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Minha nossa senhora!

Minha nossa senhora!
Publicado dia 10/8/2009 5:41:31 PM em Espiritualidade

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Recentemente estava andando pelo centro do Recife (mais especificamente Rua da Concórdia) quando fui acometido de uma fraqueza que, de primeiro, associei à fome (mesmo tenho comido há menos de 2 horas). Comi um cachorro quente e continuei minha caminhada, já saindo dali. 10 minutos depois a mesma tontura e fraqueza, como se eu não tivesse comido nada. "Eita (Devido às tensões por que venho passando nas últimas semanas, certamente sintonizei com as energias `erradas´ do local.) lugar pesadinho(*)", pensei. Apressei o passo pra sair dali, e fui andando pela Rua Nova, sem melhorar. Aí passei defronte a Igreja de Nossa Senhora da Conceição dos Militares (construída em 1723), onde estava sendo celebrada uma missa. Geralmente, eu gosto de olhar igrejas vazias pra apreciar sua decoração, mas a música tipo Marcelo Rossi ( (Fica aqui o alerta pra quem seja o responsável pelo patrimônio histórico da cidade: o som estava com os graves muito altos (MESMO), fazendo o corpo vibrar, imagine, então, a estrutura da Igreja!! Todos sabem do efeito de vibração que os graves provocam no material ao seu redor, e a Igreja passou em 2006 por uma reforma que custou mais de 1 milhão de reais! Se quiserem que a Igreja dure mais 250 anos é bom maneirar, afinal, Deus vai ouvir os louvores mesmo com um volume mais baixo...) altíssima(*)) me espantou. Fiquei parado no meio da rua, encantado com o altar, mas sem coragem de entrar. Mas aí pensei: "caramba, estou aqui passando mal, talvez nem consiga sair do bairro sem ter que parar em algum lugar, e aqui não há nenhum outro lugar melhor do que esse pra se limpar de encosto".

Então, entrei. E não me arrependi. O altar é um dos mais lindos que já vi (incluindo aí o altar da Igreja de São Bento), pois, além de ser concebido no estilo rococó, ele usa um efeito de profundidade - tipo o primeiro estágio de Sonic 1 - com várias camadas uma atrás da outra que dão um efeito 3D lindo de se ver em movimento. Quem gosta de rococó extreme vai amar o telhado, que eu particularmente achei muito "over" (pra mim a virtude está no equilíbrio). Mas o que me chocou foi ver a pintura de teto logo na entrada, que de bíblica só tem o tema: matança com suposta proteção divina.

A pintura gigante no forro em talha representa a Batalha dos Guararapes, onde os (então) (Levaria quase 200 anos pra que os Portugueses investissem em algo no país, ao invés de apenas roubar as riquezas. E isso só se deu com a fuga da Família Real Portuguesa para o Brasil, em 1807 (valeu, Napoleão!). Só, então, a Faculdade de Medicina da Bahia foi criada, apenas para atender às demandas da elite portuguesa, que ia se estabelecer no país por tempo indeterminado. Antes disso, Portugal não permitia a criação de nenhuma faculdade em suas colônias (Nas possessões espanholas, existiam universidades desde o século 16!). Os políticos brasileiros até hoje sabem do poder do ensino e por isso mantêm o povo BURRO e no CABRESTO.) parasitas(*) de Portugal expulsaram os Holandeses (os únicos que trataram o Brasil com (No governo de Nassau muitos melhoramentos foram feitos nas áreas urbanas, como saneamento básico, contrução de casas e o agrupamento das mesmas em vilas, construção de pontes, melhorando a locomoção das pessoas e o tráfego local. Sem falar que Nassau era conhecido pela tolerância religiosa (nesta época foi construída em Recife a primeira Sinagoga da América Latina!)) alguma decência(*)) com a ajuda de negros e índios (PQP, que (Após expulsarem os holandeses, os portugueses continuaram com a escravidão e a perseguição aos quilombos. Em 1863, ocorreu a Abolição da escravatura nas colônias holandesas, 25 anos antes do Brasil. E a cultura indígena... bem... Felipe Camarão é um bom exemplo.) burros(*)! Dá zero pra eles, professor!). Essa "insurreição pernambucana" é também chamada de "Guerra da Luz Divina", e o fato de uma força 50% inferior vencer os holandeses foi considerado um milagre, onde Maria, mãe de Jesus, estava a proteger os militares portugueses. Isso justifica a pintura, colocada na Igreja pelo governador de Pernambuco, em miloitocentosealgumacoisa. A batalha retratada é de um horror que só vi em "O Soldado Ryan". Sério. Sangue e tripas espalhadas pelo chão (que mal se vê, pelo número de corpos amontoados). Uma certa (ESCREVO ASSIM. É O MEU JEITINHO!) sena(*) me deixou mais perturbado, que foi a de um soldado português com a espada, pronto pra desferir o golpe fatal num outro soldado holandês que estava no chão rendido, entre os cadáveres, com a mão espalmada (em súplica) e boca aberta. Estivesse esse quadro num museu eu não ligaria muito (afinal toda guerra é feia e cruel), mas... na entrada de uma igreja? Ao lado do calvário de Jesus?

