O inconsciente do grande rio da minha aldeia
por Izabel Telles em EspiritualidadeAtualizado em 12/07/2007 19:03:49
Como você sabe Lisboa (Portugal) é margeada pelo Rio Tejo e seu encontro com as águas do Oceano Atlântico. O Rio Tejo mais parece um mar. É largo e imenso e liga a cidade à sua margem sul onde existe um verdadeiro santuário de beleza ímpar e que é chamado de Alentejo.
O rio Tejo, na verdade, nasce na Espanha e vem descendo península abaixo até derramar suas águas no oceano. Fernando Pessoa tem em um dos seus poemas (e não só) (O TEJO É MAIS BELO
do `Guardador de Rebanhos´ - Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)
O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.
O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele va
E donde ele vem.
E por isso porque pertence a menos gente
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.
Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia
O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.) uma declaração de amor a este rio(*). Também existem vários fados que cantam esta maravilha!
Bem, isso tudo para lhe contar que estou vivendo na Costa da Caparica (em casa de amigos muito queridos) e que todos os dias temos que atravessar a ponte sobre o rio que leva o nome de 25 de Abril.
Portanto, todos os dias dou de cara com Lisboa ao amanhecer. Linda, charmosa, cor de rosa. E dou as costas a ela ao anoitecer para então olhar para a Caparica onde venho dormir junto ao mar aberto da praias da Costa ( como se diz por aqui).
Mas hoje resolvi que não iria passar por cima do rio e sim por dentro dele. Fui até a Estação Fluvial de Belém e tomei um barco em direção à Trafaria.
No meio do rio é que me veio a ideia de que o rio é uma perfeita metáfora do que é nosso inconsciente: à flor da água aquilo que julgamos ver e perceber. No fundo coisas que não sabemos porque não vemos. Um mundo vivo, desconhecido muitas vezes por nós e que vem dar às nossas praias internas todos os dias trazendo imagens e formas pedindo que as integramos às nossa experiências.
Assim vejo a mente inconsciente. Uma vastidão de água com muitos níveis. Enquanto estamos no consciente é como se caminhássemos para dentro das águas com nossos pés ainda tocando o chão. Depois vem um nível mais profundo, onde já não temos mais apoio para nossos pés e, por último, um nível profundíssimo onde não temos mais noção de tempo e espaço e ficamos completamente mergulhados num universo desconhecido sem poder exercer um mínimo de controle sobre tudo que acontece nele.
Diria que nossos sonhos habitam águas rasas: são como uma limpeza que nossa mente faz enquanto dormimos. Ela correlaciona os sentimentos do dia-a-dia, faz suas analogias e revela-nos aquilo que precisamos trabalhar, integrar, limpar, deixar ir embora. Claro que existem também os sonhos premonitórios: visões aproximadas de acontecimentos que virão a ser. Mas estes estão num segmento mais profundo da mente. Estou primeiro falando do superficial das nossas águas. Por exemplo, se durante o dia alguém nos magoa e assusta, à noite poderemos sonhar que estamos sendo perseguidos por um cachorro bravo que nos quer morder, atacar, violentar. E onde estava esta imagem que emergiu nos nossos sonhos? Dentro da nossa mente inconsciente, é claro! Ao ser acionada por um evento fora de nós, uma imagem dentro de nós foi chamada para representar o dito sentimento.
No segundo nível da mente estão nossas imagens mentais. Estas que você vê quando faz seus processos de regressão, viagens xamânicas, meditações ou relaxamentos profundos. São representações fotográficas das nossas emoções. É nossa Disneylândia interna!
Mas é no fundo do mar que estão nossas memórias mais longínquas, nossa “Atlântida” com todo seu povo, seus conhecimentos e sua magia. Aí está nosso verdadeiro conhecimento, nossa sabedoria mais antiga de sentir, descodificar e conectar com as forças divinas.
O importante disso tudo é saber que podemos entrar nesses níveis das nossas águas internas porque o inconsciente sempre nos apresentará um barco, um submarino, equipamentos de mergulhados para que, numa metáfora, possamos voltar à flor da água sempre que quisermos.
Repare como nas terapias de vidas passadas sempre aparece uma forma de resgatar um achado que mobiliza as emoções. É a mente salvando e cumprindo sua promessa de nos levar sempre para um porto seguro.
Como o barco que me acolheu em Belém, atravessou o profundo rio e me deixou sair em segurança na outra margem do rio.