Estilo Jane Birkin
por Adília Belotti em EspiritualidadeAtualizado em 02/09/2020 16:13:18
Não sei bem quando exatamente minha relação com a moda mudou... Mas aos 50, um pouco antes, um pouco depois, me vestir virou uma espécie de brincadeira, jogo de fantasia e de humor...
E nem é que não me importe mais, ao contrário, aos 50, um pouco antes, um pouco depois, descobri em mim até uma certa... faceirice!
Bom, se você está muito longe dos fifties vai estranhar, mas muitas mulheres da minha geração cresceram desconfiando dos batons e rosnando para essas coisas de "mulherzinha". Éramos até corretas, eventualmente chiques, elegantes, mas não nos divertíamos.
Algumas de nós nunca perderam o tom "nós que amávamos tanto a revolução" e passaram a vida experimentando versões do estilo "túnica + sandália franciscana". Outras jamais se permitiram concessão alguma e caminharam até aqui eretas, expressão severa, jeans, camisa abotoada, sapatos de bicos gordos, nada de enfeites. Outras ainda buscaram refúgio nos beges e tentam até hoje encher de graça os básicos de todas as cores.
Mas existem mulheres que se soltam aos 50, um pouco antes, um pouco depois, soltam o riso, soltam os cós e vestem as roupas como quem dança contra o vento!
Fiz uma faxina no meu armário. Dei tudo que me apertava (menos os jeans, vai saber a que outras fantasias eles respondem!) tudo que era áspero, tudo que era duro. Aos 50, um pouco antes, um pouco depois, quero panos que me envolvam, sem moldar, macios, molengas, que viajem do trabalho ao sofá sem sofrimento, que causem até certa estranheza, mas que ousem outros olhares sobre mim. Quero cores e quero levezas, estampados, por que não? Mas com um quê das odaliscas de Matisse... Salto alto, de vez em quando, só para exercitar o porte aprumado das palmeiras... e batom, sempre!
Jane Birkin é meu benchmark! Lembram daquela quase-voz dela entrando sussurrada logo depois dos acordes proibidos de "Je t'aime, moi non plus"? Caso de amor eterno com Serge Gainsbourg, dono do nariz mais espetacularmente grande e da voz mais doce, uma combinação, aliás, perigosa num homem... Pois então, Jane Birkin esteve aqui no Brasil na semana passada para um show em homenagem a Serge Gainsbourg, por ocasião da celebração do Ano da França no Brasil. Envelheceu. Sua quase-voz continua sussurrada e ela ainda é linda, até porque, liberta da necessidade de posar de mulher sexy, ela pode rir mais, e é assim que ela aparece hoje, rindo!
Não espanta que seja a designer convidada da marca, Luzt and Patmos, cujo mote é "moda não efêmera, simples, mas especial, moderna, mas confortável, familiar, mas única, para durar anos a fio, não estações, para o dia e para a noite, para a semana e para os finais de semana, para todos os climas, para o ano inteiro".
E tem mais gente brincando com essa "não-moda-arte-de-vestir-para-brincar".
Sonia Pinto, por exemplo, de Belo Horizonte, que acabou de abrir um atelier em São Paulo e que define as mulheres, suas clientes, como: "mulheres cosmopolitas, cientes do seu tempo, protagonistas da sua história (...) mulheres que só se revelam para quem merece fruir da sua gentileza - e da sua beleza atemporal".
"Faço roupa para mulheres que não estão preocupadas com um carimbo e que têm coragem de inventar seu próprio estilo".
Para elas, a estilista cria vestidos-capas, calças-saias, blusas-mantos, híbridos à espera das cores, cada prega revelando possibilidades e movimentos novos.
Dela tenho algumas peças, as minhas favoritas no armário recém-esvaziado, incluindo uma espécie de blusa-estola, de uma lãzinha que nunca nem sonhou ficar pinicando a pela da gente, forrada de gaze, toda desconjuntada, mas que se transforma no minuto em que você se deixa abraçar pelas dobras macias. Sem querer, seu queixo parece mais altivo, seu olhar, mais sereno, seu jeito, mais feminino, você inteira, uma mulher sem idade, na roupa atemporal...
Relembrando: Je t'aime, mois non plus, com Jane Birkin e Serge Gainsbourg.