Passei boa parte do tempo pensando em como o pároco foi constrangido a botar aquela pintura ali; talvez até tentado com uma boa quantia pra reforma da Igreja... e fiquei matutando no quanto o sagrado está imiscuído (macomunado?) com o profano. Nesse meio tempo, as músicas terminaram e o Padre começou uma pequena oração, que dizia algo como "Senhor, nos lembra sempre do quanto somos insignificantes e dependentes de sua misericórdia", o que fez meu sangue ferver, pois um dia antes eu havia escrito aqui nos comentários do blog sobre o uso de Jesus como eterna muleta pra manter o povo servil, e assim preparar terreno pra justificar uma suposta hierarquia espiritual (padre, bispo, papa) que convenientemente emula a hierarquia social (prefeito, governador, presidente)... e logo Jesus, que criticava (veladamente ou não) o uso do sagrado como controle social... que irônico. Ainda bem que ele ressuscitou, ou suas cinzas estariam rolando pelo sepulcro e logo virariam atração turística.

Mas nem tudo é indignação. A bem da verdade até gostei do sermão do padre. Ele começou lendo o trecho da bíblia:

“Logo depois disso, andava Jesus de cidade em cidade, e de aldeia em aldeia, pregando e anunciando o evangelho do reino de Deus; e iam com ele os doze, bem como algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades: Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete demônios. Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, Susana, e muitas outras que os serviam com os seus bens.
Lucas 8:1-3)”


Nunca havia reparado nisso. Afora a bênção aos 12 apóstolos, o evangelista só cita MULHERES acompanhando Jesus. O padre lembrou como elas eram (A ponto de, no judaísmo da época, as mulheres eram marginalizadas ao ponto de não servirem como testemunhas... e Jesus aparece primeiro pra quem? quem? QUEM? Aliás, essa é uma das passagens do Novo Testamento que, analisada à luz da história, me faz acreditar que SIM, aconteceu algo muito especial envolvendo Jesus ou, no MÍNIMO, essa é uma lenda criada por um grupo de pessoas muitíssimo à frente do seu tempo, o que os torna especialíssimos.) muito(*) discriminadas naquela época, e ainda assim Jesus andava cercado delas, tratando-as como iguais. E foi justificar no Gênesis, onde está escrito:

“Então o Senhor Deus fez cair um sono pesado sobre o homem, e este adormeceu; tomou-lhe, então, uma das costelas, e fechou a carne em seu lugar; e da costela que o senhor Deus lhe tomara, formou a mulher e a trouxe ao homem.
(Gen 2:21-22)”


O padre falou que aquilo era obviamente uma matáfora, uma figura de linguagem (graças a Deus!), que simbolizava que a mulher foi criada de uma parte ao LADO do homem. Nem da cabeça nem dos pés dele, e sim do meio. Falou dos preconceitos que ainda existem contra a mulher, e citou que, em nossa sociedade, a consagração do sucesso de uma mulher na mídia é ela posar nua numa revista; não precisa nem ser bonita: se ela faz sucesso, logo é convidada pra posar como um objeto de desejo (o que minimiza - às vezes apaga - todo o esforço que ela fez como ser humano pra chegar ao reconhecimento nacional). O padre falou ainda que muitas vezes o preconceito é alimentado pelas próprias mulheres, ao criarem seus filhos de maneira machista e perpetuando o preconceito dos avós, ou ao aceitarem passivamente os desmandos do marido.


Achei muito bonito esse sermão, numa Igreja consagrada a Nossa Senhora, e com o padre cercado de mulheres - senhoras, suas assistentes, que estavam inclusive com ele no altar, e a platéia, composta de 90% de mulheres. Enfim, uma Igreja de contrastes, onde o Divino convive com o Vulgar, e onde o padre prega a igualdade feminina dentro de uma doutrina famosa pelo machismo e preconceito histórico para com a mulher. Saí de lá revigorado, sem a fraqueza de outrora. Obrigado, Nossa Senhora (e perdoe a brincadeira acima) :P

Imagem: Nossa Senhora da Conceição após a Batalha dos Guararapes: "O que eu fiz?"

por Acid

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Sobre o autor
acid
Acid é uma pessoa legal e escreve o Blog www.saindodamatrix.com.br
"Não sou tão careta quanto pareço. Nem tão culto.
Não acredite em nada do que eu escrever.
Acredite em você mesmo e no seu coração."
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