O Caminho - Parte 4
por Elisabeth Cavalcante em EspiritualidadeAtualizado em 09/06/2006 11:26:01
Chegamos agora ao quarto vale que, segundo Osho, é muito importante e difícil de ser atravessado.
“Então, chega o quarto vale: o vale das tribulações.
A entrada dentro do inconsciente acontece no quarto vale. Até agora você estava confinado no mundo do consciente. Agora, pela primeira vez, você entrará nos mais profundos campos do seu ser, o inconsciente, a parte mais escura, a parte da noite. Até agora, você estava na parte do dia. Era mais fácil. Agora, as coisas se tornarão mais difíceis. Quanto mais alto você vai, mais tem que pagar. A cada degrau mais alto, a jornada se torna mais árdua e a queda mais perigosa. E se precisa estar mais alerta. Em cada degrau, mais consciência será necessária, porque você estará se movendo em planos mais altos.
O vale das tribulações é a entrada no inconsciente. É a entrada naquilo que os místicos cristãos chamam de "a noite escura da alma". É a entrada no mundo louco que você esconde de você mesmo. É muito misterioso, é muito caprichoso, bizarro. Até o terceiro vale, um homem pode seguir sem um mestre, mas não além do terceiro. Até o terceiro pode se ir por conta própria. No quarto vale um mestre é uma necessidade.
E quando eu digo que se pode ir até o terceiro por conta própria, não quero dizer que se tem que ir e também não quero dizer que todo mundo estará apto a ir. Eu estou simplesmente falando de uma possibilidade teórica. Até o terceiro vale é teoricamente possível que se possa seguir sem um mestre. Mas com o quarto um mestre se torna uma necessidade absoluta. - porque agora você estará tateando num quarto escuro. Você não tem nenhuma luz própria que possa usar nesta escuridão. A luz de alguém será necessária - alguém que entrou dentro desta noite escura e pelo qual se tornou possível ver nessa escuridão.
A parte negativa do vale das tribulações é a dúvida - grande dúvida surge! Você não sabe o que é a dúvida, você não sabe ainda! Tudo o que você pensa que é dúvida não é mais que ceticismo, não é dúvida. A dúvida é um fenômeno completamente diferente.
Alguém diz: "Deus existe!"; você diz: "Eu duvido". Você não duvida. Como você pode duvidar? Você está sendo apenas cético. Você está só dizendo "Eu não sei". Em vez de dizer "eu não sei", você está usando a palavra muito forte "dúvida". Como você pode duvidar? A dúvida é possível quando você está encarando uma realidade.
Por exemplo, você nunca viu um fantasma. E você diz: "Eu duvido da existência de fantasmas". Isto não é dúvida, é apenas ser cético. Você está simplesmente dizendo: "eu nunca cruzei com nenhum, então, como posso acreditar? Eu duvido. "Isso não é dúvida. Dúvida será quando, um dia passando pelo cemitério, você de repente cruza com um fantasma! Então todo o seu ser será sacudido. Aí sim você estará em verdadeira dúvida, tentando saber se aquilo que vê é realidade ou alucinação.
A dúvida é muito existencial; o ceticismo é intelectual. O ceticismo está só na mente; a dúvida entra no seu próprio ser, todo o seu corpo-mente-alma. Sua estabilidade é sacudida.
Nessa noite escura da alma, a dúvida surge. Dúvida sobre Deus - por você estar buscando por mais luz e acontece isso, justo o oposto. Você estava procurando por êxtase e caiu na noite escura. Uma grande dúvida surge sobre se você está certo, sobre se esta procura tem valor - porque você buscava ouro, você buscava luz, e iluminação, e nirvana, e samadhi, e (Satori é o objetivo espiritual do Zen Budismo. Satori poderia ser traduzido para Iluminação individual ou um flash de sabedoria. Satori é uma preciosa e intuitiva experiência.) satori(*), e ao invés de satori e samadhi, esta noite escura envolveu você. Mesmo aquelas luzes que costumavam existir não existem mais. Mesmo aquelas certezas que costumavam existir não existem mais.
Você costumava saber algumas coisas; agora você não sabe nada. Você tinha certa segurança. Até isso se foi. A própria terra escorregou sob os seus pés; você está se afogando. Então, a dúvida surge. Aí, você começa a sentir que talvez toda esta imagem religiosa seja insensata, talvez não haja Deus, talvez você esteja se enganando, talvez você tenha escolhido algo absurdo. Seria melhor viver no mundo, ser do mundo. Seria melhor ter muito mais coisas: curtir o poder, o dinheiro, o sexo. O que eu fiz? Eu perdi tudo e este é o resultado?
