Encontro com a Vida - parte II
Atualizado dia 22/05/2013 12:51:01 em Espiritualidadepor Enildes Corrêa
Compreendi, de forma muito profunda, o que significa para uma pessoa que está morrendo, sobretudo para quem se sente sozinha, poder segurar com confiança as mãos de alguém. O encontro com pessoas amigas e afetuosas vivifica o ser humano em qualquer tempo, inclusive na hora da morte, ajudando sobremaneira no momento da passagem.
Essa passagem se torna mais fácil às pessoas que abriram o coração para o fluxo do amor. Quem aprendeu a amar e a se entregar à Vida com total confiança não vai temer a morte, ainda que por um motivo ou outro esteja só. Todavia, será bem mais árdua para os que não se empenharam em adquirir um mínimo de compreensão sobre a vida, que congelaram seus sentimentos e fecharam-se como conchas em seu pequeno mundo.
Quanto ao meu amigo, contrariando as expectativas médicas, resistiu bravamente àquela doença fulminante, inclusive a duas intervenções cirúrgicas, às quais dificilmente sobreviveria, segundo os prognósticos médicos. No fim de sua curta existência de 56 anos, ele abraçou e valorizou a vida, assumiu o risco de viver, tomou essa responsabilidade em suas mãos, apesar da dor e do sofrimento pelo qual estava passando, e prolongou um pouco mais seu tempo nesta dimensão. Deu-nos ainda o presente de vê-lo brincar e sorrir.
Esse foi um dos mais preciosos aprendizados que o amigo Roberto nos deixou: é possível brincar e sorrir, mesmo na dor, mesmo no leito de morte. Mais que isso, é fundamental às pessoas enfermas estarem cercadas de gente alegre, de fato vivas, que lhes transmitam vitalidade, carinho e confiança. A contradição é muitos daqueles a serviço médico parecerem mais mortos do que seus pacientes que estão morrendo. A medicina ocidental avançou largamente em tecnologia, entretanto, parece que se esqueceu de estimular algo fundamental em qualquer tratamento de saúde: o amor e o calor humano.
Ao meu amigo, fica o meu eterno agradecimento por tudo o que, através dele, a Existência me mostrou e me revelou, como o milagre da rendição à Vida, com o que quer que Ela nos faça vivenciar. Constatei que a morte pode trazer consigo também um renascer para a vida. Antes da sua partida, deixei-o saber que estar com ele como irmã e assistir-lhe em sua enfermidade, ao invés de peso, transformou-se numa bênção. As lições aprendidas tornaram-se incontáveis e de imensurável valor.
E, ao mesmo tempo em que a morte batia à sua porta, para nosso pesar e tristeza, um fenômeno especial acontecia entre aquelas paredes: eu estava sendo acordada para a vida!
Quando eu saía do hospital e ia embora para casa, andando e respirando livremente, com olhos que enxergavam a beleza do amanhecer, do entardecer, das árvores, das flores, sentia-me tomada pelo sentimento de gratidão. Agradeci a Deus por tantas coisas, que nem daria para citá-las aqui. Os meus problemas ficaram tão diminutos!
Refleti que reclamamos por tão pouca coisa... Exigimos muito e agradecemos pouco. Quase nunca estamos satisfeitos. Ficamos correndo de um desejo a outro e, raramente, agradecemos à Vida pelas dádivas que recebemos, a começar pela nossa própria existência. Com a mente cheia de desejos, fechamos as portas para um modo de viver mais natural, simples e harmônico. E assim, a vida vai passando e a maioria das pessoas fica fora dela, vivendo em plena contramão...
As palavras de Kiran reverberam em todo o meu ser:
Acordem e voltem para a vida. Por que vocês não acordam? É tão simples!
Comecem por se aceitar do jeito que vocês são. Então, a primavera chega e a grama cresce por si mesma...
Parte 1
Texto revisado
Avaliação: 5 | Votos: 23
Administradora e Terapeuta Corporal Ayurveda. Formação e especialização na Índia. Ministra palestras e seminários vivenciais a organizações governamentais e privadas. Autora do livro "Vida em Palavras" - coletânea de crônicas. E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Espiritualidade clicando aqui. |