Quando o Filho é o Rival
por Flávio Gikovate em PsicologiaAtualizado em 17/03/2003 11:40:18
Uma das coisas mais complicadas da psicologia masculina tem a ver com o que se passa durante a gravidez da mulher. Especialmente quando o homem está sentimentalmente ligado à parceira. Ensinaram-nos a pensar que ficaremos contentes e realizados quando formos pais. Nos filmes a que assistimos, ao receber a notícia, o futuro pai dá pulos de alegria, beija a mulher no rosto e na barriga, levanta-a do chão e os dois rodopiam no ar. Mas não é bem assim na realidade.
Tentamos fazer a mesma coisa, mas a maioria de nós sente mesmo é um frio na espinha. ‘Estou ferrado’, o pensamento fulmina. Alguns homens realmente ficam felizes com a idéia de ser pais, mas o mais comum é se sentir ameaçado. As primeiras sensações de desconforto da mulher são incompreensíveis para o homem, que passa a se considerar um monstro por não estar curtindo a situação. Com o passar dos meses, vai-se conscientizando das razões que determinaram o abalo.
A maior parte das mulheres muda muito durante a gravidez. Nos primeiros meses, elas costumam rejeitar a idéia, e isso se manifesta pelos vômitos freqüentes. A partir do quarto mês, a mulher apaixona-se pela criatura que está dentro dela. Do ponto de vista emocional, torna-se auto-suficiente. É como se ela passasse a amar duas pessoas ao mesmo tempo: o filho e o marido.
O homem, porém, continua a amar apenas sua mulher. O apego do pai à cria só se dará depois do nascimento – ainda assim, com algumas dificuldades. A situação é sentida pelo homem como sendo de inferioridade e insegurança. Ele sente-se menos amado e muito pouco prestigiado em seu novo papel. Sente-se relegado a um segundo plano antes mesmo do nascimento da criança, uma vez que percebe os cuidados da mulher com o filho já durante a gravidez.
Qual a resposta daqueles que são mais imaturos e se sentem rejeitados? Rejeitam também, devolvem na mesma moeda. Começam a chegar mais tarde em casa, ficam nos bares bebendo e chorando as mágoas com os amigos, que nesses casos são sempre solidários. Muitas vezes até se envolvem emocionalmente com outra mulher, uma espécie de revide à ‘traição’ que sentiram.
É importante ressaltar que é esta a razão da freqüente infidelidade masculina durante a gravidez da mulher e que isso não tem nada a ver com o fato da mulher estar gorda e fisicamente menos atraente. Alguns até podem usar isso como desculpa, mas a verdade é que os homens se sentem rejeitados e abandonados pelo fato de suas mulheres ficarem tão ligadas ao feto que está na barriga. Na mente do homem, é como se a mulher tivesse arrumado um amante.
O que torna as coisas mais complicadas é que ele não pode ter as reações de revolta – afinal ela está gerando o filho tão desejado, e ele é quem deve estar ficando louco por se sentir assim rejeitado. Muitos homens ficam mais atenciosos, mas ao mesmo tempo mais indiferentes do ponto de vista sentimental, tentando com isso equilibrar suas contradições internas.
É dessa forma que se iniciam as triangulações amorosas descritas na psicanálise como complexo de Édipo. Para o pai, o filho é sentido como rival antes mesmo de nascer. Na verdade, isso significa que nossa maneira ‘adulta’ de amar está longe de ser madura. Para o homem, sua mulher tem de ser a companheira e também a substituta da mãe que o enche de mimos. Com o nascimento da criança, ele perde o posto de ‘filho’. Se o bebê for do sexo masculino, pior ainda: ele já foi criança e sabe como era apaixonado pela mãe!