Cosméticos enganadores
por Conceição Trucom em AutoconhecimentoAtualizado em 06/05/2002 12:22:44
A imprensa mundial nesta semana deu grande destaque a pesquisas que demonstram que a maior parte dos produtos de beleza, como cremes e loções para a pele e os cabelos, contêm alegações infundadas sobre seus efeitos benéficos.
Em outras palavras: apesar de misturarem vitaminas, algas, extratos de embrião, ácidos, etc., aos constituintes básicos dos seus produtos, não existem evidências científicas de que realmente funcionem.
Os produtos são caríssimos, aliás, e voltados essencialmente ao público feminino, que costuma não medir sacrifícios para os comprar avidamente. Existem potinhos importados, com uma quantidade ridícula de creme, que custam mais de 100 dólares.
O que contém um creme hidratante para a pele? Com pouquíssimas variações contêm um ingrediente básico, a lanolina, que foi introduzido no mercado de massa de produtos cosméticos na década dos anos 30.
A lanolina tem esse nome pois foi extraída quimicamente pela primeira vez dos pelos da lã de carneiro, conferindo aos mesmos a maciez característica. É uma mistura de ácidos graxos (gorduras) e seus ésteres, sintetizada pelas glândulas foliculares da pele, e que tem propriedades hidrofílicas, ou seja, liga-se com a água, o que lhe confere o poder hidratante, além do poder amaciante.
A lanolina é obtida como um subproduto da limpeza da lã bruta, através da limpeza com sabão, sendo em seguida refinada, desodorizada, descorada e seca.
Como produto de beleza, a lanolina no início era um produto caro, exclusivo, adorado pelas mulheres, pelas propriedades que realmente tem de tornar a pele menos áspera e com melhor aparência. Ela é rapidamente absorvida pela pele, por isso é usada para transportar substâncias que se deseja que sejam absorvidas também.
Por isso, é o excipiente mais usado em pomadas de uso farmacêutico. Aliás, a lanolina não é usada só para isso. É a base de muitos outros produtos para couros e peles, sabonetes e amaciantes de roupas e tecidos, sendo algumas vezes misturada
com parafina.
Os precursores dos cremes de pele baseado em lanolina mais conhecidos e mais usados no Brasil são os conhecidos Pond´s e Nívea. O problema é que, movidas pela necessidade de ganhar mais dinheiro por unidade vendida, e criar novidades que instigassem sempre a consumidora feminina a continuar comprando, os fabricantes começaram a colocar muitos outros componentes, como vitaminas, em doses minúsculas, e em formas inativas, na maior parte das vezes.
Se a leitora soubesse quantos cremes de alto preço possuem substâncias desse tipo, em concentrações de 0,1 a 0,5%, muito abaixo da sua dose efetiva, certamente não iria gastar seu suado dinheirinho neles.
A moda agora é colocar vitaminas C e E, que pertencem ao grupo das hidrossolúveis e antioxidantes, mas cujo efeitos por absorção cutânea não estão documentados cientificamente de forma irrefutável.
As fórmulas de alguns cremes são positivamente bizarras, para não dizer esotéricas. O Creme de la Mer, que foi criado pelo cientista da NASA Max Huber, que sofria de queimaduras químicas atrozes, é um exemplo.
Recentemente, a prestigiosa empresa americana Estée Lauder comprou a fórmula, depois que Huber morreu. O creme é baseado em uma mistura secreta de vitaminas, minerais e certas algas marítimas colhidas de acordo com o ciclo lunar. A preparação envolve fermentação durante meses, ao som de borbulhas gravadas em fermentações anteriores, e com pulsos periódicos de luz, para "energizar" o creme (não estou brincando...). Além disso, à receita original foram adicionados malaquita (que de acordo com uma " cientista" da La Mer, " atrai a energia do sol" (seja lá o que isso significa...), pedaços de prata e de ouro, para "dar propriedades antibacterianas, e pelo fato dos metais absorverem a luz e transferi-la para o creme, para torná-lo ainda mais potente."
Seria ridículo, se o creme não custasse 150 dólares para um pote de 57 miligramas, e não fosse comprado por mulheres do mundo todo, que nesse momento conseguem perder toda a racionalidade em troca de um efeito duvidoso.
A lanolina continua sendo parte do creme, e é muito provavelmente ela que confere o efeito, igualzinho ao humilde e baratinho creme Nívea, mas que a credulidade dos compradores pensa ser diferente...
Mais problemático ainda é o fato de que muitos dermatologistas e cosmetólogos recomendam e revendem esse creme em seus consultórios, a preços remarcados muito acima da tabela. Uma excelente fonte de renda para todos, sem dúvida. Mas, assim como outros produtos e outras enganações da medicina alternativa, deveriam ser examinados mais cuidadosamente pela Agência de Vigilância Sanitária, que os aprovam sem maiores contestações à sua validade científica.
Publicado pelo Jornal Correio Popular - Campinas e pelo Boletim Eletrônico Nutrinforma nº 46 - Novembro 2001