Olhos dourados como o tempo...
por Rubia A. Dantés em EspiritualidadeAtualizado em 22/07/2005 11:30:22
Naquele dia a menina de olhos dourados saiu de casa sem pensar na merenda da escola ou no cachorrinho que latira a noite toda... ela saiu simplesmente para passear e foi andando pela trilha que levava à montanha da bruxa...
Nesse dia ela não estava com medo e foi seguindo por aquele caminho que por tantas e tantas vezes imaginou seguir... mas até então ela nunca teve coragem para tanto..
Mas alguma coisa diferente aconteceu durante a noite... tão diferente que a menina nem se deu conta que estava naquela trilha que antes lhe dava tanto pavor...
Foi andando distraída subindo o caminho para a montanha, que ficava cada vez mais íngreme...
A trilha revestida de uma relva verdinha causava uma estranha sensação na menina de olhos dourados como o tempo.
Ao subir... a menina começou a perceber estranhas lembranças... e a rever cenas que de alguma forma lhe eram familiares mas não reconhecidas...
À medida que ia subindo... mais e mais imagens foram vindo... de épocas que pareciam tão antigas que ela não se lembrava de ter visto nem mesmo nos filmes... e alguma coisa ia se modificando no pequeno corpo de menina de olhos dourados... Nada físico... nada que aparecesse aos olhos de qualquer observador comum...
Uma luz começava a girar ao redor do corpo da menina produzindo vórtices e vórtices de energia dourada...
Em um ponto do caminho, a menina parou para descansar e adormeceu ali mesmo na estrada... Um imenso clarão se formou então no céu, e nesse momento um anjo de asas claras surgiu. Pegou a menina no colo e a transportou suavemente para o mundo além das nuvens... e ali, naquela pequena casa das montanhas... onde, contam as lendas, morava uma bruxa... a menina acordou cercada de névoas e de brumas....
A princípio não se lembrava que lugar era aquele e nem como tinha vindo parar ali...
Simplesmente deixou seus olhos dourados passearem pelos moveis estranhos... pelas paredes coloridas e pelas cortinas que... mais escondiam do que revelavam...
Nenhum ruído distraia aquele passeio dos olhos dourados da menina pelo aposento...
Então... muito suavemente... uma música começou a se fazer ouvir... e à medida que os sons iam se tornando mais nítidos, pequenas luzinhas douradas também começaram a enfeitar o ambiente...
A menina ia acompanhado todo aquele movimento de sons e luzes como se também fosse parte de tudo e não se sentiu, em nenhum momento, separada de nada...
E tudo começou a girar... e girar... e girar... até que a casa toda...a menina... as luzes e os sons passaram a girar em harmonia...
A menina se sentia em movimento... mas era uma coisa muito suave de se perceber... parecia uma grande brincadeira estar ali girando... e girando... no meio de luzes e sons e tudo a levava para um tempo e um lugar onde ela se sentia em casa.
Essa era a questão mais forte naquela pequena existência...
Se sentir em casa.
Por mais aconchegantes que fossem os lugares e pessoas... ela nunca se sentira em casa... E ela também nunca soubera explicar porque nunca se sentira em casa... e nem o que era se sentir em casa, uma vez que nunca se sentira... Mas sabia que não se sentira em casa com pessoas e nos lugares até então...
E agora... maravilha das maravilhas... a menina de olhos dourados como o tempo estava finalmente começando a se sentir em casa... Mesmo que esse sentir-se em casa fosse tão louco como estar girando e girando entre nevoas... luzes douradas... sons e uma casa... Mas ela estava se sentindo em casa e se entregou àquela dança maravilhosa....
A dança que levou a menina ao encontro de quem era foi ficando cada vez mais suave...
A casa estava acariciada pelo vento, permeada de névoa e a menina girava em vórtices coloridos de luz...
Tudo foi girando e girando e nesse girar tudo foi sendo elevado a um outro nível de vibração.... mais alto... mais harmonioso... com mais luz...
Até que chegou onde tinha que chegar...
E tudo foi parando de girar devagar... devagar... devagar... até que tudo ficou completamente parado nesse novo espaço de tempo e de Ser.... e a menina de olhos dourados como o tempo não sabia mais onde estava e nem se lembrava mais de quem era... mas se lembrava de muito mais... de muito mais...
Foram vindo as memórias antigas, que antes eram somente vislumbres... agora nítidas e reconhecidas... Ela vivia de novo... ou finalmente, a história que um dia tinha sido escrita para ela...
Sido escrita?
Mas escrita por quem? Quem é o escrevedor de histórias?
E foi assim que ela conheceu o grande escrevedor de histórias...
A porta se abriu de mansinho e a luz brilhante que entrou quase cegou os olhos dourados da menina... mas ela não conseguiu fechá-los por um momento sequer... mais que sonho aquilo parecia a mais bonita das realidades... e Ele entrou devagar... o criador de realidades...
Ele tinha uma cor branca translúcida e luminosa... mas era também feito de amor... de puro amor... e isso se fazia sentir em cada grãozinho de luz que emanava do seu Ser... corpo ele parecia que tinha... mas era um corpo diferente... sem muita forma, mas que... revelava toda forma... era um reluzir de cores e de sons e de cheiros suavissimos... tudo em equilíbrio e em ordem perfeitos... mas em total liberdade... como descrever alguém assim com as palavras que temos aqui disponíveis... não tem como... mas a memória que ele traz está em cada um... e não precisou descrição para que a menina reconhecesse Aquele que cria...
E a porta se abriu por inteiro e revelou a certeza de que ela estava enfim em casa...