Mantras
por Acid em EspiritualidadeAtualizado em 19/06/2008 13:41:14
Introdução do autor: Deixo claro que o que escrevo é fruto das minhas experiências e estudos. Não é a verdade absoluta. É o que julgo compreender. Peguem o que for legal. Joguem fora o que não servir.
Por Enki
Muitos devem conhecer o mantra OM MANI PADME HUM. A maioria dos ocidentais associam esse mantra à compaixão e o traduzem como "Salve a jóia no lótus".
Mas o interessante é que essa tradução meio que literal não tem muito a ver com o contexto original do mantra. Pra quem não sabe, o mantra é budista, mais precisamente da escola tibetana, que é tântrica. Como a grande maioria do conhecimento tântrico, o mantra é um aforismo, ou seja, contém em si uma grande quantidade de informação que se desdobra e se apresenta para aqueles que conhecem o conceito original. Isso não é ser técnico, complicado ou coisa assim. No contexto budista original, todos os budistas sabiam desses conceitos. Então, era algo natural...
De forma bem simplista, segue o modelo tradicional do que o mantra representa para os budistas tibetanos, de acordo com o que foi passado por grandes sábios:
OM = é o princípio da Universalidade, da abrangência.
MANI = é a mente, que deve se transformar de algo impuro em algo puro, translúcida e firme, através do discernimento e discriminação (viveka e vijnana).
PADME = é o fruto da transformação da mente no "diamante" (vajra). É a expansão da percepção da Consciência.
HUM = é o fruto dessa expansão de percepção: a integração.
Agora, cada um desses significados que coloquei surgem de acordo com uma disciplina específica. Cada um dos Dhyanis Buddhas estão associados a esse mantra e suas respectivas "prajnas" (sabedorias) também.
Pergunto: OM MANI PADME HUM significa “Salve a jóia no lótus”? Não. Essa é uma tradução ou sentido que foi dado por espiritualistas ocidentais ao mantra, baseando-se na estória de que ele foi passado à humanidade por um boddhisattwa (Cherenzing, Kanon, Kuawn Yin), num ato de compaixão. O mantra pode até gerar em mim a compaixão, se eu aprender que ele é um mantra para a compaixão. É placebo mesmo. Mas se eu souber do que REALMENTE o mantra é constituído, do que ele "é feito", com certeza o foco vai ser outro. Pode até ter a compaixão, mas é algo muito mais profundo.
Os mantras são uma das maneiras que os sábios encontraram para tentar reproduzir estados conscienciais que eles atingiam e vivenciavam durante suas experiências de (Samadhi é o aumento da percepção que nós temos da Consciência, do UNO, do Todo. Muitas vezes ele é traduzido como Expansão da Consciência. Mas se a Consciência É o Todo, o Absoluto, como ela pode se expandir? Assim, o que se expande é a percepção dela, visto que ela é SEMPRE a mesma.) Samadhi(*). São como um "aglutinado" de informações. Mas essas informações não são mentais. Estão além da mente, pois lidam direto com a Realidade Última, com Brahman, O Todo, como queiram chamar. E lá (Brahman), a mente não alcança... Atribuir a mantras e yantras relações mentais (ou estados de consciência mentais) é um erro, até onde pude compreender. Assim, os mantras em nada têm a ver com inconsciente, consciente ou subconsciente, e sim com a CONSCIÊNCIA MAIOR, ou seja, Brahman.
A palavra mantra é a junção de duas outras em sânscrito. Apesar da tradução corriqueira ser "instrumento da mente", onde MAN é "mente" e TRA é "instrumento", digo a vocês que essa é a tradução errada...
MAN, de fato, é MENTE. TRA vem de Trayati, que significa LIBERAÇÃO. Assim, os mantras são ferramentas que nos ajudam a nos "liberar/libertar da mente" (e não liberar a mente, como uma tradução literal pode supor). Ou seja, os mantras são ferramentas para "dissolver a mente".
Os mantras, repetidos a esmo mecanicamente, têm pouca ou nenhuma influência sobre a pessoa que a repete. Aí alguns podem estar pensando: ah, mas tem a egrégora, etc. Digo: Segundo o que aprendi fora (e dentro) do corpo com alguns Yogues, o mantra em si não tem egrégora. Agora, a intenção e compreensão afins que se gera DEPOIS da prática do mantra PODE gerar uma egrégora. E mesmo assim, essa egrégora é real para quem tem relação com ela... Assim, qualquer pessoa pode acessar aquilo que acha que o mantra ou a egrégora representa, e não o que ele é de verdade.
Repetir algo pela tradição somente não leva a nada. Aliás, a tradição, repetida sem lucidez, leva a manipulação da própria tradição, fazendo com que ela perca sua característica original. A tradição pode até se renovar. Desde que se apóie e não se desvie dos seus conceitos originais.
Como aprendi com Ramakrishna, se você está doente, repetir a palavra "remédio" não vai te curar. Você tem que ir e tomar o remédio. Ou seja, você precisa ter a "experiência" do mantra. E essa experiência não vem só com a prática e nem é sinônimo de tempo de prática... Essa experiência da qual Ramakrishna fala é a de perceber LUCIDAMENTE, com o apoio do DISCERNIMENTO e da DISCRIMINAÇÃO (viveka e vijnana), os mecanismos de funcionamento do mesmo. E isso requer um conhecimento mínimo dos conceitos que vão ser praticados (nesse caso, OM, NAMAH e SHIVA).
