Jesus: No céu tem pão?
por Acid em EspiritualidadeAtualizado em 08/04/2020 11:35:22
Jesus era um cara muito de boa, andava com mendigos, prostitutas, zelotes, cobradores de impostos, enfim, quem quisesse segui-lo era livre para fazê-lo.
Mas Jesus não era bobo. Ele sabia que no meio havia interesseiros, fura-olhos, gente que ia abandoná-lo na menor dificuldade, gente que pensava no poder que ele supostamente conquistaria e gente que só queria comer de graça.
Jesus já tinha uma galera de 5 mil seguidores por conta das curas que ele fazia. Quando estava na margem do mar de Tiberíades Jesus multiplicou os pães e a galera que foi escutá-lo comeu até se fartar. Obviamente uma notícia dessas vai se espalhar pelas redondezas e imagino que todo mundo ficou esperando a próxima palestra do Jesus com open bar. A galera ficou "Esse é o cara!" (João 6:14) e passaram a estalqueá-lo. Queriam fazê-lo Rei à força! Só que à noite Jesus armou um plano pra despistá-los: mandou os discípulos na frente num barquinho pra Cafarnaum, e depois escondidinho alcançou eles andando. Isso mesmo. Pelo mar. No outro dia a galera "cadê Jesus? Não tá aqui, então bora atrás dos discípulos". E aí descobriram Jesus, e falaram "Meeeestre, você por aqui?" e Jesus, provavelmente com carinha de "not impressed" 😒 respondeu:
"A verdade é que vocês estão me procurando, não porque viram os sinais miraculosos, mas porque comeram os pães e ficaram satisfeitos. Não trabalhem pela comida que se estraga, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do homem lhes dará. Deus, o Pai, nele colocou o seu selo de aprovação".
Isso mostra que o que Jesus menos quer é gente adorando-o pra buscar a "comida que se estraga", ou seja, as coisas materiais. Imagino que Jesus teria algumas palavras duras pra dizer a muitas Igrejas, pastores e fieis.
Então lhe perguntaram: "O que precisamos fazer para realizar as obras que Deus requer?"
Jesus respondeu: "A obra de Deus é esta: crer naquele que ele enviou".
"Obra de Deus", no grego το εργον του θεου pode ser melhor traduzido como "A ação que Deus está esperando de você", algo que está muito imbuído na filosofia cristã, que é buscar operar de forma que Deus aja/opere através de suas atitudes.
Só sei que a multidão se entreolhou e provavelmente pensou assim: esse cara multiplicou uns pães, fez umas curas, aí já quer que depositemos nossa fé nele. Pô, nós, judeus, cremos no Deus único, que fez e aconteceu. Então eles pensaram com a barriga de novo e lembraram de uma passagem da Torá onde chovia pão do céu, e mandaram um "faz melhor aí" pra ver se colava:
Então lhe perguntaram: "Que sinal miraculoso mostrarás para que o vejamos e creiamos em ti? Que farás?
Os nossos antepassados comeram o maná no deserto; como está escrito: 'Ele lhes deu a comer pão do céu'".
Jesus, com toda a paciência do mundo, responde:
"Digo-lhes a verdade: Não foi Moisés quem lhes deu pão do céu, mas é meu Pai quem lhes dá o verdadeiro pão do céu.
Pois o pão de Deus é aquele que desceu do céu e dá vida ao mundo".
Já salivando, a galera falou:
"Senhor, dá-nos sempre desse pão!"
E Jesus: "EU SOU A P#&@ DO PÃO, C@$%(@*, SERÁ QUE VOCÊS NÃO ENTENDEM METÁFORA?!"
Só que os redatores da Bíblia devem ter achado essa parte muito pesada, então escreveram a resposta assim:
Então Jesus declarou: "Eu sou o pão da vida. Aquele que vem a mim nunca terá fome; aquele que crê em mim nunca terá sede.
Mas, como eu lhes disse, vocês me viram, mas ainda não creem. Todo aquele que o Pai me der, esse virá a mim; e o que vem a mim, de maneira alguma o excluirei.
Aí os caras começaram a criticar Jesus por ele falar que Desceu do céu e tal. E começou o fuxico: Este não é Jesus, o filho de José? Vizinho de Hermanoteu? Aquele menino buxudo?
Jesus se arreta e fala: Parem de fazer-me críticas. (sim, tá lá na Bíblia, se Jesus não suportou gente cri-cri, por que eu haveria de suportar?).
E interessantemente ele começa a despejar em cima deles um monte de informação de forma até dura, tipo carteirada mesmo:
Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, não o atrair; e eu o ressuscitarei no último dia.
Eu sou o pão da vida.
Os seus antepassados comeram o maná no deserto, mas morreram.
