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O simbolismo mitológico do Tarot

por Elisabeth Cavalcante em Espiritualidade
Atualizado em 03/08/2020 15:36:42


Uma das definições que encontramos para a palavra mito diz que ela refere-se ao relato de uma história não verdadeira. Mas isso é correto apenas no sentido objetivo, já que o mito representa conteúdos subjetivos reais, presentes em todos os seres humanos.

O mito descreve padrões de vida por meio de parábolas, estórias e representações iconográficas. A mitologia grega é um exemplo vivo desses padrões, e foi exatamente isso que suscitou o interesse da civilização renascentista e as formas místicas que aparecem nas cartas do Tarot.

ORIGEM
Se quisermos estabelecer as origens do Tarot apenas à partir de evidências concretas, ou seja, tomando como base os primeiros baralhos documentados que incluem não somente os quatro naipes de um baralho comum, mas também aquelas imagens que conhecemos como Arcanos Maiores ou Trunfos, devemos nos reportar à segunda metade do século XV, quando estas cartas foram desenhadas e pintadas na Itália.

Os dois primeiros baralhos, um deles conhecido como o Baralho de Carlos VI e o outro chamado de Baralho Visconti-Sforza são o que temos à disposição como prova das primeiras versões conhecidas desse baralho misterioso, cujas imagens evocam nossa memória primitiva, parcialmente ligada aos mitos, às lendas e ao folclore, e possuem um significado que escapa a qualquer tentativa de explicação meramente racional.

A Renascença Italiana procurou trazer de volta o pensamento grego clássico, que com sua essência de experimentação e aventura, em contraposição à visão sombria e rígida da Idade Média, teve grande impacto e inegáveis conseqüências sobre a mentalidade ocidental.

Os manuscritos gregos - especialmente os de Platão e dos filósofos herméticos e neoplatonistas de Alexandria e do Oriente Médio - chegaram a Florença exatamente no momento em que os governantes da cidade nutriam grande interesse pelo assunto.

O movimento hermético neoplatônico basicamente contestava a antiga concepção medieval de que o homem era uma criatura pecadora e que a única maneira de se aproximar de Deus era através da Igreja. Ele acreditava que o ser humano fosse em sua essência o microcosmo dentro do macrocosmo e que, dessa maneira, o auto-conhecimento - ou o conhecimento da própria alma - seria a única alternativa pela qual se poderia estabelecer uma ligação com as próprias origens divinas.

A visão era tão pagã quanto cristã e as imagens dos antigos deuses e deusas começaram a aparecer na arte renascentista, que até aquela época exibia apenas temas religiosos convencionais, e surgiram na Europa exatamente na mesma época em que as primeiras cartas do Tarot começaram a ser utilizadas.

O auto-conhecimento foi, na realidade, a primeira máxima dos gregos, pois na porta de entrada do templo de Apolo, em Delfos, está até hoje a inscrição:
"Conhece-te a ti mesmo". E o conhecimento de si mesmo implicava no conhecimento dos inúmeros e complexos impulsos e instintos de ordem psicológica, além do conhecimento de todos os ciclos de desenvolvimento atuantes dentro do ser humano.

A multiplicidade de deuses gregos dava a impressão, para a recém-desperta mentalidade renascentista, de uma analogia muito mais verdadeira dos complicados padrões do Universo, do que o mundo estático da Santíssima Trindade, com suas divindades essencialmente masculinas. Não é de admirar que a Igreja tenha reagido violentamente contra o movimento, forçando-o por fim, à clandestinidade pelos dois séculos seguintes.

IMAGENS MÁGICAS
Ao lado dos deuses gregos, a Renascença adotou também o método grego de aproximação a esses deuses, que eram chamados sistemas de memorização.
O método consistia em estudar ou meditar sobre uma quantidade de imagens mágicas, cada uma delas sendo um símbolo e contendo, conseqüentemente, vários níveis de significação.

