perguntou a Buda, quando ele estava voltando pela segunda vez: "Você insiste que eu vá, mas eu não posso fazer alguma coisa para tornar aquela água pura"?
Buda disse: "Por favor, não faça nada; do contrário você a tornará mais impura. E não entre no riacho. Apenas fique do lado de fora, esperando, na margem. Sua entrada no riacho criará uma confusão. O riacho flui por si mesmo, assim deixe-o fluir".
Nada é permanente; a vida é um fluxo. Heráclito disse que você não pode pisar duas vezes no mesmo rio. É impossível pisar duas vezes no mesmo rio porque o rio fluiu; tudo mudou. E não somente o rio fluiu, você também fluiu. Você também é diferente; você também é um rio fluindo.
Veja esta impermanência de todas as coisas. Não tenha pressa; não tente fazer nada. Apenas espere! Espere em um total não-fazer. E se você pode esperar, a transformação estará presente. Este próprio esperar é a transformação.
Osho, The book of the Secrets, V3, # 38