Todavia, aqui está o pão que desce do céu, para que não morra quem dele comer.
Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Se alguém comer deste pão, viverá para sempre. Este pão é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo".
É uma sucessão de jabs religiosos na cara dos judeus que se diziam seus seguidores e discípulos, mas queriam mesmo é pão e água fresca. São informações que nem mesmo os apóstolos entendiam, porque ele só vai explicar de novo lá na Última Ceia, com mais calma. Me dá a impressão que ele faz isso unicamente pra chocar a percepção deles, como na história do Buda sobre existir ou não Deus.
Então os judeus começaram a discutir exaltadamente entre si: "Como pode este homem nos oferecer a sua carne para comermos?"
Note que Jesus não faz nenhum esforço pra dizer que é uma metáfora, como ele fazia antes, pra explicar o Reino de Deus, e o que segue é mais uma sucessão de jabs:
Jesus lhes disse: "Eu lhes digo a verdade: Se vocês não comerem a carne do Filho do homem e não beberem o seu sangue, não terão vida em si mesmos.
Todo o que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia.
Pois a minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira bebida.
Todo o que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele.
Da mesma forma como o Pai que vive me enviou e eu vivo por causa do Pai, assim aquele que se alimenta de mim viverá por minha causa.
E mais uma vez ele bate na tecla do maná e dos antepassados, como pra reforçar que ele traz o novo, o imperecível, não se apegando à letra morta:
Este é o pão que desceu do céu. Os antepassados de vocês comeram o maná e morreram, mas aquele que se alimenta deste pão viverá para sempre".
A galera acusa o golpe. Ao ouvirem isso, muitos dos seus discípulos disseram: "Dura é essa palavra. Quem consegue ouvi-la?"
Aí Jesus, sabendo das queixas, falou "Aaaaaah, isso os escandaliza? Mas tem mais!!!!!"
Que acontecerá se vocês virem o Filho do homem subir para onde estava antes?
O Espírito dá vida; a carne não produz nada que se aproveite. As palavras que eu lhes disse são espírito e vida.
Contudo, há alguns de vocês que não creem".
"É por isso que eu lhes disse que ninguém pode vir a mim, a não ser que isto lhe seja dado pelo Pai".
Aí nisso a galera morgou, e muitos discípulos deixaram de segui-lo. Aí Jesus, maroto, se vira pros 12 apóstolos e pergunta: "Vocês também não querem ir?" "Vão arregar?"
Pedro lhe respondeu: "Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida eterna. Nós cremos e sabemos que és o Santo de Deus".
Então Jesus respondeu: "Não fui eu que os escolhi, os Doze? Todavia, um de vocês é um diabo!" (Ele se referia a Judas, filho de Simão Iscariotes, que, embora fosse um dos Doze, mais tarde haveria de traí-lo.)
Ficam as considerações de que o populacho está sempre à procura de um Rei que lhes dê pão. A expressão "Pão e Circo", do tempo da Roma Antiga, sintetiza esse pensamento. Somos assim até hoje. Se um candidato(a) a presidente promete investimentos em educação e o outro promete "pão", ganha o segundo fácil. Sempre vamos pelo caminho do menor esforço. Jesus, através do exemplo, demonstrou que Ele era o caminho. Se o introjectarmos, ou seja, "comê-lo" ou "bebê-lo", iremos nos conectar através dele à Deus, e assim fica mais claro o ensinamento final de Jesus a seus discípulos:
Eu Sou a videira verdadeira, e meu Pai é o agricultor. Todo ramo que, estando em mim, não dá fruto, Ele retira; e todo que dá fruto, Ele limpa, para que dê mais fruto ainda.
Permanecei em mim, e Eu permanecerei em vós. Nenhum ramo pode produzir fruto por si mesmo, se não estiver ligado à videira. Vós igualmente não podeis dar fruto por vós mesmos, se não permanecerdes unidos a mim.
Eu Sou a videira, vós os ramos. Aquele que permanece em mim, e Eu nele, esse dará muito fruto; pois sem mim não podeis realizar obra alguma.
(João 15)
E como permanecer em Jesus? Como "comer" Jesus? Como bebê-lo, ou ser o ramo dele? O próprio Jesus, logo após dar este ensinamento, deixa seu único mandamento bem claro, sem figuras de linguagem, sem parábolas:
E O MEU MANDAMENTO É ESTE: QUE VOS AMEIS UNS AOS OUTROS, ASSIM COMO EU VOS AMEI. (João 15:12)
Essa é a beleza da simplicidade, que não é fácil de reproduzir, não requer grandes doses de intelecto, nem posses, nem mesmo uma religião (já que tal conceito pode ser encontrado em diversas outras religiões). link