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Lidando com as encruzilhadas da vida

Publicado por Bel Cesar em Espiritualidade

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Quando a gente chega na encruzilhada,
Olha para um lado e nada,
Olha para o outro é nada também
Ai o céu escurece
O céu desaba Tudo se acaba
Só quando tudo esta perdido na vida é que a gente descobre
Que na vida nunca tudo está perdido.
Geraldo Vandré


Alguns momentos da vida nos colocam diante de possibilidades ainda novas para nós. Precisamos fazer uma travessia, passar de um estagio a outro, de um estado de coisas conhecido a uma situação inteiramente diferente.

Algumas dessas passagens possuem rumo certo: de adolescentes nos tomamos adultos, de solteiros nos tomamos casados, e assim por diante. Cada um, de acordo com sua personalidade e condições, vive um roteiro já conhecido, apesar de ainda não ter sido vivido. Nesses momentos, costumamos buscar o exemplo de outras pessoas que fizeram as mesmas travessias para nos inspirar a viver melhor essas etapas.
Mas existem passagens para as quais não temos onde buscar referências, elas são realmente inéditas. São, de fato, como encruzilhadas: a gente não sabe se vai para a direita ou se vai para a esquerda, se “tudo” vai terminar bem ou se estamos à beira de uma descida vertiginosa em nossa vida.
Nestes momentos, fica claro que temos de modificar atitudes e hábitos muito arraigados. “Quando estamos em uma encruzilhada, sem saber para que lado ir, estamos no prajnaparamita. A encruzilhada é um lugar importante no treinamento do guerreiro. E onde nossos sólidos pontos de vista começam a se (Pema Chödrön, Os Lugares que nos Assustam, Ed. Sextante, p. 141. ) dissolver.(*)” Prajnaparamita é a capacidade de desenvolver uma visão da realidade baseada na equanimidade para, então, cultivar a perfeição da sabedoria. A equanimidade refere-se à sabedoria de ficar “no meio” com respeito aos extremos do sofrimento.

Devemos cultivar “uma mente aberta e inquisitiva, que não se satisfaz com visões limitadas e (Pema Chödrön, Os Lugares que nos Assustam, Ed. Sextante, p. 111. ) parciais(*)“. “(...) ‘certo’ é uma visão tão extremada quanto ‘errado’. Ambas bloqueiam nossa sabedoria (Pema Chödrön, Os Lugares que nos Assustam, Ed. Sextante, p. 141. ) inata(*)”.
Nos momentos de encruzilhada, enquanto não sabemos que rumo uma situação vai tomar, a melhor atitude é enxergar, a cada instante, exatamente o que temos à nossa frente. Se formos excessivamente otimistas, desconfiaremos intuitivamente de nossa própria atitude. Se formos demasiadamente pessimistas, teremos uma atitude derrotista que poderá nos prejudicar.

O otimismo exagerado nos deixa arrogantes e o pessimismo, em si mesmo, nos impede de ver a luz no fim do túnel. “Permanecer no meio nos prepara para encontrar o desconhecido sem (Pema Chödrön, Os Lugares que nos Assustam, Ed. Sextante, p. 142. ) temor(*)”.
Quando estamos encurralados, sem saída, terminamos por nos questionar sobre o sentido de nossas vidas. Surgem então as três perguntas fundamentais:
Quem somos?
De onde viemos?
Para onde vamos?
Estas são perguntas freqüentes para aqueles que estão conscientes da transitoriedade da vida.

Em geral, quando somos surpreendidos por situações que nos fazem reconhecer nossa mortalidade, ou quando estamos, de fato, diante da morte, responder a essas perguntas irá nos ajudar a ampliar a visão sobre quem somos verdadeiramente. Do mesmo modo, respondê-las nos momentos de encruzilhada nos ajudará a ampliar nossa visão de vida.

Quando o espaço de tempo para responder a estas três perguntas é realmente curto, a nossa primeira mente surge para nos ajudar. A primeira mente é nossa sabedoria intuitiva. É ela que irá nos indicar a saída quando estamos numa encruzilhada.
Lama Gangchen sempre nos diz: “Quando você escutar sua primeira mente, siga-a”. Jeremy Hayward, discípulo do mestre budista Chogyam Trungpa, nos orienta: “Com excessiva freqüência - desprezamos o primeiro pensamento - achamos que é por demais tolo ou ofensivo. Temos de ser ousados para detectar o primeiro pensamento e segui-lo. O primeiro pensamento pode guiar nossa vida quando (Jeremy Hayward, 0 Mundo Sagrado, Ed. Rocco, p. 186.) confiamos(*)”.
O primeiro pensamento é puro porque ainda não está contaminado por nosso hábito de duvidar. Ele é uma percepção direta do mundo como ele é. Por isso, na Psicologia Budista, é chamado de condição do agora.

Neste sentido, quando temos a percepção correta da realidade, praticamos a Primeira Nobre Verdade.. Mas quando não queremos que as coisas sejam do jeito que estão se apresentando, começamos a sentir medo e evitamos olhar de frente. Negamos nossa primeira mente porque ela foi direta, nua e crua, e gostaríamos de viver mais um pouco a esperança de que as coisas pudessem ser do jeito que queríamos que fossem... Todas as vezes que nos apoiamos numa realidade idealizada, estamos adiando nosso processo de evolução. Perdemos a oportunidade de aprender algo com aquele desafio do qual fizemos de tudo para escapar. Em vez de interpretar o sofrimento como dor ou punição, podemos vê-lo como a oportunidade de superá-lo.

Quando não colocamos em dúvida nossa percepção imediata da realidade, praticamos a Primeira Nobre Verdade: temos a percepção correta da realidade.
No entanto, saber se estamos prontos para encarar o sofrimento é também um ato de sabedoria. Um ditado budista diz: “Só enfrente um inimigo quando você estiver mais forte do que ele. Até lá, continue a se fortalecer”. Existem momentos em que precisamos aprender a criar espaço entre nós e aquilo que nos desafia. Quando nos damos conta de que não somos capazes de lidar com uma determinada situação, é hora de acumular méritos: energia positiva.

Texto extraído do “O livro das Emoções - Reflexões inspiradas na Psicologia do Budismo Tibetano” de Bel César, Ed. Gaia.


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Sobre o autor
bel
Bel Cesar é psicóloga, pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo Tibetano desde 1990. Dedica-se ao tratamento do estresse traumático com os métodos de S.E.® - Somatic Experiencing (Experiência Somática) e de EMDR (Dessensibilização e Reprocessamento através de Movimentos Oculares). Desde 1991, dedica-se ao acompanhamento daqueles que enfrentam a morte. É também autora dos livros `Viagem Interior ao Tibete´ e `Morrer não se improvisa´, `O livro das Emoções´, `Mania de Sofrer´, `O sutil desequilíbrio do estresse´ em parceria com o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz e `O Grande Amor - um objetivo de vida´ em parceria com Lama Michel Rinpoche. Todos editados pela Editora Gaia.
Email: [email protected]
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