A MORTE DO JATOBÁ




Autor Maria Lúcia Pellizzaro Gregori
Assunto AutoconhecimentoAtualizado em 03/05/2012 14:56:06
Sabemos que a morte é a finalização de um aspecto da vida e com ela surge a oportunidade de transformação, para que possa haver a inclusão de algo novo que necessita de um espaço para se manifestar.
Mas mesmo tendo essa consciência, a dor aparece, pois enquanto humanos e materialmente mortais, sofremos muito quando é preciso fazer uma exclusão para que seja possível alargar as possibilidades de renovação.
Desapego ainda é um desafio para todos nós. Sentimos isso a todo instante, embora racionalmente já tenhamos compreendido essa realidade.
Ouvi dizer que durante trinta e quatro anos alguém contemplou, de sua varanda, a copa de um Jatobá, imensa e generosa, que oferecia uma visão surpreendente, principalmente porque isto ocorria numa cidade grande e bem perto de um centro comercial.
Ali se aninhavam muitos filhotes de pássaros à espera do primeiro vôo.
Por ali passavam alguns gaviões pequenos que, numa ordem natural de sobrevivência, vinham tentar saborear aqueles pequeninos dentro de seus “bercinhos”.
Morcegos famintos, na escuridão da noite, vinham saciar sua fome com os deliciosos jatobás.
O respeito à natureza nos traz a possibilidade de contemplação desse espetáculo e nos faz acreditar que ele estará ali para sempre.
O Jatobá viveu sem adubos, sem cuidados especiais, num fundo de quintal, apenas por sua própria vontade de viver.
Mas...
Em dado momento, o som de uma moto serra sinalizava uma poda.
Que bom, o Jatobá vai ganhar força.
Mas a serra não parou nos galhos, foi descendo... descendo... e matando aos poucos, aquele ser silencioso que não conseguiu vencer a mão do homem.
Algumas horas depois, o Jatobá já desnudo, totalmente vulnerável, ainda se mantinha erguido. Sem “braços” (seus galhos), sem “roupas” (suas folhas), sem pássaros, mas ainda de pé.
A luta da serra foi intensa pois não havia como retalhar uma circunferência tão ampla sem um esforço proporcionalmente persistente.
Horas se passaram, a serra trabalhando pesado, a corda posicionada para dirigir o tombo, homens a postos... e aquele olhar acompanhando tudo, embaçado pelas lágrimas, num desejo enorme que o Jatobá não se sentisse sozinho.
O espetáculo apresentava uma dolorosa batalha entre a vida e a modernidade.
Aparentemente o Jatobá perdeu, assim como perdemos todos nós a cada tombo de árvore, a cada morte de baleias, de jacarés, a cada montanha que desaparece, a cada interrupção de uma forma de vida.
Mas é assim mesmo, existe um tempo em que todos precisam ceder a uma ordem maior do que sua própria força, chega um momento em que a luta precisa terminar.
Na natureza fica um imenso vazio, um solo órfão, uma terra sem expressão...
E dentro de nós?
O que precisamos aprender com tudo isso?
Muitas vezes ficamos despidos de autoconfiança, da segurança de amar, ficamos vulneráveis às forças que nos puxam para um lado que não queremos ir...
Muitas vezes teremos que ceder para determinações superiores à nossa vontade porque nossa vontade pode não ser o que precisa acontecer.
A entrega faz parte do crescimento, a entrega flexibiliza nossa dureza, abre as portas da aceitação, desde que não abandonemos nossas metas de evolução.
Não podemos moldar o metal com pancadas mas podemos aquecê-lo para curvá-lo.
Assim podemos fazer com a vida, aquecê-la com nosso sentimento de amor para que possamos compreendê-la e cumpri-la sem amassaduras desnecessárias.
Um tombo não precisa ser o último movimento, mas um treinamento que fortalece o ficar de pé novamente.
Vamos exercitando.
As mortes não são o fim. São apenas finalizações que possibilitam a abertura de novos começos.









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