Mitologia Nórdica - Parte 1
por Acid em EspiritualidadeAtualizado em 08/04/2020 11:34:53
A mitologia nórdica (também chamada de mitologia germânica, viking ou escandinava) se refere a um conjunto de crenças e lendas dos povos escandinavos, incluindo aqueles que se estebeleceram na Islândia, onde a maioria das fontes escritas para a mitologia nórdica foi construída. Como veremos, sua influência se estendeu por toda a Europa, especialmente a Inglaterra, de onde pudemos apreciá-la em obras como O Senhor dos Anéis e Harry Potter. Mas meu primeiro contato com essa mitologia foi mesmo com os gibis de Thor (que, aliás, vai virar filme em 2011). Nessa primeira parte vou falar da cosmogonia nórdica, e de como os mundos estão estruturados, para na segunda parte falar mais dos personagens e suas lendas. Uma coisa que percebi é que há muita confusão entre nomes de lugares e raças, então procurei compilar o máximo de informações, e o resultado abaixo é o que me parece ser mais confiável:
No início havia o Nada (Ginnungagap), que remete à noção grega do "Caos". Um imenso vazio, que se estendia até o Norte, a Terra do Gelo (Niflheim), e o Sul, a Terra do Fogo (Muspell). Separadas pelo Nada, essas forças de frio e calor, contração e expansão, estavam inertes. Até que Deus, o Criador de todas as (E até dos Deuses, pois este não é mortal, como os outros o são. Explico mais adiante.) coisas(*), aquele que não tem nome e que é citado apenas na Criação e no fim dos tempos, respira, e suas baforadas unem frio e calor, compondo flocos de neve que foram se aglutinando até formar o primeiro ser: um gigante de gelo chamado Ymer, que deu origem a vários outros gigantes. Essas criaturas alimentavam-se do leite da vaca primordial Auðhumla que, por sua vez, alimentava-se lambendo o sal dos blocos de gelo. Numa dessas lambidas revelou-se a forma de uma nova criatura, cuja raça ficou conhecida como (Uma classe de deuses cuja origem podemos associar, etimologicamente, aos Asuras da Índia, entidades que governavam os princípios morais e sociais (enquanto os Devas cuidavam da natureza). Acredito que no mundo de O Senhor dos Anéis os Aesir estejam relacionados aos Valar e na mitologia grega aos deuses do Olimpo.) Aesir(*). Esse primeiro Aesir se chamava Buri, que teve (não sei como) um filho, Bor, que se casou com a filha de um dos gigantes e assim tiveram três lindos e importantes filhos: Odin, Vili and Vé. Esses três são simplesmente a (Odin é o espírito que vivifica, Vili é a vontade que dispõe, e Vé é o sagrado que purifica. Comparado à Trindade cristã, Odin seria equivalente ao Pai, o manda-chuva dos três.) Santíssima Trindade Nórdica(*), pois eles detêm o poder de trazer ordem ao Caos. Eles matam o gigante Ymer, dilaceram suas formas e com seus restos ajudam a compor o Universo (especialmente nosso mundo).
No centro do Nada está uma gigantesca (Algumas fontes dizem que é um fresno (freixo), outras que é um teixo.) árvore(*) chamada Yggdrasil, o eixo dos (Na prática esses mundos são como lugares, mas nunca é bem explicada a posição deles na árvore, então especula-se que obedeçam à ordem que apresentarei em seguida.) nove mundos(*). Suas imensas copas chegam aos céus, podendo dessa maneira sempre estar banhadas por uma luminosa nuvem que orvalha Hidromel (a bebida favorita dos deuses, que garantia a eles a longevidade), que tem por função revitalizar automaticamente a imensa árvore. Os galhos mais altos serviam de moradia ao Galo de Ouro, que tem a responsabilidade de guardar os horizontes e denunciar aos deuses a aproximação de seus eternos inimigos, os gigantes. Logo abaixo, mas ainda no topo, há uma águia (Hraesvelg) que, ao bater de suas asas, produz o vento que sopra por todos os mundos.
Abaixo dela temos Asgard ( (O nome original era Godheim (lar dos deuses), mas os primeiros pesquisadores da mitologia confundiram a região como se fosse o castelo/cidade mais importante do local, que se chamava Asgard.) Terra dos Aesir(*)), governado por Odin e sua esposa, Frigga. É lá que fica o Valhala (Salão dos assassinados), local onde os guerreiros vikings eram recebidos após terem morrido com honra, em batalha. Metade das almas passa seus dias treinando em combates, e desfrutando de grandes banquetes e orgias à noite. Elas formam o "Exército das Almas Vivas". A outra metade segue para Folkvang, o palácio de Freyja.
Também nos galhos se encontra Vanaheimr (Lar dos Vanir), que são uma outra categoria de deuses, ligados à fertilidade, prosperidade, sabedoria e capacidade de ver o futuro (enquanto os Aesir são mais guerreiros e ligados à magia). Há muita rivalidade entre esses dois tipos de deuses.
