A PEDRA DO MESTRE
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Autor Claudette Grazziotin
Assunto AutoconhecimentoAtualizado em 3/22/2004 6:22:21 PM
(Histórias de uma Aprendiz)
Claudette Grazziotin
Na penumbra da sala, sentado em posição de lótus, com voz firme e clara o Mestre falara: “Quero que procurem uma pedra na rua. Qualquer pedra. Porque uma pedra pode conter uma história de trezentos milhões de anos. Uma história que sequer podemos imaginar”.
Ana relembrou que um certo dia, separando algumas pedras recolhidas em uma de suas caminhadas pelas ruas de sua cidadezinha, pegara nas mãos uma delas e estando a observar sua beleza e forma, sentiu a frase surgir dentro de si. Verbalizara-a: “A pedra contém a memória do mundo”. E, aquela pedra lhe mostrava a grandeza do Universo. Ela possuía uma energia, uma força aparentemente inerte. Viu que estava diante de um ser diferenciado, imóvel, mas, como ela, vivo. Um ser cuja muda linguagem emitia sinais e lhe transmitia sensações, sentimentos sutilmente perceptíveis.
Apertou–a entre as mãos e foi como se a pedra e seu coração entrassem em sintonia pulsando juntos, harmonizados. Perguntou-se: “Seria isso, comungar com o mundo?“ Porque já não havia Ana ou pedra, mas, um mundo informe, pura sensibilidade e amor. Chorou.
A voz do Mestre se distanciava à medida que lembrava as pedras que recolhera, lavara, guardara, rejeitara. Pensou na fascinação que sempre tivera por elas desde criança. Nas horas que passara catando–as e enchendo sacos que mal podia arrastar para casa. No prazer que sentia ao quebrá-las, podendo, assim, desfrutar a extraordinária perfeição que escondiam.
Aquelas pedras eram o seu tesouro! Muitas vezes elas foram guardadas em esconderijos espalhados pelo quintal e as manteve seguramente vigiadas por seus aliados, os anõezinhos do pátio que ela descobrira existirem, também, no livro de contos de fada que ganhara de presente no seu aniversário. Cavava túneis secretos e buracos nas encostas dos barrancos porque tinha certeza de que lá, eles moravam. Colocava migalhas de pão, ameixas amarelas e bergamotas para que não lhes faltassem provisões. Camuflava as entradas com pequenos galhos, musgos e pedras. Seus gnomos, assim com os da história de Branca de Neve, também, trabalhavam numa mina que ela possuía.
Ouviu o Mestre repetindo: “Quero que encontrem uma pedra...”. A voz trouxe-a de volta à sala. O encontro terminara.
Ao sair, tomou a direção do ponto de táxi, mas, de repente, no meio do caminho resolveu seguir na direção oposta. Caminhando sem pressa, ia tocando nas poucas e castigadas plantas que compunham a paisagem. Prestou mais atenção na rua tão triste, descuidada, tão diferente das ruas de sua infância, enfeitadas com umas fortes ligustros enfileiradas, dividindo–as. Certa vez, olhando as árvores, perguntara à mãe porque não haviam plantado uma árvore mais florida que a ligustro para alegrar a rua. Ela respondera: “Esta espécie é perene, não perde as folhas no outono e protege constantemente o ambiente, inclusive no inverno”. A importância do “perene”, provocou–lhe um sentimento de muito respeito pelas ligustros a partir de então, ainda que continuasse achando–as “feinhas”. Sua graça maior eram, mesmo, as frutinhas escuras que colhia para travar “guerras” com seus amigos, assoprando-as através dos tubinhos de vidro de anestésico ganhos do dentista.
Além das árvores, o encanto da rua estava no seu chão de pedras soltas, salpicado de pedrinhas brilhantes que pareciam milhares de miçangas espalhadas. Quando o sol refletia nelas, sempre lembrava da cantiga: ”Se esta rua, se esta rua fosse minha...” e ficava envaidecida porque a sua rua era ladrilhada de brilhantes, como a música.
Voltou a pensar no Mestre e na pedra. ”Como poderia encontrar uma pedra em ruas tristemente cinzentas recapadas de asfalto? Haviam sido todas elas asfixiadas, prensadas sob o peso frio e duro daquele piso. Quanta infinita beleza sepultada sob aquela capa sólida...”
Nesta observação introspectiva e atenta, seu olhar deparou-se com uma pedra que aflorava de uma rachadura no asfalto à pouca distância da sarjeta cheia de dejetos e água suja. Estava um pouco escondida pelo pneu de um carro. Sua forma ovalada apresentava tons marrons e beges em ondulantes desenhos rajados. Era, realmente, uma pedra muito exótica. O pensamento foi rápido:
“Minha pedra!“ Entretanto, olhando a sujeira que a circundava, prosseguiu.
A pedra, porém, a escolhera e a força dessa escolha, fez Ana parar, retroceder e se aproximar novamente. Abaixou–se no cordão da calçada, não sem antes imaginar o que estariam pensando dela as pessoas que passavam. Com certa repugnância tocou–a presumindo que estivesse firmemente presa ao solo. Sentiu, surpresa, que estava completamente solta e livre. Apanhou-a. Abriu a bolsa e procurou um papel para embrulhá–la, estava úmida e cheirava mal. Em casa, vencendo o nojo, limpou-a com delicadeza e cuidado. Aos poucos, ela a foi deixando ver sua harmoniosa perfeição. Ana, encantada, deu-se conta do que teria perdido se não tivesse atendido ao seu apelo, agora que a tinha entre as mãos livre das impurezas da rua revelando-se em sua plena beleza.
Encontrara sua pedra exatamente lá no ponto mais imundo do local onde se perguntara: "Como encontrar uma pedra em rua tão diferente da sua linda rua de criança? Lugares feios podem esconder belos tesouros”. Uma voz falara ou falara ela mesma?
Pensou no Mestre. Sentiu-se invadida por uma grande emoção. Ele sabia o que viria quando ordenou: “Quero que encontrem uma pedra na rua, qualquer pedra...”
Teria, também, a pedra, ouvido as palavras do Mestre?
ILUSTRAÇÃO: AS BRUMAS DE AVALON - A TRADIÇÃO DAS FADAS
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