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Persona e Sombra na Família

por Luís Vasconcellos em Psicologia
Atualizado em 28/07/2000 14:47:33


Nos grupos - sociais ou familiares / tribais - nota-se diferenciação de papéis, especialização e estereotipia nos "personagens" delimitados pela situação de vida em que se encontra o grupo. Sua fixidez / repetição / especialização parece uma corruptela de uma organicidade ecológica ( várias espécies convivem em equilíbrio em um mesmo habitat ) e nota-se logo o esforço de todos na manutenção da repetição, da rotina e da permanência de cada qual no papel que desempenha, seja por livre opção ou por escolha imposta pelas necessidades da situação.
Mais ou menos assim se desenrola a situação: Somos uma orquestra que toca samba, então temos que tocar cada qual um instrumento e, assim sendo, como já existe alguém no papel de maestro, alguém no bumbo, alguém no repique e assim por diante, o novo integrante exerce naturalmente uma opção entre as "funções" ou necessidades carentes; ou seja, vai pegar o reco-reco, a zabumba, o tamborim; quer tenha vocação natural para isso ( preferível ) ou não.

Se há vocação natural todas as partes ficam felizes, porém nem sempre é este o caso. À parte as escolhas sociais por competência ou talento, que dão valor e respeito à naturalidade ou instintividade do integrante, o resto á apenas adaptação do "ator" de cada um ao personagem prescrito, sem qualquer preocupação em adequar as características do personagem aos talentos e expectativas do "ator" e sim às necessidades coletivas.
Qualquer um pode ver que isso representa ineficiência no resultado. P.ex. o papel de aluno é imposto - socialmente delineado e uniforme - sem qualquer concurso da vontade do aluno. Ele é correspondente e necessário ao papel do professor. Se alguém no papel de aluno tentar criar algo de novo na sua função ou procurar alguma variação no papel, terá que ser dentro do padrão de adequação do meio social, que cuida de balizar os comportamentos através de todos os fatores socializantes e uiniformizantes. Aí não há qualquer oportunidade de escolha ou de eleição livre de papéis, mas apenas de desempenho individual.

Nas famílias normais e nas "endoidecidas" ( psicóticas ) há diferenças marcantes. Nas últimas, segundo pesquisas, o "papel de louco" é aderido a alguém e há enormes resistências, por parte da família, quanto ao abandono ou desidentificação de um "ator" face a este papel em particular. Costumo usar o termo "denunciador da Sombra familiar" a estas pessoas que, sem o saberem, assumem o papel de "terrorista psíquicos" a denunciarem exatamente a loucura reinante e a hipocrisia dos papéis assumidos, o fingimento social, a injustiça velada e as questionáveis bases que estruturam as relações de poder naquela comunidade. Esta disposiçao inconsciente faz destas pessoas párias sociais que sofrem todo tipo de discriminação e preconceito. Nas primeiras há maior liberdade para a diferenciação e cada qual é mais democraticamente deixado livre para escolher na caixa dos instrumentos coletivos da vai aprender a tocar. Além disto, em uma família saudável ( supondo-se otimistamente que isto exista ou seja possível *R* ) há melhor coordenação e cooperação entre os diversos papéis compondo a visão de um mundo que funciona eficientemente através da integração e mútua cooperação. É isso que acontece quando a ênfase coletiva não se estabelece sobre as semelhanças entre as pessoas, mas sobre as diferenças, o que gera uma tolerância para a diversidade.

Há pessoas ainda que, por estarem predispostas a exercer papéis fora de moda - por assim dizer - atraem sobre si mesmas a carga das dificuldades advindas de repressões comungadas pela comunidade ( Sombra coletiva reinante ) e podem sem dúvida sucumbir ao peso destas dificuldades adicionais ( no que se refere ao seu desenvolvimento enquanto personalidades e enquanto desempenho de papéis na vida social ).
A Psicologia Social justificando estes fatos sob a ótica de um condicionamento cultural descreve este fenômeno como imitação ( inconsciente ? ) de papéis e de personagens. Fenômeno de enorme importância e que nos acompanha e se desenvolve ao longo de toda a nossa vida.
O fio que une nossas "partes separadas" ou desintegradas é muito sutil e frágil, fazendo com que muita punição externa e crescente rigidez interna garantam uma coerência, uma repetição e uma rotina de ser, de fazer, de sentir e de pensar. Uma vez estabilizados cuidamos de não permitir variações nem incoerências, formalizando nosso desempenho de papel e submetendo-o a um filtro de censura e de auto validação de nosso ponto-de-vista sobre nós mesmos e sobre o mundo de modo geral. Quem já mudou um hábito ou "modo de ser de todos conhecido" sabe da dificuldade de "retreinar" todos os envolvidos para adaptarem-se ao seu novo modo de ser / pensar / agir.

Na época da ditadura militar pessoas rebeldes e revoltadas eram tidas como heróis e seus possíveis e evidentes defeitos eram minorados na percepção coletiva que os tinha como guerreiros mitológicos. Hoje, alguém com um discurso revolucionário vai encontrar mais indiferença e estranheza do que estímulo ao seu modo característico de ser / agir / pensar. O radicalismo, por exemplo, antes normal e justificável, hoje soa sem sentido e desequilibrado. Em São Paulo a prefeita Erundina do PT relatou que tinha que enfrentar oposição de seu partido em sua gestão, pois o partido ainda não tinha experiência de ser governo, de ser o "partido da situação." O jeito encontrado foi fazer oposição a si mesmo.
Talvez cultura nenhuma possa sobreviver sem uma uniformidade de seus componentes ( no modo de cantar, nos costumes, no modo de pensar, no estado de humor, nas vestes, na língua falada, na alimentação etc.).
O que será destas diferenças quando vivermos uma sociedade autenticamente global ? Pode parecer que se dissolverão, mas a experiência indica que a diversidade cultural é o que garante a vitalidade de todo o sistema. O mesmo se passa na célula social chamada de família. Muitos esquecem do detalhe de que o papel é social e coletivo, porém o exercício dele é individual e pessoal. Uma uniformização abertamente massificante é o maior candidato ao vilão da história nos dias de hoje.Na época da ditadura militar pessoas rebeldes e revoltadas eram tidas como heróis e seus possíveis e evidentes defeitos eram minorados na percepção coletiva que os tinha como guerreiros mitológicos. Hoje, alguém com um discurso revolucionário vai encontrar mais indiferença e estranheza do que estímulo ao seu modo característico de ser / agir / pensar. O radicalismo, por exemplo, antes normal e justificável, hoje soa sem sentido e desequilibrado. Em São Paulo a prefeita Erundina do PT relatou que tinha que enfrentar oposição de seu partido em sua gestão, pois o partido ainda não tinha experiência de ser governo, de ser o "partido da situação." O jeito encontrado foi fazer oposição a si mesmo.
Talvez cultura nenhuma possa sobreviver sem uma uniformidade de seus componentes ( no modo de cantar, nos costumes, no modo de pensar, no estado de humor, nas vestes, na língua falada, na alimentação etc.).
O que será destas diferenças quando vivermos uma sociedade autenticamente global ? Pode parecer que se dissolverão, mas a experiência indica que a diversidade cultural é o que garante a vitalidade de todo o sistema. O mesmo se passa na célula social chamada de família. Muitos esquecem do detalhe de que o papel é social e coletivo, porém o exercício dele é individual e pessoal. Uma uniformização abertamente massificante é o maior candidato ao vilão da história nos dias de hoje.


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luis
Luís Vasconcellos é Psicólogo e atende
em seu consultório em São Paulo.



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