Ainda no alto, temos Álfheimr, o Lar dos Elfos. É onde vivem os (Aqueles vistos na saga O Senhor dos Anéis. J.R.R Tolkien, o autor do livro, traduziu o nome do lugar para `Elvenhome´ (`Eldamar´, na língua dos Elfos).) elfos luminosos(*), criaturas de beleza inenarrável. Brilhantes como o Sol, vestem-se de forma delicada e transparente. São amigos de homens e deuses.Odin e seus irmãos usaram o corpo do gigante Ymir para criar Midgard ( (O mesmo nome da terra antiga e fictícia de Tolkien. Aliás, ele dizia que os eventos do seu livro aconteceram em nosso mundo, e que a `Terceira Era´ de seu livro teria terminado 600 mil anos antes do nosso tempo atual.) Terra Média(*)), o (Assim como Asgard, originalmente Midgard era conhecido como Mannheim (Lar dos homens), mas também confundiram o nome do mundo com o seu castelo/cidade mais importante.) mundo dos homens(*), situado em volta do tronco de Yggdrasil. A carne de Ymir se tornou a terra. O sangue formou lagos e oceanos. Dos ossos, formaram-se as montanhas. Seus dentes e fragmentos de ossos são as pedras. Os cabelos formaram árvores. O crânio de Ymer formou o céu, e foi sustentado no alto por 4 anões, chamados Norðri (Norte), Suðri (Sul), Austri (Leste) e Vestri (Oeste). Midgard está unida a Asgard por uma ponte em forma de arco-íris, chamada Bifröst. Construída pelos Aesir, era guardada pelo deus Heimdall, que nunca dormia.
Jötunheimr é a Terra dos gigantes. Quando Ymer morreu, o derramamento de sangue foi tão volumoso que acabou afogando quase toda a raça de gigantes (que viviam no início dos tempos). Salvaram-se apenas Bergelmir e sua mulher, que fugiram num barco e chegaram à montanha de Jötunheim, onde fundaram uma cidade chamada Utgard, separada da terra dos homens pelo vasto oceano (que é protegido/circundado pela serpente Jörmungandr, que é tão grande que toca o próprio rabo, como o Uroboros).
Muspelheim (Terra do fogo) é o lar dos demônios de fogo, liderados por Surtur (seria a inspiração para o Balrog?).
Nas raízes de Yggdrasil está o mundo de Svartalfheim (Lar dos elfos escuros). Eles são a contraparte decadente dos elfos luminosos, e vivem no subterrâneo, pois o Sol pode transformá-los em pedra. O termo elfo "escuro" pode ser uma sugestão em relação ao seu lugar de residência, muito mais do que de sua natureza presumida, embora fossem descritos como mesquinhos e incômodos para seres humanos. Assim como os anões, os elfos escuros cresceram a partir das larvas da carne de Ymir, mas os anões vivem no subterrâneo de Midgard, em Nidavellir (os Campos escuros). Os elfos escuros são, freqüentemente, apontados como responsáveis por muitas das maldades que ocorrem à humanidade. Daí a palavra alemã para pesadelo: Albtraum ( (As lendas contam que os elfos escuros se sentam em cima do tórax dos seres humanos e/ou sussurram os sonhos ruins nas orelhas do dorminhoco. Na Escandinávia, a criatura responsável pelos pesadelos é um Goblin, conhecido como Mara (Mare, em inglês, daí a palavra Nightmare, que significa `Sonho de Mara´).) sonho de elfo(*)).
Niflheimr (Terra das névoas) é um mundo de gelo eterno, onde vivem os anões e o reino dos Nibelungos. Baseado nessa mitologia, o compositor Richard Wagner não só compôs, como escreveu a história de sua ópera O Anel do Nibelungo (Der Ring des Nibelungen). O centro desta história é um anel mágico, que foi forjado pelo anão Alberich (o Nibelungo do título), cuja posse garante poder sobre todo o mundo. Diversas personagens míticas lutam por 3 gerações pela posse do objeto, incluindo Wotan, o chefe dos deuses. Qualquer semelhança com O Senhor dos Anéis não é mera coincidência (embora Tolkien diga que não). É dito que as raízes mais profundas da árvore Yggdrasil estão enterradas em Niflheimr. Lá existe um dragão chamado Nidhogg, que guarda uma fonte mágica e fica roendo as raízes da árvore com o objetivo de a destruir, mas existem vários animais que distraem Nidhogg, e um deles é o esquilo Ratatosk. É ele que alimenta a troca de insultos entre Nidhogg e águia que fica no topo dos galhos de Yggdrasil.
Ironicamente é nas profundezas de Niflheimr (e não na Terra do fogo) onde fica a coisa mais próxima do inferno na mitologia nórdica: Helheimr (Lar de Hel). Mergulhado em perpétua escuridão, e guardado pelo gigantesco cão Garm, Helheimr é governado por Hel, deusa da morte, e é pra lá que as pessoas vão quando morrem sem glória, doentes ou com idade avançada, além de crianças e mulheres. Ao contrário do que sugere a associação com a palavra Hell (inferno) em inglês, em Helgardh não há senso de punição para os mortos. Helgardh é um mundo dentro de um mundo (de Niflheimr), o reino mais frio e baixo na ordem total do universo, abaixo da terceira raiz de Yggdrasil.