Ao pesquisar em jornais e revistas figuras do cotidiano com situações que configurassem os deuses gregos – Marte, Júpiter, Deméter e todos os outros para as aulas sobre os mesmos – o que mais encontrei foram situações que configuravam o deus Marte, não só fotos sobre a guerra recente do Oriente, mas todas as outras formas negativas de atuação de sua energia, seja nos esportes competitivos como em toda a sorte de atitudes agressivas e de violência.
O deus Marte era um deus mal visto até mesmo no próprio Olimpo – morada dos deuses – pois era movido por agressividade pura, desmedida e descontrolada; gostava da guerra pela guerra, o guerrear pelo simples guerrear, pela “adrenalina” que a situação proporcionava, o que acabava desagradando inclusive aos seus pares.
Quando atuamos com a energia de Marte sem que esta seja direcionada e canalizada, tornamo-nos bestiais e competitivos num nível inferior ao humano; mantemo-nos, absolutamente, no nível do instinto.
Na época dos homens das cavernas era imprescindível ter forte senso de agressão, colocado à disposição para a caça por comida e defesa de seu espaço físico, caso contrário, todos morreriam e a raça humana seria extinta.
A necessidade de sobrevivência e a percepção de que a união entre si, seres humanos em paz – e não a separação e divisão da guerra – os fortalecia, aumentando, assim as possibilidades de atingir o objetivo primeiro: a sobrevivência e a manutenção da espécie, levou-os à formação de clãs. Porém, o processo civilizatório e de humanização do homem promoveu um “lapidar” de toda aquela agressividade, que teve suas conseqüências positivas e negativas.
A sociedade humana formou-se para proteger os indivíduos de seus predadores naturais, mas com o passar do tempo ela própria tornou-se maior que os indivíduos abafando – em maior ou menor grau, dependendo da época – as individualidades das pessoas. Eu acredito, ser esta a conseqüência mais negativa do processo civilizatório.
Quando se vive uma vida ou situações onde não há espaço para a expressão da individualidade, é natural que entrem em cena também as piores qualidades do deus Marte: a agressão e a ira.
O deus Marte nos instrumentaliza com estes recursos, instintivos e drásticos, para a sobrevivência. E, psicologicamente falando, não há nada mais ameaçador para a sobrevivência da individualidade do que a impossibilidade de expressar-se.
Podemos perceber isto na sociedade atual, quando as chances de sobrevivência são mínimas e as possibilidades se usufruir o que a televisão apresenta para consumo são somente para poucos. Qual o resultado? Violência!
Esta violência que se apresenta em sua forma geral não é revestida pela revolta, pois para isto teria que ter um certo nível de consciência sobre a disparidade social; o que não ocorre. É puro instinto de sobrevivência mesmo. O nível de violência e agressão, falando de forma genérica, que temos aqui no Brasil atualmente é fruto do instinto natural de sobrevivência. É o deus Marte puro agindo!
Podemos comparar as diferenças de atuação da violência com a época da ditadura militar, onde houve uma grande onda de violência e agressão, mas, absolutamente direcionada a um sistema repressor, onde quem o fazia tinha alto nível de consciência sobre aquela repressão sofrida e era, então, fruto da revolta contra o sistema vigente. Naquela época era o deus Urano que estava em ação!
Hoje vivemos um período de grandes mudanças conceituais do que é relacionamento e o que é vida e viver, isto gera confusão de como agir. “Qual é atitude mais adequada”? Porém, o que está presente, mais do que nunca, é a competitividade entre os indivíduos. Talvez até pela necessidade de sobreviver num período tão caótico! Esta situação faz com que as pessoas fiquem sempre na defensiva e ficar na defensiva é olhar o outro como inimigo – e quando o outro “é” nosso inimigo significa que estamos em guerra contra esse outro.
Falar de guerra é falar da aplicação negativa das energias do deus Marte. Para a guerra basta a utilização da agressão e aplicação da força e da ação deliberada na intenção de destruir o inimigo.
É possível entender, então, as queixas sobre as dificuldades nas relações, que podemos resumir de forma simplista, como a sensação de falta de espaço para expressar sua individualidade e a conseqüente percepção do outro como seu inimigo.
Como pode haver entrega num relacionamento sob essa ótica? Pode haver um relacionamento amoroso assim?
Às vezes, as pessoas exageram na aplicação dessa energia, “carregando nas tintas”, sendo bastante agressivos, intimidando o outro, impondo seu querer e sua verdade em detrimento do querer e da verdade do outro. Outras pessoas escondem até de si mesmas essa força, anulando-se e encolhendo-se diante da vida e do outro. Percebemos, aqui, dois extremos da energia que Marte nos oferece sendo usada de forma negativa.
A utilização positiva das energias deste deus é estabelecer-se na própria vida deixando clara sua individualidade. Quando eu sei quem sou e delimito adequadamente meus direitos e deveres nas relações e na vida (autoconsciência) torno-me assertivo e apresento a minha individualidade sem a necessidade de ter que me defender, e portanto o outro deixa de ser meu inimigo.
É necessário que haja espaço adequado na própria vida para a expressão das qualidades do deus Marte que está dentro de nós, pois é parte de um conjunto de recursos valiosos do ser humano.
O deus Marte nos proporciona o recurso da auto-afirmação e da capacidade de desenvolver a consciência de nossa individualidade diante da vida e diante do outro, por isso não podemos despreza-lo nem descartá-lo, mas, sim, canaliza-lo para que possamos utilizar sua energia a nosso favor e na promoção do máximo potencial possível que temos a nosso dispor.
Uma das dificuldades do ser humano é justamente saber usar adequadamente a energia do deus Marte presente dentro de todos nós.
A aplicação positiva desta energia em muitos casos é aprendida, pois às vezes no decorrer da vida a pessoa vai fazendo escolhas (inconscientes) que vão conduzindo a situações cada vez mais difíceis, “obrigando-a” a ser cada vez mais agressiva – usando apenas e cada vez mais as qualidades negativas. Por isso, é necessário parar e prestar um pouco de atenção em si mesmo e nas escolhas que está fazendo e se proporcionar ativamente (energia do deus Marte) outras opções de escolhas, que sempre haverão.
Por isso é preciso aprender a usar a agressividade natural não como agressão, que gera guerra entre as pessoas, mas, sim, como ação assertiva, afirmando sua individualidade com coragem e por direito, pois onde há espaço para a aplicação positiva da energia marciana há respeito pelas individualidades e, por incrível que pareça, impera a paz.
por Maria Aparecida Diniz Bressani
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Sobre o autor
Maria Aparecida Diniz Bressani é psicóloga e psicoterapeuta Junguiana,
especializada em atendimento individual de jovens e adultos,
em seu consultório em São Paulo.