As imagens dos deuses gregos presentes nas pinturas da época, como as de Botticelli, além daquelas contidas nas primeiras cartas do Tarot, não são simplesmente cópias de adoração pagã, mas eram consideradas como símbolos de antigas e poderosas leis operantes durante toda a criação. A meditação sobre aquelas imagens tinha como objetivo restaurar a memória do mundo divino da alma, elevando a consciência individual e colocando o individuo em sintonia com as suas verdadeiras origens.

A Igreja, naturalmente, considerava tal prática como pagã e associada às coisas do demônio e reprimiu-a ferozmente, proibindo qualquer estudo ou prática relacionada àqueles temas, considerados hereges. No início do Iluminismo, que estimulou o ponto de vista científico, pondo fim ao misticismo dos séculos anteriores, as cartas do Tarot foram relegadas ao mundo do ocultismo dos séculos XVIII e XIX, já não eram mais acessíveis ao público nem tinham mais qualquer relevância filosófica ou espiritual para a sociedade vigente.

MITOS E ARQUÉTIPOS
As imagens míticas são, na realidade, quadros, figuras ou representações espontâneas, provenientes da imaginação do homem, que descreve em linguagem poética as experiências fundamentais e os padrões do seu desenvolvimento. A psicologia moderna utiliza a palavra arquétipo para descrever esses padrões, que são universais e existem em todas as pessoas de todas as civilizações e culturas, em todos os períodos da História.

Amorais, embora paradoxalmente trazendo profundas verdades morais, as divindades gregas antecederam e permearam quase todos os símbolos religiosos da cultura judaico-cristã, assim como a arte e a literatura de todo o Ocidente.
Permanecem como as imagens mais precisas para descrever os muitos ângulos e as inúmeras nuances que operam na psique humana.

As vinte e duas cartas denominadas Arcanos Maiores compõem uma série de imagens, as quais descrevem diferentes estágios de uma viagem. Essa viagem é identificada com vários mitos, lendas e contos de fadas, além de ser encontrada também nos ensinamentos religiosos do mundo inteiro.

É a viagem da vida, que todos os homens fazem desde o nascimento, onde percorrem a infância sob a proteção dos pais, depois a adolescência, com os amores, conflitos e rebeldias, a seguir a maturidade, com seus desafios éticos e morais, suas perdas e crises, e finalmente a realização de seus objetivos, que, por sua vez, conduz o homem para outra viagem.

Este ciclo não é apenas cronológico mas sucede várias vezes na vida das pessoas, pois tudo o que nos acontece tem um começo, meio e fim. Assim, a viagem descrita pelos Arcanos Maiores é arquetípica e significa que, não obstante os detalhes específicos que uma vida possa ter, certos estágios do desenvolvimento psicológico serão atravessados por todos indistintamente.

No mundo da psique, as experiências não estão ligadas pela casualidade, mas pelo significado. Existem outros padrões, que não os concretos, operando dentro de nós e, dessa maneira, a forma em que o Tarot opera ao nível da previsão nada mais é do que uma espécie de espelho da psique.

OS QUATRO NAIPES

Os quatro naipes do Tarot, simbolizados pela taça, pelo bastão, pela espada e pelo pentáculo, descrevem pictoricamente as experiências nas quatro dimensões ou esferas da vida.

Tal como os antigos quatro elementos da filosofia grega, os quatro naipes abrangem todas as facetas das experiências da vida.

O naipe de Copas corresponde ao antigo elemento água, da qual segundo dizem, surgiu a vida. A água é fluida, disforme, mutável e vaga, ao mesmo tempo em que é forte, real e a seu próprio modo, tão sólida como a rocha.
No Tarot simboliza o mundo dos sentimentos, pois estes, embora mudem e tomem colorido a partir da situação que se apresenta, têm vida, realidade e forma própria.

