Pedido de demissão da vida adulta
por Conceição Trucom em EspiritualidadeAtualizado em 12/08/2002 12:36:27
Venho por meio desta, apresentar oficialmente meu pedido de demissão da categoria dos adultos.
Resolvi que quero voltar a ter as responsabilidades e as idéias de uma criança.
Quero acreditar que o mundo é justo, e que todas as pessoas são honestas e boas.
Quero acreditar que tudo é possível.
Quero que as complexidades da vida passem despercebidas por mim, e quero ficar encantada com as pequenas maravilhas deste mundo.
Quero de volta uma vida simples e sem complicações.
Estou cansada de dias cheios de papéis inúteis, computador, notícias deprimentes, contas, fofocas, doenças, e a necessidade de atribuir um valor monetário a tudo que existe.
Não quero mais ter que inventar “jeitos” para ganhar dinheiro para pagar por coisas que verdadeiramente não necessito.
Não quero mais dizer adeus a pessoas queridas e, com elas, a uma parte da minha vida. Elas ficam, a partir de agora, eternamente vivas no meu mundo da imaginação.
Quero deitar a cabeça em meu travesseiro todas as noites, chamar ao Deus Todo-Poderoso de "Papai do Céu" e “apagar” cinco segundos depois.
Quero ter a certeza de que Ele está mesmo no céu, e que durante o sono nos encontramos e conversamos um monte.
Quero ir tomar café da manhã na padaria da esquina, e achar bem melhor do que um restaurante cinco estrelas.
Quero viajar ao redor do mundo no barquinho de papel que vou navegar numa poça deixada pela chuva. A mesma chuva que me molhou inteira porque continuei brincando na rua.
Quero jogar pedrinhas na água e ter tempo para olhar as ondas que elas formam.
Quero andar me equilibrando nos paralelepípedos como se fosse a grande equilibrista do circo.
Quero achar que as moedas de chocolate são melhores do que as de verdade, porque posso comê-las e ficar com a cara toda lambuzada.
Quero levar duas horas comendo o meu Galack, torcendo para que ele nunca acabe.
Quero ficar feliz quando amadurece a primeira manga, ou quando tenho que colher todas as goiabas para fazer doce na panela de barro.
Quero poder passar as tardes de verão à sombra de uma árvore, construindo castelos no ar e dividindo-os com meus amigos.
Quero voltar a achar que chicletes e picolés são as melhores coisas da vida.
Quero que as maiores competições em que eu tenha de entrar sejam um jogo de cartas, dominó ou fazer túneis na areia da praia ...
Eu quero voltar ao tempo em que tudo o que eu sabia era o nome das cores, dos números de 1 a 10, das cantigas de roda, recitar a "Batatinha quando nasce" e isso não me incomodava nadinha, porque eu não tinha a menor idéia de quantas coisas eu ainda não sabia...
Voltar ao tempo em que se é feliz, simplesmente porque se vive na bendita ignorância da existência de coisas que podem nos preocupar e aborrecer.
Eu quero acreditar no poder dos sorrisos, dos abraços, dos agrados, das palavras gentis, da verdade, da justiça, da paz, dos sonhos, da imaginação, dos castelos no ar e na areia. E o que é mais: quero estar convencida de que tudo isso vale muito mais do que o dinheiro!
Por isso, tomem aqui as chaves do carro, a lista do supermercado, as receitas do médico, o talão de cheques, os cartões de crédito, o contracheque, os crachás de identificação, o pacotão de contas a pagar, a declaração de renda, a declaração de bens, as senhas do meu computador e das contas no banco, e resolvam as coisas do jeito que quiserem. A partir de hoje, isso é com vocês, porque eu estou me demitindo da vida de adulto.
Agora, se você quiser discutir a questão, vai ter de me pegar, porque...
PIQUE! O PEGADOR ESTÁ COM VOCÊ! e, para sair do pegador, só tem um jeito: demita-se você também dessa sua vida chata de adulto, e venha brincar comigo. Vamos andar na chuva sem medo do resfriado.
NÃO TENDO MEDO DE SER FELIZ!
Aqui estão alguns dos nossos mais profundos, sinceros e ocultos desejos.
A simplicidade do universo de uma criança faz muita falta em nossos dias, em nossos corações.
A ambição e o egoísmo acabam sempre se tornando maiores. Nesse estado, julgamos, criticamos e atacamos. Sofremos.
Na pureza de uma criança somos como “O SOL” que irradia luz e alegria para todos, indiscriminadamente.
Por isso, de vez em quando, demita-se!
Ou melhor, viva como se estivesse eternamente demitido de tanta complicação. Comece agora a estudar a possibilidade de enxugar a enorme quantidade de gordura que existe nas exigências da sua vida. Celular? Cartões? Empregada? Faxineira? Seguros? Carros?
Afaste-se das complicações criadas pelo mundo dos adultos. Dos sentimentos mesquinhos e pequenos deste mundo.
E fique mais próximo do único sentimento que realmente vale a pena: a PAZ e vontade de desfrutar a vida, ou seja, brincar.
E viva mais feliz!
CARTA DE DEMISSÃO
Achei extraordinário o seu texto "Pedido de demissão da vida adulta"; e, como aprecio transformar "tudo" em soneto, tomei a liberdade de captar a idéia.
Quero pedir urgente a demissão,
Do compromisso banal de ser adulto,
E me recuso a prestar o velho culto,
De insanidade, problemas e ambição.
Retroceder ao tempo da descontração,
Ir com os ventos, viver cada minuto,
Com a pureza no olhar, sem nada oculto,
Correr na chuva, sorrir, deitar no chão.
Quando o cansaço chegar, dormir profundo,
Ir passear no sonhar, em outro mundo,
Brincar de nuvem, num céu que é colorido.
E extasiado em viver cada momento,
Quero gritar bem alto, aos quatro ventos,
Que desse mundo sem cor, fui demitido.
Martinho Ferreira de Lima