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Saber receber

por Bel Cesar em Espiritualidade
Atualizado em 23/04/2009 18:22:46


Há um ponto da prática de Meditação Autocura Tântrica Ngal So, elaborada por Lama Gangchen Rinpoche, no qual nos visualizamos com a Jóia que Realiza Todos os Desejos, na palma de nossa mão direita. Emanando luzes para todos os seres vivos, visualizamos que todas as suas necessidades e aspirações serão realizadas, sejam elas mundanas ou não. Faça esta experiência. Por um momento usufrua desta possibilidade. O que você sente?

O objetivo desta visualização é manifestarmos nosso potencial latente de uma mente equânime, capaz de oferecer abundância a todos sem qualquer distinção – como o Sol que irradia sua luz sem qualquer preconceito ou favoritismo. Afinal, sabemos que todos precisam da essência da energia espiritual de cura.

Levar nossa mente a este estado de tamanha generosidade e prosperidade nos faz sentirmos ricos, generosos e satisfeitos por estarmos conectados a todos positivamente. Mas, por que cultivamos tão pouco este estado mental se ele nos faz tão bem?

Porque nos parece irreal, fantasioso, arrogante e pretensioso. É interessante notar que enquanto visualizamos “todos os seres” de forma generalizada, tais sentimentos não surgem inicialmente. Mas, no momento em que aproximamos nossa intenção de desejar felicidade à imagem de rostos familiares, algo em nós naturalmente se contrai ou se expande. Quando ativamos nossa memória emocional, facilmente passamos a distinguir entre as pessoas que consideramos amigas, inimigas e as que nos são indiferentes. Desta forma, surgem naturalmente nossos bloqueios e padrões negativos de relacionamento: a desconfiança para receber, a resistência para oferecer e a necessidade compulsiva de dar.

Não é o suficiente saber racionalmente que todos querem ser igualmente felizes para desenvolvermos a sabedoria da equanimidade. Temos que fazer um trabalho interior a fazer para nos desenvolvermos emocionalmente. Precisamos superar a auto-imagem carente, que se sente ao mesmo tempo devedora de algo que nem sabemos bem o que é.

Sentimentos primários de inadequação e insuficiência nos paralisam. À medida que nos sentimos participantes de uma dinâmica fértil de dar e receber, começamos a mudar nossa maneira de nos relacionar. Então, gradualmente, nos tornamos menos resistentes frente ao outro e começamos a sentir a conexão, a afinidade e o calor humano imprescindíveis para o desenvolvimento espiritual.

Em nossa sociedade capitalista, valoriza-se mais ser autônomo e eficiente do que ser humilde e condescendente em prol da harmonia grupal. Desde crianças, somos mais estimulados a agir de forma independente do que a pensar na necessidade do todo. Somos elogiados quando aprendemos a nos virar sozinhos e a não depender da ajuda alheia. Ao mesmo tempo, somos bombardeados pela premissa de que é dando que se recebe. Conclusão: receber é conseqüência ou coisa de quem está necessitado, está dependente e, portanto, é fraco.

Em outras palavras, enquanto dar leva-nos a nos sentirmos prósperos, receber é um sentimento estranho que não sabemos bem onde encaixar: parece que ele atiça com vara curta nosso orgulho e põe em cheque nossa auto-imagem sobre sermos ou não merecedores.

Por exemplo, ficamos felizes quando recebemos apoio incondicional, elogios e presentes ou somos simplesmente convidados e nos deixamos ser servidos. Sabemos intuitivamente que assim também deixamos felizes aqueles que nos oferecem algo. Mas, quando estas vivências se prolongam mais do que nossa capacidade natural de receber, começamos a nos sentir incomodados. Sem nos darmos conta, a memória condicionada pela idéia de que aquele que recebe é o mais frágil e dependente começa a vir à tona. Isso ocorre porque, em geral, prestamos mais atenção naquilo que não estamos conseguindo do que naquilo que estamos realizando.

Para superar esta armadilha, temos que mudar a lógica capitalista que permeia nosso modo de ver a vida. Por exemplo, vendo os relacionamentos como quem faz bons negócios quando só se leva vantagem ou barganhando atenção porque já investiu mais do que o outro na relação.

Negociar a vida nos faz mais pobres, emocional e espiritualmente. Pois no mundo dos negócios a competição não inclui acordos de bem comum, e muito menos reconhece o poder da equanimidade. No entanto, aqueles que desenvolveram esta sabedoria sabem que estamos todos no mesmo barco e, portanto, enriquecer os outros é garantia de sua própria riqueza.

Aquele que leva a vida como um negócio só pensa em levar vantagens, por isso vive se perguntando: “E o que eu ganho com isso?” Para ele, a troca deve ser imediata.

Se quisermos superar a influência capitalista em nosso modo de levar a vida, teremos que abandonar o fluxo de caixa momentâneo baseado no ter para olhar mais de modo mais amplo. Enquanto estivermos condicionados à idéia de que precisamos ter algo para poder consumir a vida - bens materiais, amigos e até uma boa imagem - deixaremos de ser. Nada nos adianta ter e não conseguirmos ser! Só quando deixamos de barganhar com vida e relaxamos no bem-estar de sermos quem somos é que passamos a ter o prazer de co-criar.

Para concluir, segue um bom conselho recebido outro dia de Lama Michel: “O melhor é ter objetivos altos e expectativas baixas!”



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bel
Bel Cesar é psicóloga, pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo Tibetano desde 1990. Dedica-se ao tratamento do estresse traumático com os métodos de S.E.® - Somatic Experiencing (Experiência Somática) e de EMDR (Dessensibilização e Reprocessamento através de Movimentos Oculares). Desde 1991, dedica-se ao acompanhamento daqueles que enfrentam a morte. É também autora dos livros `Viagem Interior ao Tibete´ e `Morrer não se improvisa´, `O livro das Emoções´, `Mania de Sofrer´, `O sutil desequilíbrio do estresse´ em parceria com o psiquiatra Dr. Sergio Klepacz e `O Grande Amor - um objetivo de vida´ em parceria com Lama Michel Rinpoche. Todos editados pela Editora Gaia.
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