Meditação: uma utopia?




Autor Marco Moura
Assunto EspiritualidadeAtualizado em 11/07/2013 09:17:23
As pessoas buscam a meditação como uma forma de desenvolver o equilíbrio, a saúde, a paz interior, a serenidade, o autoconhecimento e a espiritualidade. Essas são palavras bastante pronunciadas, mas pouco vivenciadas, pois não fazem parte do sistema no qual estamos inseridos: um sistema discriminatório e dualista.
Nós vivemos na chamada sociedade. A sociedade é um sistema e todo sistema necessita de componentes que o façam funcionar segundo uma ordem. Esses componentes somos nós. Nós nascemos sustentados pela sociedade e ao mesmo tempo a sustentamos. Precisamos agir conforme as regras da sociedade para que recebamos o seu amparo; precisamos sustentar a sua maneira de existir, suas crenças e ideologias. Dessa forma, os nossos parâmetros de pensamentos e comportamentos adéquam-se a esse sistema. Quanto mais satisfizermos esse sistema, maiores benefícios teremos em troca, não é? Status, poder, fama, controle: tudo isso alimenta o sistema e se apóia na dualidade que compõe a sociedade. Toda qualidade que ela sustenta fomenta o seu aspecto oposto, portanto é natural que favorecendo o correto, o belo, o desejável e o respeitável, surjam o incorreto, o feio, o indesejável e o desrespeito. A polícia existe em função do bandido; o médico existe em função da doença.
A sociedade sustenta a dualidade e gera, naturalmente, efeitos colaterais como a intolerância, a crítica, o julgamento, o caos, a insanidade e a doença. Tudo isso é natural dentro da dualidade. Ela cria algo que você deve perseguir e, ao mesmo tempo, algo que deve repudiar. Enquanto a dualidade for alimentada, haverá sempre separatividade e, nesse contexto, um tenta dominar o outro, fazendo proliferar a violência. Somente a unidade é libertadora. A dualidade não admite aceitação incondicional, somente parcial.
E nós, como ficamos? A dualidade e a unidade também existem em nós, talvez na forma de um eu exterior (adquirido) e um eu interior (inato). O eu exterior sobrevive em função da sociedade, seus desejos se apoiam no que é pregado pela sociedade, sua forma de pensar é ensinada pela sociedade. Todo esse processo forma o ego, que é uma criação mental com bases na interação com a sociedade. Seu comportamento é compatível com o sistema e não com a verdade interior.
O eu interior é aquilo que temos como verdade mais profunda. Podemos viver em meio ao luxo e a tudo aquilo que é classificado como “bom e belo”, mas a nossa saúde física e mental pode não condizer com isso. Desordens como depressão, ansiedade, pânico são indicativos de que o nosso eu verdadeiro está reprimido e insatisfeito. Claro, se o nosso comportamento não tem raízes no nosso eu verdadeiro, ele não pode se satisfazer. O modo de agir da sociedade reprime a nossa essência, que se exprime através do veículo que é o nosso corpo e a nossa energia.
Então vem a questão: como vamos agir dentro da sociedade beneficiando o nosso eu interior? Afinal, a sociedade não quer pessoas livres, que tenham as suas próprias vontades e ideias. Ao mesmo tempo, necessitamos sobreviver em meio à sociedade, com dinheiro, relacionamentos, etc. Se não nos encaixarmos aos moldes e ao ritmo da sociedade, ficaremos sempre para trás, rejeitados e na pobreza. Devemos simular obediência? Ter estratégias para nos refugiarmos de tempos em tempos desse caos?
Grandes mestres do passado deixaram dicas importantes a esse respeito. Nada de fuga da realidade. Não vamos achar estratégias dentro do mecanismo do sistema, pois estaríamos sustentando-o e nos afastando cada vez mais da origem. Ao invés disso, vamos nos adaptar à realidade através não daquilo que foi inserido na mente, mas através daquilo que realmente somos. O ego é uma invenção, pois é uma peça dentro da diversidade. Em verdade, somos uma só energia, somos o próprio Universo. Precisamos abandonar a mente dualista e adotar a mente integrada, observando imparcialmente sem nos identificarmos com os pensamentos, sem sustentar julgamentos e conceitos, mas permanecendo livres e atentos. A mente liberta é perceptiva: em vez da crítica, há a compreensão; em vez da intolerância, há o acolhimento.
Observando nossos pensamentos, compreendemos que tudo o que percebemos do exterior é uma projeção de nossas próprias mentes. A própria sociedade que nos torna doente é uma projeção da mente. Se nós a percebemos lá fora, ela existe aqui dentro. A proposta é: esvazie-se. Transcenda o convencional e harmonize-se com a realidade tal como ela é. A imagem do mundo é uma convenção que a mente utiliza para funcionar. Perceba que é uma ótica parcial e muito distante do real. A vida real não é fixa, é adaptável. A todo momento, enquanto presentes no momento, a vida vai sendo criada e está em nossas mãos fazer com que ela esteja enraizada em nossos corações ou não. Para encontrar essa raiz, é preciso mergulhar no silêncio, onde os ruídos do exterior jamais penetram.
Marco Moura









Marco Moura conduz no Centro Dao de Cultura Oriental (metrô Ana Rosa, São Paulo) práticas voltadas ao desenvolvimento integral do corpo e da mente, por meio do Tai Chi Chuan, Qigong e Meditação Budista. E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Espiritualidade clicando aqui. |