APENAS UMA MENINA DE OITO ANOS
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Autor Hellen Katiuscia de Sá
Assunto AutoconhecimentoAtualizado em 23/09/2006 22:01:40
Toda vez que passo por essa rua, nesse horário, aquelas mesmas pessoas estão naquele cruzamento. Acho que deve ser a mãe dela, talvez tia... Mas pela distância de ambas, acredito que seja mesmo apenas a babá da menina.
Nossa! Quem foi que inventou esse horário maluco de sair das aulas? A esse horário está todo mundo dentro de suas casas almoçando ou tirando a cesta. E nós saindo da escola. Pelo menos tenho a rua só pra mim.
Esse prédio nunca fica pronto. Ai, meu Deus... Lá vem um mendigo... Não tenho nada contra os moradores de rua, mas alguns parecem que vão nos atravessar violentamente com sua realística realidade faminta de fome... Ele sofre tanto. Vi isso nos olhos dele.
Acho que as pessoas têm mais é vergonha de ter algo para comer, enquanto eles não têm. Por isso os adultos se esquivam dessas pessoas que mais parecem fantasmas pelas ruas. Fantasmas que existem, mas que insistimos em não enxergá-los. Às vezes eu acho que Deus os colocou no mundo para outras pessoas aprenderem a ter pena uma das outras, sei lá.
Ai, que flores lindas. Elas não estavam aqui. Talvez a dona da casa tenha colocado esses arbustos ontem à tardinha, ou à noite. Aquela calçada estava sendo feita ontem, eu vi. Morri de vontade de colocar minhas mãos para secarem as marcas junto com o cimento. Mas pensei no trabalho que os pedreiros tiveram...
Gostaria de continuar brincando com meu pianinho quando chegasse em casa, mas mamãe não gosta do som... ela diz que eu a perturbo. Fico tão triste... Justo agora que aprendi a tocar mais uma musiquinha do folheto. Meu vovô gosta. Eu adoro tocar pra ele “Luar do Sertão”, assim ele lembra da terra natal de onde ele veio, era lá no nordeste. Ele sempre diz que eu toco bem.
O vovô é tão legal comigo. Ele me deu de presente uma flauta doce no início do ano. Eu aprendi a tocar sozinha, ouvindo músicas no rádio. É tão fácil identificar os sons e reproduzi-los na flauta... Mas a mamãe também confiscou minha flauta, e desde ontem não encontro mais minha flautinha cor de chocolate. Mamãe disse que eu a perturbo também com o som dela...
Não vejo a hora de crescer e poder fazer tudo o que eu quero fazer. Aí a mamãe não vai mais dizer que eu a perturbo com meu talento para as Artes ou com tudo que eu faço...
Meu vovô gosta de mim assim, e pra mim é isso que importa. Quando eu crescer, acho que um dia escreverei um livro e dedicarei ao meu vovô... Só não sei ainda o que escrever, mas acho que ele vai ficar feliz, mesmo assim.
Hellen Katiuscia de Sá
29 de agosto de 2006
Texto revisado por Cris
Avaliação: 5 | Votos: 2
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