Independência, morte ou interdependência?
Atualizado dia 16/08/2007 22:18:45 em Autoajudapor Priscila Gaspar
Era 1972, ano marcado pelas comemorações do sesquicentenário da independência, em pleno regime militar. Os mais jovens talvez não compreendam, mas quem viveu nessa época sabe que, em uma escola estadual a professora não poderia dar maiores explicações sobre o processo de reconhecimento da independência. Tampouco nós, crianças, compreenderíamos que a passagem narrada possuía o significado de um ato simbólico.
Dez anos após, estava eu, pela primeira vez, a caminho de exercer meu direito de cidadã: o voto. Meu candidato ao governo do estado, Franco Montoro, era do partido de oposição. Assim, escolhendo-o eu também fazia oposição à proposta da família. Ao afirmar perante meu pai em quem eu votaria, senti que era a minha independência! Já tinha 18 anos, cursava o primeiro ano da faculdade e não morava mais com meus pais. Podia votar em quem bem quisesse! O voto era o símbolo de minha independência! Mal sabia eu o quanto ainda viria a depender financeiramente de meu pai e emocionalmente da família toda... Mal sabia eu que nenhum ser humano pode viver sem depender de outrem!
Assim como o Brasil precisou ter sua independência reconhecida por outras nações, tive que ter a minha reconhecida por outros indivíduos e por instituições da sociedade. Emprego, conta no banco, cartão de crédito... De certa forma algumas instituições me reconheciam como tal, ainda que não soubessem que, a qualquer momento, eu precisaria pedir auxílio a meu pai. Assim como o Brasil precisava recorrer aos cofres do FMI...
Inicialmente, ao ver frustrado meu desejo de ser independente, minha auto-estima baixou. Sentia-me sem valor, como se, ao precisar de auxílio, não tivesse valor próprio. Doía-me também a solidão. Nem tanto pelo fato de estar só, mas porque resistia à idéia de que precisava de pessoas a meu redor! O orgulho impedia-me de ver que, como todos os seres humanos, eu possuía fraquezas, carências e limitações...
Muitos anos se passaram. Aprendi a aceitar minha condição de “limitada” e, consequentemente, passei a aceitar auxílio com humildade. Já não doía tanto perceber que não era independente como pensara no passado. A independência era apenas uma ilusão! À medida que me abri para receber, aprendi também a doar. Doar compreensão, carinho, apoio e até dinheiro! Percebi, então, que os indivíduos na humanidade, assim como as nações na Terra, são interdependentes.
O estudo dos ecossistemas e as relações entre os seres vivos mostra que, em nosso planeta, somos todos interdependentes. Seja uma bactéria ou uma floresta, o princípio é o mesmo. A essência da vida biológica está na capacidade de trocar com o meio, formando as cadeias e as imensas teias alimentares em que os fatores ambientais são compartilhados e reciclados, enquanto a energia flui num movimento constante. De forma análoga, a essência da vida na sociedade humana é a troca de sentimentos e informações; a essência da vida de uma nação está em sua capacidade de trocar conhecimento, matéria prima, tecnologia...
Em um mundo globalizado, as nações vivem de forma interdependente e a tendência daqui para a frente é que as fronteiras se diluam cada vez mais. O mesmo pode ocorrer com as pessoas. Talvez possamos nos ver como interdependentes, formando uma imensa corrente de ajuda mútua: aceitando e doando auxílio. Assim, longe de querer tirar o mérito da máxima histórica, sugiro: em vez de optar entre independência ou morte, devemos escolher a interdependência que é a vida!
Priscila de Faria Gaspar
Psicanalista com abordagem psicossomática.
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Texto revisado por Cris
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Priscila Gaspar é Psicanalista, Terapeuta de Regressão e Terapeuta de Casais, com especialização em Sexualidade Humana. Atende em psicoterapia individual e de casal.Contato: [email protected] E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Autoajuda clicando aqui. |