Para todo buscador este momento chega. E se surge esta dúvida, então, naturalmente, o buscador começa a defender-se contra a escuridão. Cria uma armadura em volta de si mesmo contra a escuridão, a escuridão invasora. É preciso proteger-se, se você fizer isso, será jogado de volta à parte consciente da mente. Você perderá o mistério da escuridão. A luz é linda, mas não é comparável com a escuridão. A escuridão é mais linda, mais fria, mais profunda. A escuridão tem profundidade, a luz é rasa. E a menos que você seja capaz de dar boas-vindas à escuridão, você não será capaz de dar boas-vindas à morte.
Então, a primeira coisa é que você tem que dar as boas-vindas, aceitar, relaxar. Esta escuridão é o primeiro vislumbre de Deus. É escuro, mas, mais tarde, você compreenderá que não era escuro. É que, na verdade, pela primeira vez você abriu os olhos em direção a Deus e era muito deslumbrante, é por isso que parece escuro. Não era escuro; a escuridão era a sua interpretação.
Olhe para o sol por alguns segundos e logo você estará cercado pela escuridão. É demais, você não pode encará-lo. Um homem pode ficar cego se olhar muito para o sol. Olhe para o sol durante alguns segundos e então entre em casa: você encontrará toda a casa cheia de escuridão. Há um momento, você estava lá e podia ver tudo. Agora, não pode ver nada; você tropeçará nas coisas.
Aquilo que está escuro é interpretação. É natural. Mais tarde, quando ultrapassar o vale, você estará apto para olhar para trás e ver a realidade. Só um mestre pode pegar na sua mão nesta noite escura da alma e torná-lo confiante, pode dizer e convencê-lo: -"Não se preocupe. Apenas parece escuro, não é escuro. É o primeiro encontro com Deus. Você está chegando mais perto".
Há três coisas para serem compreendidas: sono, morte e samadhi.
O sono é como a morte. No Oriente, nós dizemos que ele é uma morte pequena, minúscula. Nós morremos toda noite e desaparecemos na noite escura. Então, chega a morte - uma morte muito maior que o sono. O corpo desaparece, mas a mente permanece e nasce novamente. Aí, vem a última morte, a morte definitiva - samadhi - quando o corpo desaparece, a mente desaparece e apenas o mais recôndito cerne, a consciência, permanece. Esta é a morte definitiva.
No quarto vale você se depara com o primeiro vislumbre de como a morte definitiva vai lhe acontecer. Se você a rejeitar, se você defender-se contra ela, se você criar uma armadura, você será jogado de volta ao terceiro vale e você perderá. E uma vez que tenha perdido o quarto, você sempre terá medo de ir novamente através dele.Minha observação sobre as pessoas é que as que entraram no quarto vale em alguma de suas vidas passadas, ficaram muito amedrontadas e escaparam, são as pessoas que sempre têm medo de alguma coisa mais profunda. Amor - e eles têm medo. Orgasmo - e eles terão medo. Amizade - e assim por diante; além disso, eles terão medo. Discipulado - e eles terão medo. Rendição - e eles terão medo. Prece - e eles terão medo. Eles terão medo de todas aquelas coisas que poderão trazê-los de volta ao quarto vale. Eles podem não estar conscientes do que é que tem medo.
O quarto vale é muito importante porque está no meio. Há sete vales, o quarto está bem no meio. Três estão deste lado e três estão daquele lado. O quarto é imensamente importante; ele é a ponte. O mestre é necessário nesta ponte porque você passa do conhecido para o desconhecido, do finito ao infinito, do insignificante ao profundo.
A parte positiva é a confiança, a rendição. A parte negativa é a dúvida, a defesa. O mestre começa a ensinar você sobre confiança e rendição desde o começo, então, aos poucos, isso se torna a sua atmosfera - porque isso será necessário quando você entrar no quarto vale.
Às vezes, as pessoas vêm a mim e dizem: "Porque não podemos ficar aqui sem rendição? Porque não podemos meditar e ouvi-lo e sermos beneficiados o tanto quanto quisermos? Qual é o objetivo da rendição”?
Elas não compreendem. No começo, pode não parecer tão relevante. Por quê? Para que? Você pode me ouvir sem se render e você pode meditar aqui sem rendição. Parece perfeitamente bem. A rendição parece não ser necessária. Mas você não sabe o que vai acontecer no futuro. Para isso, a preparação tem que começar agora mesmo. Você não pode esperar por aquele momento. Se a preparação não for feita antes, você perderá. Então, quando o tempo chegar, quando a sua casa estiver em chamas e você ainda não tiver cavado o poço, você começará a cavá-lo, mas só irá terminá-lo quando a casa já tenha se transformado em cinzas.
É necessário cavar o poço antes que a casa pegue fogo! Agora, pode não parecer relevante. Eu posso entender. Logicamente, isso não é relevante neste momento. Ouvindo-me, por que é necessária a rendição? Mas, quando você entrar no quarto vale, a rendição será necessária. E você não pode aprender repentinamente os caminhos da rendição. Você tem que ir aprendendo antes da necessidade surgir. A rendição tem que se tornar a sua atmosfera”.
Osho, The people of the Path.