NASCER É SUICIDAR-SE...



Autor Maísa Intelisano
Assunto EspiritualidadeAtualizado em 24/09/2011 00:24:46
Se formos parar para pensar na vida que levamos e na ideia de suicídio, teremos que admitir que o simples nascer neste planetinha azul já seria uma forma de suicídio... Ao nascermos começamos, também, a morrer. Ainda mais num planeta tão cheio de problemas e dificuldades... Respirar nos mantém vivos, mas também nos encaminha para a morte. Será suicídio respirar?
Pensar é inevitável, mas também nos consome energias e, portanto, também nos aproxima mais e mais da morte. Seria pensar um suicídio?
Já repararam que é impossível viver sem caminhar fatalmente para a morte? Então, viver é suicidar-se??? Mas se eu não quiser viver, e quiser morrer, serei suicida também...
É muito fácil condenarmos o que não compreendemos. Ou continuarmos a condenar aquilo que aprendemos ser condenável, sem questionar. E é assim com o suicídio...
A morte é um tabu entre nós. Um assunto quase proibido. Que dirá da morte desejada, da morte auto-inflingida, da própria morte planejada?
Aprendemos que a morte é ruim, é triste, é dolorida e que, portanto, ninguém deve desejar a morte. E isso vem nos criando uma série de outros problemas e dores, pois quanto mais vivemos, mais próximos ficamos do momento da morte, sem conseguir saber exatamente como e quando ela virá! E aí temos uma sociedade que paga para não envelhecer, de jeito nenhum, pois envelhecer significa se aproximar da morte.
O grande "medo" talvez seja que o suicida, de repente, esteja "certo". O grande "medo" talvez seja descobrir que todos podemos ter o desejo de morrer. O grande "medo" talvez seja perceber que todos somos suicidas em potencial. O grande "medo" talvez seja darmo-nos conta de que temos sido suicidas desde o dia em que nascemos.
Maísa Intelisano
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Comentários de Lázaro Freire
https://www.voadores.com.br/lazaro
Grande mensagem, Maísa. Viver é oxidativo. Começar a viver é começar a morrer. A morte está presente, diretamente, em cada ciclo de respiração celular dos bebês. Impossível não estar em nosso psiquismo também.
Seu texto acima me fez lembrar dos princípios de vida e princípios de morte (pulsões, de Freud) coexistindo em todos. E das aulas de corrosão, quando estudei enegenharia. E também da respiração celular, oxidação e radicais livres - do que sabemos hoje de porque envelhecemos e morremos a partir da vida. E das oposicoes complementares em psicopatologia, que alternam prazer e dor, criação e destruição, tais como fumar, sado<->masoquismo, gosto pela velocidade, esportes radicais, parques de diversões, odiar quem se ama, apaixonar-se por quem se odeia. E da coexistência mitológica dos princípios Brahma, Vishnu e Shiva, cardinal. fixo e mutável. E das Felícias que estrangulam seu gatinho como demonstração suprema de amor.
Para não falar das guerras, a partir das quais Freud e outros tiveram que rever suas teorias sobre prazer e vida, e admitir, surpresos, a existência em todos, desde sempre, de um princípio de morte/destruição concomitante, além do princípio do prazer. Não se explica o homem sem compreender isso. Aliás, não se explica nem a voadores - www.voadores.com.br, onde tantos abrem mão de partes importantes de sua vida para discutir as questões da morte e do além. A morte habita em nós; e, quanto mais vivos somos, mais lidamos com a morte também.
Do mais básico da célula ao mais abstrato do psíquico, começar a viver é começar a morrer. Respirar é oxidar. Ou, como costumo dizer na clinica, "VIVER É CORROSIVO".
Assim como, na fala de Agostinho, "pensar é pecar". Não há como respirar ou pensar sem deixar resíduos de suas ações. Não há possibilidade de luminosidade sem sombra em nós. Comer já implica retirar a vida de outro animal ou vegetal, pisar afeta o ambiente, atuar no mundo é modificar a natureza, enquanto o meio alterado também nos modifica dialeticamente. Começar a viver é começar a morrer. Pensar é pecar. Ser luminoso é provocar sombra. Respirar é oxidar. Viver é suicidar. Agir é transgredir. Edificar é destruir e transformar. Tomar partido é desagradar ao partido que não se tomou.
Viver bem é suicidar-se; portanto, aquele que vive sem ação, sem confronto, sem pecado, sem morrer um pouco a cada dia, talvez seja o único que de fato se "suicidou": escondeu seus talentos, pecou contra Dionísio, abandonou a vida que recebeu. E, sem a embriaguez trágica de Dionísio, o que resta é uma luminosa e periosa ilusão. Começa aí, aliás, a crítica de Nietzsche ao cristianismo, aos sistemas pseudo-luminosos e todas esses sistemas moralistas que, na hipocrisia da condenação alheia, distraem-se da necessidade e possibilidade de VIVER a vida que têm, em toda a sua doce e trágica extensão.
Jung diz, após ler Fausto de Goethe, que Deus fez o pecado porque QUER que o desobeçamos quando suficientemente maduros. É por aí, pensar é transgredir, é preciso coragem para começar a envelhecer e morrer. Talvez por isso tantos se agarrem no narcisismo da Terra do Nunca, em eternos conflitos infantis entre o bem e o mal.
Respirou, suicidou. Pensou, pecou. Agiu, errou. Utilizou, consumiu. Por isso é preciso CORAGEM para seguir adiante, sabendo que pensar desagrada, que andar pisa, e ainda assim é indispensável ter um rumo a seguir. Ou, como resumiu escatologicamente meu sábio pai, "quem tem medo de cagar, não come".
Que atire a primeira pedra em André Luiz ou no Tiago aquele que consegue viver sem se suicidar um pouco a cada dia. Tenho mais pena dos que têm a ilusão de viver em plena certeza e luz, julgando as "fraquezas espirituais alheias" e taxando quem vive de "suicida". Eu me lembro de outros "religiosos" semelhantes que faziam esse papel na abertura de Nosso Lar.
Texto revisado









Psicoterapeuta com formação em Abordagem Transpessoal, Constelações Familiares, Terapia Regressiva, Florais de Bach e Reiki II, é também tradutora e revisora; palestrante e instrutora em cursos sobre espiritualidade e mediunidade; e fundadora e presidente do Instituto ARCA de Mediunidade e Espiritualidade. E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Espiritualidade clicando aqui. |