FERNANDO PESSOA E O DEVIR

FERNANDO PESSOA E O DEVIR
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Autor Maria Goret Xavier

Assunto Psicologia
Atualizado em 15/04/2009 23:01:36


 

FERNANDO PESSOA E O DEVIR

    

Pensando acerca do "Devir", do "vir a ser", das múltiplas facetas que um homem pode "experimentar-se", enquanto formas de atuação, de vivências afetivas, de estados do ser até chegar a algum lugar, ou não ..., lembrei  de Fernando Pessoa, esse poeta que encantou o mundo com seus escritos e, principalmente com a sua forma toda especial de escrever : criando heterônimos.  Este poeta inventa outros seres, dá-lhes uma estória de vida, estilo próprio e até um mapa astral, sendo todos eles grandes artistas, além de possuírem diferentes posturas de vida.  Alberto Caeiro, um dos heterônimos, nasceu em Lisboa, viveu quase toda a sua vida no campo, teve muito pouca instrução,  Vivia com uma tia velha, tia-avó. Morreu tuberculoso.  Tinha como busca literária a completa naturalidade.  Ricardo Reis, era discípulo de Caeiro, erudita, tradicionalista na política e na Literatura.  Foi educado num colégio de jesuítas, é médico e viveu no Brasil. Possui estilo Neoclássico, onde a simplicidade é estudada, forjada pelo intelecto com poemas metrificados e de uma sintaxe rebuscada.     Álvaro de Campos, nasceu em Tavira, teve uma educação vulgar de Liceu;  estudou Engenharia na Escócia,  passou algum tempo em Lisboa em inatividade.  Seus poemas são marcados pela prolixidade e pela oralidade, despreza a rima e na última fase de sua poesia, refletia amargura, pessimismo e desilusão sobre a existência.

"Não sou nada.

 

Nunca serei nada.

 

Não posso querer ser nada.

 

À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo(...)"

 

     É impressionante verificar que as suas "criações", os seus "Eus", ou os seus Devires, possuem uma biografia, uma história, um enredo vivencial completamente compatível com o estilo literário de cada um.  É como se Fernando Pessoa se despersonalizasse e retirasse essas criaturas de suas entranhas e mudasse a sua identidade para Alberto Caeiros, Ricardo Reis, Alberto Campos entre outros mais.

     Como seria esse processo interno de Fernando ? O que se passava no seu interior?  Como psicóloga me inclino a realizar explicações sobre a sua subjetividade, criando hipóteses.  Seria uma espécie de dissociação histérica onde múltiplas personalidades vão se manifestando ?  Descarto esta hipótese, pois ele tinha consciência de todo o processo e o fazia com o exercício da sua vontade. 

     Será que a sua angústia existencial era tão intensa, que cindia o seu "Eu", provocando um processo esquizofrênico ?  Uma espécie de surto psicótico ?  O que realmente existia na sua subjetividade que o levava a escrever desta forma tão "sui generis" ?  Que tipo de armaduras caracteriológicas ele possuía ? Onde seriam suas estases energéticas ?

     Nesse ir e vir de interrogações,   comecei a imaginar Fernando Pessoa em um consultório sofrendo uma intervenção analítica e o profissional desconhecia sua notoriedade.

Psicólogo : "O que o trouxe aqui?"

Fernando: "Nada de anormal, apenas o interesse em me conhecer mais profundamente."

Psicólogo: "Sim.  Mas qual o aspecto que você gostaria de investigar ?"

Fernando: "Neste momento, Eu sou Alberto Campos, sou um poeta erudito, angustiado por não conseguir simplificar a vida.

Psicólogo: "Mas você não se chama Fernando Pessoa?"

Fernando: "Neste momento a minha existência afetiva me torna Alberto Campos.

Psicólogo: "Percebo em você problemas de identidade."

Fernando: "Como assim ?"

Psicólogo: "Você não sabe quem é você, o que você pode ou não.  Os seus limites  e as suas potencialidades."

Fernando: "Pelo contrário, eu as exploro tão intensamente, que não caibo em mim mesmo.  Preciso criar outros e assim me possibilito inúmeras maneiras de vivenciar e de perceber a existência;  sou levado pela intensidade de meus afetos que são maiores do que eu e por isso, eu me torno outros, conseguindo uma maior expansão."

Psicólogo: "Não.  Creio que você está cindido, dissociado do seu verdadeiro Eu."

Fernando : "Posso até concordar com você.  No entanto, não posso abrir mão dos meus "Eus".  Eles são.  Existem.  Se expressam.  Se são partes cindidas  de mim, não tem importância;  o importante é que me enriquecem."

     Mediante esse diálogo surgido no meu imaginário, conclui que a questão principal, a que tinha relevância, não era enquadrar Fernando Pessoa em um armadura caracteriológica ou tecer explicações analíticas acerca de suas motivações inconscientes.  Percebi que, o mais importante é que o Psicólogo fique atento as inúmeras possibilidades de existência, das inúmeras formas de vivenciar os afetos que são intensos e infinitamente variáveis.  Percebi que a riqueza de expressões humanas é que devem servir como paradigma principal ao psicólogo - estudemos, conheçamos, teorizemos - Mas diante de um ser humano, tentar apenas enquadrá-lo nisto ou naquilo, seria perder uma riqueza expressiva e criativa , limitando aquilo que devemos dar potência e dinamização : AS INÚMERAS POSSIBILIDADES DE EXPRESSÃO HUMANAS.

     Fico pensando quem seria Fernando Pessoa sem essa sua forma tão particular de expressão.  Imagino se ele fosse encaixado e rotulado num "deveria" qualquer : deveria ser mais integrado, deveria ser mais identificado com seu Eu.  O seu Eu era devido ou indevido ? Se esses "deverias" fossem um dever, devido a uma teoria qualquer, o seu "Ser" morreria, indevidamente enterrado,  num silêncio que abortaria a expressão de um ser, que jamais seria "devir/damente" pronunciado.

 

Por: Maria Goret Xavier


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Conteúdo desenvolvido pelo Autor Maria Goret Xavier   
Psicóloga Psicóloga Clínica Pós- graduanda em Psicossomática. Pós-graduada em Psicopedagogia. Cursos de Especialização em Programação Neurolingüística, Gestalt-terapia, Bioenergética. Taróloga, Runóloga, Radiestesista; Trabalho com a Mesa radiônica; Mestra de Reiki
E-mail: [email protected] | Mais artigos.

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