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Entre dois mundos - Capítulo 4

Atualizado dia 10/1/2010 3:44:38 PM em Espiritualidade
por Satyananda


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Parte 1

Foram três longos anos de estudos, que começaram a partir da Bíblia, do entendimento de quem era a figura de um ser que hoje nós conhecemos como Jesus. Tentar entender o que significa a figura de um Cristo e por que esse homem se destacou na história, por que se sacrificou por um ideal, isso para um jovem de 20 e poucos anos, surfista, que estava mais preocupado em brincar com a vida do que assumir qualquer tipo de responsabilidade, era uma reflexão que veio antes do período da maturidade e isto para compreender a razão desses homens, o São Francisco, do filme, e o São Francisco de Assis, de verdade, o Jesus Cristo e o recém-descoberto Mahatma Gandhi, pensarem e agirem da maneira como agiram.

Foram exaustivos anos lendo biografias e ensinamentos e o tempo foi ficando cada vez mais extenso, pois, a sensação de não encontrar em um livro o que significavam aquelas luzes... e, mais ainda, o que era o sentimento que habitava agora sua mente e coração, um sentimento de expansão, sem eco nenhum no mundo; nenhuma pessoa em volta estava interessada em entender a vida, ninguém se preocupava com a morte, com a possibilidade de morrer no próximo segundo. Era uma sensação de que o tempo ia passar e a gente ia deixando as coisas importantes para pensar no dia seguinte.

Então, o Marcio entrou em um processo de reclusão voluntária, trancou-se no quarto e leu... foram quatro livros, ao mesmo tempo: o Baghava Gita, Lao Tsé, a Bíblia, o Corão.

Como pesquisador, procurava pontos em comum entre esses livros e ainda a chave que ligava tudo aquilo, que era o amor, um amor incondicional, sem restrições, compreensivo, um amor totalmente desprovido de exemplos... e não encontrava ninguém que sentisse e pensasse dessa forma no mundo.
Era como um vazio, um vazio enorme; a faculdade à noite se tornou uma enorme televisão, onde em cada aula o Márcio sentava e apenas olhava para tudo... na mente, no olhar, procurava apenas pessoas de verdade e o que, para ele, naquele tempo, significava pessoas amorosas, afetivas, gentis; não era possível que na história do planeta só existissem alguns exemplos desse tipo de visão, desse tipo de realidade.

O desespero foi chegando e os livros já não satisfaziam mais.
E o Márcio saiu de uma aula à noite, caminhou -chorando muito-, perambulou da universidade, que fica no bairro do Higienópolis, até o largo São Francisco, onde há duas igrejas de São Francisco, entrou na igreja da direita, que é a Igreja das Chagas de São Francisco de Assis, uma igreja mais vazia, já conhecida por ele, entrou e ajoelhou-se em frente ao altar onde tinha uma estátua do Jesus todo marcado da crucificação, com pouquíssima luz. Colocou a cabeça no chão e chorou, chorou com uma intensidade e desespero incontáveis; parecia que toda a dor do mundo estivesse naquela dúvida de não encontrar ninguém amável, ninguém gentil de fato e que prestasse atenção no outro.

Entre esse momento e o filme já havia se passado quase três anos. Chorou muito, não apareceu ninguém, a igreja estava vazia, provavelmente estava na hora de fechar... e assim, como que de súbito, o choro passou, levantou a cabeça e olhou para o altar, as lágrimas estavam secando, aquela estátua continha um brilho azulado muito próximo ao daquele homem da carroça e dos seres que foram vistos naquele dia, parecia até que os olhos da estátua estivessem olhando para ele. Foi possível perceber vida na estátua, uma vibração luminosa brotando como uma fumaça, surgindo de todo o altar, de cada figura sagrada, de cada detalhe na parede e o ambiente -como que de repente- passou a ser um ambiente de sonho, tudo vibrava...

O corpo começou a adormecer, os pés, as mãos... da ponta dos dedos para dentro, ele foi forçado a sentar, bateu com as mãos nas pernas para tentar fazer passar essa sensação de dormência, porém ela foi tomando conta de todo o corpo, que passou a vibrar em uma intensidade muito forte, muito expressiva, e, então, ele saiu caminhando como se estivesse em transe, (hoje eu sei que foi um transe). Caminhou do Largo São Francisco até próximo da Rua Martins Fontes, onde havia uma livraria. Nessa época, ele garimpava todos os livros possíveis, de Humberto Holden, até livros chineses sobre geomancia, ciências espirituais e ciências ocultas. Ao entrar, foi até a sessão de livros espirituais e passou a mão em frente aos livros... a mão parou na direção de um livro que dizia: “Ramana Maharishi, o caminho do autoconhecimento”, um livro que tinha a imagem de um santo da Índia e, por uma incrível coincidência, tinha a capa de um tom azulado muito próximo das cores azuis que ele reconhecia e havia visto pela cidade em algumas pessoas, nas pegadas e nos animais, um azul intenso -mas absolutamente luminoso- com algumas nuances de branco.

Comprou o livro e, com ele nas mãos, saiu caminhando pelas ruas... Chegou em casa, trancou-se no quarto e abriu o livro... uma surpresa fantástica o levou a perceber que se tratava da história de um santo na Índia, o sexagésimo quarto de uma linhagem de Shiva, uma linhagem de homens de total pureza, dos homens que andam semi-nus, sem nenhum tipo de posse, sem nenhum tipo de desejo, sem preocupação no futuro e sem memória nenhuma do seu passado: são os homens que entregaram toda a existência a Deus renunciando a qualquer tipo de ação no mundo e fora dele.

Parte 2 deste 4º Capítulo + links para outros Capítulos e a versão em espanhol
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