Objetivamente, a vida é uma dança porque tudo o que acontece na natureza é através do movimento, do ritmo, da contínua transformação num eterno fluir.
Subjetivamente, a dança é fonte de vitalidade. Vitalidade é energia, força, movimento, expressividade, capacidade criativa, consciência.
Precisamos aprender a dançar-viver em harmonia com essa vida-dança cósmica.
Através da dança espontânea se propõe uma forma, um caminho para a pessoa lidar com seu próprio corpo, com seu próprio ritmo, com suas emoções e expressividade. Diversas técnicas se integram para propiciar o desenvolvimento da auto-percepção, da consciência corporal e da sua manifestação expressiva, num processo de envolvimento da pessoa consigo mesma, com o outro e com o que a cerca, através da dança.
Partimos da linguagem corporal subjetiva, que pode tornar-se objetiva, consciente, à medida que a pessoa vai se aprofundando neste processo, buscando o que ela tem dentro de si. Partimos de uma concepção integrada do homem, na qual corpo, mente, sentimentos, gestos, e posturas constituem diferentes aspectos interdependentes de uma mesma individualidade.
Somente a partir desta noção, a do homem como um ser integral, dentro de uma concepção holística da realidade, da interdependência entre todos os fenômenos, é que podemos compreender a importância destas “novas” propostas que levam ao caminho do autoconhecimento e trazem grande contribuição para o campo da terapêutica humana.
O significado desta busca, dessa crescente difusão de “novas” técnicas de abordagem dos problemas de saúde, de desequilíbrios psico-fisiológicos, desajustes emocionais, stress, etc. todas elas valorizando o trabalho com o corpo, é muito maior do que pode parecer à primeira vista. Principalmente porque logo vem o temor pelo “embuste”, pelo “charlatanismo”, em conseqüência da vulgarização a que estão sujeitas quando são tratadas superficialmente.
O espelho da crise
Podemos dizer que essa busca é o espelho de uma crise. Uma crise muito geral, que envolve todos os aspectos da vida. Hoje ninguém, nenhum ser humano consegue passar ileso por ela.
Nós convivemos mais ou menos ajustadamente com o enorme potencial de autodestruição coletiva (arsenal bélico e armas nucleares); com um acentuado processo de desintegração social (crimes, violência, suicídios, alcoolismo, drogas, etc.); com instabilidades econômicas e políticas; com a vida e a saúde sempre ameaçadas pelas condições ambientais (poluição atmosférica, da água, dos alimentos; péssimas condições de moradia, de saneamento básico, etc.); com a disseminação de diversas doenças (no terceiro mundo, em sua maioria de natureza nutricionais e infecciosas; no primeiro mundo, doenças crônicas e degenerativas) e uma dosagem crescente de pessoas neuróticas, depressivas, esquizofrênicas, etc.
Os avanços tecnológicos e científicos aliados à predominância dos meios de comunicação uniformizaram, ou melhor, padronizaram um certo modo de pensar e se conduzir, e todos nós vivemos mergulhados, conscientemente ou não, neste mundo global.
Nós convivemos com tudo isso e ainda nos consideramos “normais”. É preciso rever este critério de normalidade. É certo que, individualmente, nos sentimos impotentes para mudar algo de tamanha amplitude. No entanto, é preciso estarmos conscientes de que não é possível ser conivente com a doença social e não adoecer com ela.
Conivência significa estar a par, conviver com os problemas e não interferir. Mas é possível, sim, interferir, ao menos no raio de influência ao nosso alcance, começando por nós mesmos. É necessário apelarmos para a nossa consciência. Tudo começa pela autoconsciência.
Para nos ajustarmos à vida social, ao padrão cultural dominante, tivemos que abandonar muito de nossos anseios pessoais. Nos desligamos da vontade íntima. Nos desassociamos de nós mesmos. São raras as pessoas que fazem ou trabalham com o que gostam, ou que podem expressar, naquilo que fazem, todo o seu potencial íntimo de realização.
Nós sabemos que a não realização pessoal, a incapacidade de expressão, de criatividade, de produção, é uma grande fonte, senão a principal, de distúrbios psicológicos, emocionais, mentais. É importante se compreender como somos absorvidos pelos valores sociais e culturais dominantes. Certos valores já estão socialmente tão arraigados na nossa dinâmica de vida, que nem percebemos como interferem no nosso cotidiano, nem sabemos mais de suas origens.