Fata Morgana
Atualizado dia 7/14/2013 8:07:48 PM em Espiritualidadepor Christina Nunes
A aproximação, inevitavelmente, nos coloca em situação de intimidade com a realidade essencial de tudo, e vários exemplos cotidianos podem ilustrar este fato com facilidade.
Olhamos uma paisagem campestre, montanhesa, ou marítima, e nos extasiamos. Tudo, de fato, é perfeição que nos sugere um estado de paz intocado, incorruptível, quase estático! Todavia, tal percepção superficial é enganosa - como fata morgana traiçoeira! Porque qualquer proximidade maior destes mesmos cenários, efetivamente, nos colocará em contato mais confiável com aquilo que constituí a verdade fidedigna destes quadros paradisíacos!
A visão à distância não nos aproxima do autêntico universo vital em modificação constante, presente em qualquer lugar onde nos situemos. Na montanha verdejante, deparamos com sua fauna e flora. Multiplicidade de insetos e de plantas! Uns, simplesmente atraentes, belos; e outros tantos, à parte sua beleza, dotados de ameaças para o visitante humano. Animais ferozes; flores e folhagens venenosas; insetos igualmente dotados de uma qualidade defensiva agressiva contra predadores e o contato do homem. No mar, igualmente, por sob os mantos caldalosos fascinantes refulgindo sob os raios solares de um começo de manhã, movimenta-se, intenso, o reino vital dotado de belezas extasiantes coexistindo ao lado do perigo. Tanto nos lençóis ondulantes dourados dos campos de trigo sob os ventos perfumados da tarde morna, quanto no habitat mágico das cachoeiras e dos rios, portanto, lado a lado coexistem o conjunto interativo do belo com os movimentos constantes da vida pulsante de cada habitat, com o qual o ser humano deverá aprender a interagir, para visitá-lo em situação de salvaguarda de si próprio, a par de somente se deslumbrar com a beleza estática entrevista à distância, aparentemente destituída de ação, como pintura paisagística inofensiva, mas inócua.
Se ponderarmos com calma, concluiremos que, em tudo, esta mesma regra existe, para aprendizado da nossa jornada rumo ao infinito: a sedução precipitada das aparências, funcionando como armadilha para o incauto que pensa poder lidar com os fatos da vida detendo-se, imprevidente, somente na sua superficialidade, e esquecendo-se, via de regra, que é da essência de tudo que nos sobrevém a melhor nutrição, para uma qualidade digna de evolução.
Julgamos lugares e os seres com quem convivemos no dia a dia pelo aspecto de primeira vista, ou pelas roupas que vestem, e pela postura superficial que encenam, assim como, diante dos cenários descritos acima, avaliamos um conteúdo paisagístico somente com base nas belezas ofuscantes das cores da natureza sob o brilho hipnótico dos raios do sol, ou do clarão misterioso de um luar pleno.
Pensamos conquistar sucesso da vida, diante dos semelhantes, e nas situações corriqueiras, envernizando ao máximo nossa apresentação exterior - roupas de grife, vocabulário rebuscado; postura superior, e armadilhas de um traquejo social bem encenado - nos esquecendo de que, à nossa revelia, a movimentação intensa das engrenagens diárias são simbióticas e não param, e arrastam-nos, quando menos esperamos, para direções e surpresas que não faziam parte do nosso script previamente ensaiado!
Assim como nos encantos de um passeio montanhês podemos deparar com uma precipitação chuvosa súbita, que nos alterará todos os planos, ou com a intervenção indesejada do ataque de um inseto venenoso que pisamos no solo, por imprevidência, o fluxo dos dias, inevitavelmente, nos deparará vez ou outra com desfechos tão inéditos no contexto de situações que julgávamos sob nosso controle absoluto, quanto, na simplicidade bela dos cenários paradisíacos, somos frequentemente confrontados pela interferência não mais que natural da ação dos seus habitantes!
E é então que as percepções ilusórias se desfazem, e a realidade autêntica das coisas se faz mais visível -chocante, talvez- todavia, ainda e sempre bela, se conseguirmos apreendê-la na sua essência educativa perfeita para a evolução de nossos espíritos! E muito mais enriquecedora para a construção do nosso cabedal de experiências, do que o seria a realidade imóvel das aparências fictícias, que em nada nos acrescentariam, se assim acontecesse segundo as nossas conveniências muitas vezes imaturas, pueris!
O fato é que, onde quer que estejamos, meus amigos, o que prevalecem são cenários de beleza única -mas uma beleza móbil, rica em detalhes e em surpresas renovadas, em constante movimento!
Nada, jamais, será estático! Porque vida é processo e não residem, a paz e a felicidade verdadeira, em qualquer conceito engessado, ou em percepções ilusórias de uma Existência que, para a maior glória da Criação, se manifesta e se sustenta, eterna, vitoriosa, em fluxo; em modificações e em aperfeiçoamento constantes!
Porque é justo na simplicidade destas pequenas e por vezes imperceptíveis mudanças que reside a verdadeira nutrição de espírito, responsável por identificarmos os grandes portais das realidades essencialmente mais felizes e sempre ao nosso alcance, se nos dispusermos a utilizar a chave correta de um mergulho interativo despojado e destemido nas surpresas insuspeitadas, e reservadas por pessoas, por situações e por vivências, em cada um dos nossos dias!
Texto revisado
Avaliação: 5 | Votos: 5
Chris Mohammed (Christina Nunes) é escritora com doze romances espiritualistas publicados. Identificada de longa data com o Sufismo, abraçou o Islam, e hoje escreve em livre criação, sem o que define com humor como as tornozeleiras eletrônicas dos compromissos da carreira de uma escritora profissional. Também é musicista nas horas vagas. E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Espiritualidade clicando aqui. |