Transtorno Bipolar: `A estratégia da mente´
por Silvia Malamud em PsicologiaAtualizado em 29/11/2007 16:15:06
São milhões de idéias que vem e vão de modo mais rápido que cada respiração. Não há inspiração que chegue, muito menos um breve tempo para se suspirar... Está tudo aí... Divinamente lúcido e cristalino. Quem agüenta tanto colorido, tanta vida de uma só vez? A visão de que tudo pode dar certo... De que arrumaremos o mundo, de que salvaremos os necessitados... Que o universo está cheio de possibilidades, onde tudo, exatamente tudo pode dar certo!
Nesses momentos somos reis e rainhas, somos deuses poderosos que entendemos a trama do universo e temos o poder para organizarmos tudo, para construirmos qualquer coisa que podemos imaginar...
Idéias e mais idéias se acumulam, na verdade são associações de pensamentos, onde um leva a outro cada vez mais potente e mais interessante... pena que na grande maioria das vezes o primeiro objetivo pensado seja perdido nessa avalanche associativa e tudo o que poderia ser feito tenda a virar fumaça dissociada, com uma possibilidade muito distante da concretização efetiva. Tudo acaba se perdendo no ar, na divagação que aumenta a cada novo pensamento que vai surgindo.
Estas são apenas algumas das múltiplas características que hoje se conhecem acerca do Transtorno Bipolar.
O outro lado da moeda mostra-se quando a pessoa se sente distanciada da realidade, quando nada faz sentido, quando tudo o que acontece fora parece mais com um filme descolorido e sem nenhuma animação. Por vezes a sensação de desconexão é tão intensa no sentido negativo que se tem o desejo de não existir mais. Muitos vão para cama sem coragem de viver em um mundo ao qual sentem não pertencer.
Não vamos abordar aqui as possibilidades farmacológicas de equalização para que este sistema de manifestação fique tranquilo, isto é, sem “altos e baixos”. Não há nada contra os fármacos, falo aqui como algo excelente e necessário para que se configurem equilíbrio e qualidade de vida. Apenas desejo neste momento avançar na estrutura da mente e nas suas saídas, em busca de soluções para conflitos que - não poucas vezes - podem inserir a pessoa em situações bastante diferenciadas e com um difícil caminho de volta (por conta própria) ao suposto equilíbrio anterior. Penso que os Bipolares diagnosticados precisem de ajuda terapêutica com a finalidade de terem um suporte acolhedor que os auxilie na ruptura de um padrão emocional que altera drasticamente a percepção da realidade.
Notem que a questão aqui é bem complexa. Tenho alguns pacientes Bipolares que estão em perfeita harmonia e que por vezes sentem certa nostalgia dos momentos em que estavam eufóricos... Tem muita coisa para se desenvolver dentro deste tema.
O que se passa com esses pacientes, todos extremamente inteligentes, é quando passam por uma crise de mania; por exemplo, possuem uma lógica perfeita que está inserida dentro de um contexto emocional pessoal, somado a uma visão de mundo reparadora.
Em todos os casos que já atendi em meu consultório, após as crises, os pacientes elaboram, observando os aspectos que os levaram a tê-las. É interessante que apesar de parecer, para os que estão de fora, que a crise é totalmente sem sentido, sempre existe um sentido único e muito especial que merece ser elaborado com dignidade. Penso nisso como evolução da consciência, para que a mesma nunca mais necessite chegar num ponto de ‘descoincidência’ com a realidade na tentativa de elaborar questões difíceis.
O processo terapêutico nesses casos funciona de modo suportivo para que o paciente se fortaleça a ponto de poder encarar questões difíceis sem ter que acelerar ou diminuir demais o seu modo de ser e de estar no mundo.
Temos, todos nós, inúmeras situações difíceis pelas quais passamos no decorrer da nossa vida aqui na Terra. Nossa jornada aqui tem disso... Experiências fortes na matéria que constantemente nos imprimem novos significados na alma.
A questão é poder vivenciar, por piores que possam ter sido as nossas experiências/experimentações - na medida do possível - com o status de participante ativo juntamente com o de observador. Acredito que sempre exista a possibilidade do surgimento de um Eu saudável que pode lidar com toda e qualquer vivência pela qual se passa. Compreender esse tipo de “lição” nos habilita efetivamente a sermos os senhores das nossas próprias historias e não apenas vitimas indefesas.
Notem que podemos até nos sentir vitimizados por situações muito difíceis, mas o resgate do olhar sempre é possível.
- Sempre.