Mas o que é OM? e Shiva?
O Mantra OM NAMAH SHIVAYA é um mantra de evocação a Shiva. A tradução literal do mantra seria "Eu Saúdo o Senhor Shiva". Shiva é, segundo a tradição hindu, o segundo aspecto da trindade. Ele possui vários epítetos (atributos), sendo os mais conhecidos "transformador, o de doce efulgência, o de três olhos" (tryambake)... No entanto, a palavra Shiva é literalmente "o Benevolente". Shiva é a Consciência Pura, o fundamento original do Ser. No yoga e nas correntes védicas ele é chamado de Brahman. Brahman e Shiva representam o mesmo princípio: O Todo, o Absoluto, o Fundamento Original do Ser. Sendo assim, Shiva é normalmente retratado em postura yogue, com rosto sereno, plácido e sempre em paz. Sendo O TODO, nada está fora dele e, portanto, ele é sempre o mesmo, igual em todas as circunstâncias.
Mas a maioria das pessoas associa Shiva a movimento, pois está associado à transformação, mudança. E como acabamos de ver, ele é pura quietude, visto que SEMPRE É O MESMO. Se é assim, por que associar ele à transformação, ou até mesmo à destruição? Parece que temos um paradoxo aí, não é mesmo?Mas isso é só aparente.
Sendo Shiva a Consciência Pura, o Fundamento do Ser, quando evocado ou "sintonizado", tende a iniciar o "movimento de ajuste de foco" em nós mesmos. Assim, a "energia" de Shiva tem a propriedade de nos mostrar a Realidade Última, ou seja, a nossa própria natureza essencial. Shiva é o destruidor... das ilusões!
Quando isso ocorre, as dualidades da realidade aparente em que vivemos tendem "a se chocar", causando uma sensação aparente de desordem ou mudança.
Na verdade, as mudanças ou "viradas de cabeça" que a energia de Shiva provoca não é nada mais do que um "puxão para a Realidade". E quando falo realidade, não falo da realidade ordinária, do dia-a-dia. Falo da Realidade da Consciência como sendo uma e tudo. Falo de um puxão ou um fluxo de energia que se cria no sentido de "movimentar as dualidades em nossa cara" e fazer com que surja a possibilidade de perceber o REAL, o essencial de tudo e em tudo.
Como nossa realidade aparente está fundamentada no ego e na mente e seus mecanismos, nas carências emocionais, quando "chamamos" a Consciência/Realidade (Shiva), tudo parece "tremer", se desestabilizar. Mas, na verdade, o que ocorre é que iniciamos a busca pela quietude, ou, como Patanjali diz em seu Yoga Sutra, "se perceber na sua real natureza". Obviamente, nossa real natureza é conflitante com essa realidade aparente. Por tudo o que foi explicado, fica fácil entender o porquê de associar Shiva a transformação.
Mas vale sempre lembrar: Shiva não faz nada! Ele é sempre o mesmo, quieto, perene e sempre benevolente. Quem se movimenta, quem "treme" é aquilo que chamamos de MENTE que, nas tradições do yoga, da vedanta e do tantra, é composta pelo Ego, Buddhi (mente sutil), Chitta (memórias) e Manas (mente densa). Mas isso é outra estória... :)
Concluindo: O mantra Om namah Shivaya é algo como um chamamento pela realidade:
OM é o princípio da universalidade, do vir a ser, ou seja, é um gatilho.
NAMAH é saúdo, felicito.
SHIVAYA é Consciência, Fundamento do Ser.
OM NAMAH SHIVAYA é como um grito de "EU QUERO VER/VIVER A REALIDADE!!!!!"
No entanto, essa Realidade a mente não alcança. OM NAMAH SHIVAYA é, pode-se dizer, o bija, ou a semente do Mahamrityunjaya Mantra:
Om Tryambakam Yajamahe
Sugandhim Pushtivardhanam
Urvarukamiva Bandhanan
Mrityor Mukshiya Maamritat
Eu medito no Senhor de Três Olhos
O possuidor da doce efulgência que nutre todo o universo
Que ele possa arrancar meu ego
Da mesma forma que um agricultor (Ou seja, quebra todo o resquício de qualquer ligação.) arranca o pepino(*) de sua árvore
VISHNU x SHIVA
Já Vishnu é cheio de opulência, de jóias, ligado aos sentidos, ao prazer... É o mantenedor, conservador, como queiram chamar. Agora pergunto: Pra conservar seu corpo você fica quieto? Não... Você come e pra ter comida você trabalha.
Vishnu é puro movimento, é energia! E é por isso que ele é associado ao Prana...
Enquanto a quietude do Shiva nos incita à visão do TODO de uma forma mais direta, "dolorosa" e rápida, o movimento de Vishnu nos incita à visão do TODO de uma maneira mais "leve", lenta... e não menos dolorosa... (risos)
Mas o que importa é que AMBOS nos levam ao TODO, a Brahman...
Guru Brahma
Gurur Vishnu
Guru Devo
Maheshwaraha
Guru Saakshat
Para Brahma
Tasmai Sree Gurave Namaha
O verdadeiro guru é Brahma.
O verdadeiro guru é Vishnu.
O verdadeiro guru é Shiva.
De todos estes,
o Real e Verdadeiro guru
é o Supremo Brahman, que habita o seu coração.
É a esse guru que deves adorar.