O Naipe de Paus corresponde ao antigo elemento fogo, que segundo a lenda, surgiu do nada espontaneamente e que tudo podia transformar, sem ser alterado.
O fogo é um transformador de formas, nem sólido nem líquido, volátil, um catalizador que reduz os objetos aos seus componentes primordiais e lhes altera a natureza. Da mesma forma é o mundo da imaginação e da criatividade e representa também os desafios enfrentados no mundo exterior.

O naipe de Espadas corresponde ao antigo elemento ar, que pode ser invisível, e, acreditava-se, constitui a respiração do espírito, que concebeu a idéia da criação antes de ser tornar manifesta. Por isso o ar simboliza os domínios da mente, as faculdades da conceitualização e do pensamento abstrato que deve preceder cada ato de criação e que confere estrutura e significado à vida.

O naipe de Ouros, simbolizado pelo pentáculo, corresponde ao antigo elemento terra, o barro primordial do qual somos feitos e ao qual um dia retornaremos. A terra é nosso princípio e nosso fim. A experiência do corpo é a realidade original antes que qualquer imagem, espírito ou sentimento venha habitá-lo. O naipe de Ouros descreve a evolução da função de realidade, e do ajuste gradual da vida através das necessidades, dos desafios, das frustrações e das recompensas do mundo material.

Cada naipe dos Arcanos Menores está dividido em dois grupos: as cartas numeradas - dez em cada naipe - e as cartas da corte - quatro em cada naipe.
Embora sejam tão psicológicas quanto as dos Arcanos Maiores, as cartas numeradas retratam as experiências da vida cotidiana, com as quais nos deparamos através de situações, negócios e pelos estados de espírito que passamos.

As cartas da corte de cada naipe - Pagem, Cavaleiro, Rainha e Rei -, diferem das cartas numeradas porque não descrevem experiências ou acontecimentos típicos. Ao contrário, essas cartas abrangem tipos de personalidade ou dimensões de uma determinada esfera da vida, que podem ser traduzidas em figuras humanas.

Os Pajens representam sempre os estágios iniciais, a delicadeza dos começos pertinentes àquele naipe. Ou seja, é a matéria prima daquela determinada esfera da vida em sua forma mais jovem, mais frágil e incipiente, que precisa de atenção, cuidado e proteção para que suas qualidades possam se desenvolver completamente.

Os Cavaleiros representam um energia volátil, a fase adolescente das qualidades daquele naipe específico. É o espírito jovem, indomável, inquisidor, que nos leva a explorar e a experimentar numa determinada esfera da vida.

As Rainhas representam as características estáveis, receptivas do naipe. Nesse momento a força e o desejo já não fluem espontaneamente para dentro do próprio ambiente. Essa contenção e concentração são necessárias para que uma força maior possa emergir de dentro do indivíduo.

Os Reis representam as qualidades dinâmicas, expansivas daquele determinado naipe. Representam a utilização total da energia nessa esfera da vida, ao construir e concretizar o mundo exterior.

As personalidades arquetípicas das cartas da corte não descrevem traços pertinentes apenas aos homens e às mulheres. Ao contrário, as faces masculinas e femininas indicam as características passivas e ativas da energia, ou seja, masculino e feminino, a um nível mais profundo, e contido tanto nos homens quanto nas mulheres. Mais amplas do que as figuras numeradas, mas não tão abrangentes quanto as dos Arcanos Maiores, essas figuras situam-se em algum ponto entre essas duas categorias.

Os antigos filósofos gregos declaravam que pertencemos aos quatro elementos e, a nível psicológico, contemos essas quatro dimensões diferentes da vida e quatro maneiras diferentes de nos adaptar-nos a ela.
Através do Tarot e do simbolismo mítico que ele apresenta, podemos examinar em detalhes os padrões essenciais ao desenvolvimento humano que ocorre nos quatro níveis: emocional, intuitivo, físico e intelectual.


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elisa
Elisabeth Cavalcante é Taróloga, Astróloga, Consultora de I Ching e Terapeuta Floral.
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