QUANDO SEU LEITOR FICA CONFUSO
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Autor Madame Livro
Assunto AutoconhecimentoAtualizado em 03/10/2008 12:41:52
Vamos do início: as histórias, primariamente, faziam parte da tradição oral. Eram contadas, faladas e por usarem esse tipo de comunicação, davam margem às perguntas, expressões faciais, mudanças de entonação, até mesmo o recurso de usar vozes diferentes para distinguir personagens.
Não interessa como você se refere ao seu trabalho, novelista, contista, romancista, mas trata-se de um contador de histórias que registra, por escrito, o que quer dizer.
Por isso, como um bom contador de histórias, deve ter em mente que seu público (veja que nem os chamei de leitores!) precisa saber exatamente o que você está falando, ou melhor ainda: quem está falando agora.
Alguém focado em estudar sua história, ou avaliá-la, criticá-la, resenhá-la, resumi-la, está atento, completamente concentrado, em entender o que está escrito. Leitores comuns estão ali para se divertirem; esperam o aconchego inconsciente e ancestral de uma fogueira, uma roda de pessoas em volta e um ancião, com uma doce voz, despejando um rio sem barreiras, uma história que qualquer criança entenderia, por mais complicada que fosse. Ela é fácil não por ser óbvia, mas porque é bem contada, porque está explícita, é de rápida digestão.
Se não for assim, nada feito. Seu livro será deixado de lado e pior do que isso: você perderá, para sempre, a confiança que o leitor inicialmente lhe dedicou.
Quando eu estou lendo um manuscrito, um roteiro ou um romance e vejo, na página seguinte, grandes trechos de diálogos sem nenhum parágrafo descritivo entre eles, eu gelo... Esse é um claro sinal de que aquele pedaço terá que ser lido com atenção redobrada, ou eu perderei alguma coisa significativa.
Pense bem: você já se deparou com um daqueles trechos em que nem sabia mais quem estava falando com quem, de quem e para quem?
Leitores gostam de pausas. Precisamos de descrições, mesmo que curtas, para podermos respirar e dar uma olhada em volta.
Na vida real é assim: não ficamos falando, falando, falando, completamente desligados do entorno! Por que seria diferente num texto?
Parece, que aquele escritor está tão ansioso para nos contar o que ele pensa, que nem mesmo teve tempo ou paciência para nos ajudar na leitura.
Aprofundando-nos um pouco mais no tema, que tal falarmos do misterioso desaparecimento das marcas de diálogo?
Marcas de diálogo são aqueles travessões, aspas, dois pontos e outras traquitanas que permeiam as conversas das personagens. Em muitos textos eles simplesmente PUF! somem e deixam os leitores sem apoio nenhum. Devem, então, adivinhar, pelo tom ou assunto, quem é que está falando naquele momento. Nada errado se isso tiver relação com o estilo do autor (sim eu me lembrei de Saramago). Porém, vamos e venhamos, não é muito confortável para quem está lendo. Além disso, muito difícil de compor para quem está começando a escrever.
Claro que é desnecessário discorrer amplamente sobre a diferença entre as marcas de diálogo primárias, do tipo: - ele disse, ela falou, ele respondeu... - e as marcas de diálogo que valem a pena ser inseridas num trecho.
Colocamos isso de "ela falou, ele disse, ela respondeu” em redações escolares, não em best Sellers (se você tem a pretensão de escrever um... )! Antes que também fiquem confusos, falo especificamente de guias, não apenas de marcas.
Veja a diferença:
- Não sei do que você está falando - ela disse.
- Claro que sabe! - ele respondeu.
Ou,
- Não sei do que você está falando - Maria olhou para baixo, enquanto tentava controlar o tom de voz.
- Claro que sabe! - ele podia sentir a mentira, mesmo sem ver seus olhos.
Ou ainda:
Maria olhou para baixo.
- Não sei do que você está falando.
Ele não tinha dúvidas.
- Claro que sabe!
Vejamos agora, o que Rita Rolim, no lindo português de Portugal, tem a dizer sobre diálogos:
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DIÁLOGO
O diálogo é uma forma de discurso e modo de expressão literária em que dois interlocutores (o “eu” e o “tu”) se alternam reversivelmente interagindo na comunicação, discussão e troca de ideias, informações, sentimentos, pensamentos e atitudes. O diálogo constitui-se, assim, como o cânone da interacção verbal cuja origem remonta aos primórdios da Humanidade quando o homem começou a sentir a necessidade de comunicar. Para Benveniste, o diálogo consiste na enunciação de um determinado “quadro figurativo” entre duas instâncias, locutor e alocutário.
O intercâmbio discursivo que o diálogo apresenta pode surgir na narrativa, na poesia lírica e domina o desenvolvimento do drama no teatro. Enquanto que na narrativa e na poesia, a figura do narrador emerge como organizador/mediador óbvio do diálogo, o drama constitui-se como uma reprodução fiel do intercâmbio dialógico das personagens o que implica a ocorrência de discurso directo ou citado na cena (tentativa de imitação ou aproximação discursiva máxima à duração real da situação narrada) e o apagamento (parcial porque o narrador continua a gerir e organizar toda a matéria diegética) do narrador, permitindo maior proeminência às próprias personagens. A reflexão sobre a dramatização do diálogo coloca diversas questões teóricas relacionadas com a oposição entre “mimesis” e “diegesis” (formulada no âmbito da discussão platónica) e com a distinção entre “telling” e “showing” (equacionada por H. James e P. Lubbock). A representação dramática assiste, de certa forma, à transformação das personagens da narrativa em actores, dinamizando a transição do plano da “diegesis” para o da “mimesis” (na teorização platónica) ou a passagem do “telling” ao “showing”(segundo o quadro teórico de H. James e P. Lubbock).
A inserção do discurso directo que constrói o diálogo é processada no texto através de verbos declarativos e surge no texto assinalada com dois pontos, travessão ou aspas. Existem, contudo, diversas formas de introdução do diálogo na narrativa: José Saramago, por exemplo, utiliza o diálogo de forma original sem recorrer a estas formas de sinalização gráfica, optando por fundir o discurso das suas personagens com comentários seus de teor metaliterário, crítico, político, social, ideológico, filosófico, etc.
https://www2.fcsh.unl.pt/edtl/bullet3c.gifdiegese, drama, discurso directo, mimesis, narrativa, narrador, personagem
BIB.: E. Benveniste, Problèmes de linguistique générale, Paris, Gallimard, vol. 2, 1974; M. Berendsen, “The Teller and the Observer: Narration and Focalization in Narrative texts”, Style, 18, 2; P. Lubbock, The Craft of Fiction, 1939.
Trecho retirado do E-Dicionário de Termos Literários – aliás, um dos mais completos trabalhos sobre literatura que eu já encontrei na internet. É simplesmente,
M A R A V I L H O S O!!!
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Não precisa ser óbvio. É de clareza que estamos falando.
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