Liberdade...
por Rubia A. Dantés em EspiritualidadeAtualizado em 08/10/2004 12:16:15
Havia um grito preso na minha garganta...
Uma vontade de me liberar de alguma coisa que não estava ainda definida...
Ou de muitas coisas... não sei ao certo.
Só sei que naquela tarde eu me deitei um pouco na hora em que o Sol estava quase se despedindo do dia... fiquei naquele estado de sonolência entre o dormir e o estar acordada com aquele grito reprimido na garganta....
Entre um pensamento e outro, quando quase já embarcava nos braços de Morfeu... apareceu uma visão que me prendeu todos os sentidos, naquela cena que me chegou como um flash de luz.
Um xamã... se preparava para um ato de extrema coragem... Foi assim que eu o senti à primeira vista... Ele estava ali... parado na beirada do platô que dava para um imenso vale, envolto por uma atmosfera tremeluzente de sonhos.
Pela força daquela presença eu pude sentir a inteireza com que ele realizaria aquele que parecia ser o seu último ato...
Iluminado pelo avermelhado do Sol poente, ele inspirava uma coragem que nunca senti em ninguém antes... Por um momento pensei que ele fosse saltar no despenhadeiro em direção ao vazio... Em baixo, o imenso vale também reluzia com aquela luz de sonhos...
Prendi o ar por um minuto antecipando aquele instante final...
Mas... foi só por um minuto porque, quebrando a minha expectativa...
Ele deu um grito de liberdade...
Uma águia tornou esse grito ainda mais forte quando colocou nele clareza...
Um lobo deu direção a essa clareza quando uivou profundo, adiantando a lua que se preparava para entrar em cena...
Foi um grito tão impressionante que teve mais impacto sobre mim do que se ele tivesse pulado no vazio...
Esse grito ecoou por todo o vale e por outros vales... outras gargantas... atravessou o tempo e a distância... e chegou até aqui... com tanto sentimento e com tanto sentido que tocou meu coração inesperadamente, e, a partir daí ecoou... reverberou pelo infinito de quem sou... A imagem acompanhou o som e se construiu em uma seqüência ordenada... um suceder-se de imagens e sons formaram uma única imagem e um único som... e num segundo preciso e definitivo eu o vi em um movimento perfeito ultrapassar o último limite antes da liberdade...
...Rompeu o tênue fio entre o que prende e o que libera... em um grito... e fez a travessia...
Aquela foi a senha que a minha alma reconheceu... e eu também gritei...
Um grito silencioso que vibrou inaudível, mas... reconhecido por cada parte minha que ainda tinha medo de gritar por liberdade...
Senti essa vibração penetrar por todos os lugares do meu coração que escondiam algum medo antigo... alguma culpa não revelada... Partes que estavam prisioneiras de si mesmas, pouco a pouco foram sentindo aquela vibração e abrindo as portas que as mantinham ainda sob alguma limitação. Algumas portas pareciam mesmo prisão por terem grades de ferro... outras... nem pareciam prender de tão sutis... e talvez por isso mesmo foram as mais difíceis de serem abertas...
- Só você pode abrir as portas que um dia criou para se proteger, porque só você tem as chaves.
Alguém falou dentro de mim... mas eu nem tentei descobrir quem era, porque me senti despertando do estado de sonolência que a falta desse grito tinha me deixado... por muito tempo...
Pressenti a liberdade rondando o meu destino... e deixei ela entrar abrindo espaço no meu coração...
