Os tempos são outros
Atualizado dia 7/23/2012 8:24:44 PM em Psicologiapor Paulo Salvio Antolini
Quero deter-me em uma das causas desta frustração. O de termos modelos usados para determinar o que achamos que deve ser e que, na realidade, já não é mais possível. Um exemplo muito comum é a constituição de uma família. Há quarenta anos, cabia ao homem que se casava ter um bom emprego, trazer o provento que abastecesse a casa e desse conforto a todos e à mulher, cuidar dos "afazeres domésticos", ter filhos e criá-los à sua volta. Nada de escolinhas ou babás. Os casamentos eram para todo o sempre e a separação era inaceitável. Coitada da mulher que se separasse do marido ou fosse "abandonada" por ele! Era execrada pela sociedade. Estigmatizada. Poucas chances ela tinha de refazer sua vida. O homem separado também pagava seu preço.
Hoje vivemos no outro extremo, onde o casamento passou a ser algo corriqueiro. Se "não der certo", separa-se e pronto! Parte-se para outro relacionamento. Porém, o que na conduta ficou tão simples, em nosso íntimo não funciona assim. Muitas pessoas ditas modernas trazem consigo os modelos do passado, racionalmente achando-se em perfeitas condições de saúde interior, emocionalmente alteradas pela incongruência entre sua realidade e suas expectativas.
Outro exemplo? As formas de trabalho. Antigamente tinha-se carteira assinada, estabilidade, segurança no emprego. Hoje se trabalha em regime de parceria ou terceirização. Então, os que sonham com a tal estabilidade, deixam de desfrutar as possibilidades que as novas formas oferecem, em muitos casos, até aumentando as possibilidades de ganho real. Novamente a insatisfação, a frustração, a ansiedade.
Conversando com uma pessoa sobre a dificuldade de poder oferecer aos meus filhos parte do que tive, ela me disse: "Você não está considerando que os tempos são outros!". Lembrei-me então de que, na minha juventude, vivíamos o "milagre brasileiro", que hoje vivemos um grande arrocho e que talvez, o que estamos fazendo agora é muito mais difícil do que nos foi feito há anos atrás, sem desmerecimento a ninguém. Eu estava trazendo o modelo de criação e provento que havia vivido. Após essa conversa, o alívio que senti e a satisfação que passei a ter por perceber o quanto estava conseguindo fazer, embora diferente do que me foi dado, foram enormes.
Os tempos são outros.
Precisamos nos desprender dos modelos prontos, já vividos, para dar espaço ao surgimento de novas possibilidades. E é nesse estado de espírito que nossa criatividade aflora, trazendo soluções, idéias, caminhos antes não pensados, mas que atendem plenamente o que é possível de ser vivido e, satisfatoriamente.
Quando ouvimos falar que as mudanças geram incômodos, inseguranças, poucos entendem realmente o que isso quer dizer. É apenas através das mudanças que crescemos, ampliamos nosso "modelo de mundo" e, quanto mais abertos estivermos para elas (termo atual - pró-ativos), mais seguros estaremos, pois teremos a flexibilidade necessária para buscar a adequação às novas situações.
Refletir sobre qual está sendo o referencial que se está usando para comparar nossas vidas é fundamental para eliminarmos as distorções entre o que era e o que é possível hoje. E o interessante é que, quando começamos a elucidar essa discrepância em nossos consultórios, as pessoas começam a perceber, inclusive, que o real, o que está acontecendo, é muito melhor do que o ideal, o que se achava que deveria ser.
Portanto, usem sim os modelos disponíveis, mas com o discernimento de que podem ou não serem aplicados. Por quê? Porque os tempos são outros!
Um feliz ano novo a todos!
Texto revisado
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