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Encontros e desencontros do Caminho - Final do Capítulo 8 e Capítulo 9 - 1a. parte

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Autor Fernando Tibiriçá

Assunto Autoconhecimento
Atualizado em 2/4/2006 8:33:51 PM


Tentei frear, desviar e, afinal, o impacto com o grupo de cavalos não foi frontal, mas as laterais ficaram muito amassadas. Passamos por eles e não paramos. Muitas viaturas vinham chegando.
Só no hotel, vimos o estrago. Felizmente, ninguém se machucou, nem eu e minha mulher, nem os cães. No quarto, liguei a televisão e vi o Grêmio ser campeão mundial Inter-clubes. Acabou o jogo, dormi. No dia seguinte, fomos a uma exposição internacional e o meu casal de São Bernardo ganhou o que podia ganhar. Voltamos para São Paulo. Foi o caminho.
Quando chegava em Atapuerca, vi uma placa que indicava a direção de um sítio paleontológico, presença do homem naquele lugar há mais de 5 mil anos. Essa pequena aldeia é patrimônio cultural da humanidade. Caminhei até o sítio, mas não encontrei ninguém, todo mundo dormia naquela hora, almoço e siesta. Tirei algumas fotos, passei as mãos nas pedras. Comecei a fazer isso a partir de Santo Domingo. É uma incógnita o que as pedras escondem ou transmitem. Quanta chuva, quanto Sol, quanto vento, quanta neve... Elas se gastam, se desgastam, mas estão sempre lá. Para mim é encantador me deparar com lugares, com essas pedras que estão ali, no caminho, há milhares de anos, mesmo antes de Cristo. Elas olham, meio que o acompanham e você segue numa boa. De onde vieram estas pedras? De outro planeta? As pedras do caminho impressionam. Algumas brilham na sua simplicidade.
Ainda em Atapuera, visitei e fotografei a igreja do povoado, fiz as orações e fui selar a minha credencial no albergue. Selar ou carimbar a credencial é muito importante porque você mostra efetivamente por onde andou. Se você não consegue o carimbo em determinada cidade porque as pessoas estão almoçando ou fazendo a siesta, deve carimbá-la no próximo povoado. Todo peregrino recebe uma credencial de uma associação avalizada pela Oficina de Peregrinos, ligada à catedral de Santiago de Compostela. A credencial pode ser selada nas igrejas, albergues ou hostais ou ainda nos hotéis e oficinas de turismo do caminho.
Ali, encontrei um gaúcho, que era dentista em Portugal, estava voltando a morar no Brasil e fazia o caminho pela terceira vez, agora, para ficar em forma – ele me disse que andava bebendo e queria voltar inteiro. No albergue, havia um grande grupo de espanhóis e franceses, só eu e ele brasileiros. Falamos da vida e da importância do caminho. Para ele, desta vez, o caminho significava ter de volta a boa forma física. Cada um tem seu propósito. Para mim, o importante no caminho era o lado espiritual, religioso, comportamental, político e também a curiosidade.
O dentista me explicou que não se interessava muito pelo universo da igreja porque, principalmente na Europa, a igreja sempre foi dominadora e sabe-se lá o que aconteceu dentro das suas construções. De tudo aconteceu. Na realidade, as obras e a arquitetura eram mesmo esplendorosas, mas as imposições foram muitas e os castigos também. Na Europa, a arquitetura da igreja era sempre bela, tudo muito cuidado, enquanto, no Brasil, destruímos nossa História derrubando ou deteriorando lugares importantes de 100, 50 ou 30 anos.
Entusiasmado, ele me contou que ficou um tempo sem falar com os pais, mas que agora ia para Camburiu, onde eles moravam. Também falei da minha família, do quanto era bom ter uma família, avós, pais, gente querida. Meus pais se esforçaram para dar a mim e a outros dois filhos o melhor possível – se aproveitamos bem ou não, isso era outra história. Bons colégios, bons clubes, aulas particulares, viagens e o carinho da família. Família é muito importante no caminho, mais ainda entre os espanhóis, que são solidários entre eles e valorizam a família. Alguns grupos de peregrinos se comportavam como uma família, mas era uma minoria. Família é uma coisa presente no coração de qualquer peregrino durante o caminho.
Ele contou que estava muito feliz por voltar a morar com seus pais, que o mundo estava complicado e nada melhor do que a terra da gente. Ele também mencionou algumas ocorrências do caminho, disse que havia sido roubado em um albergue, sua pochete tinha sumido, nada importante dentro. Depois desse incidente, passou a levar seus documentos ao banheiro, ao banho. Parece que o perfil dos peregrinos estava mudando e, pelo jeito, vai mudar ainda mais: ex-presidiários, drogados em programa de recuperação, andarilhos mal intencionados e oportunistas vinham se misturado aos peregrinos e turistas usuários dos albergues, tornando tudo muito vulnerável.
Quando entrei no albergue a convite dele, notei que as áreas eram minúsculas, o dormitório tinha dezenas de beliches lado a lado e o banheiro, um espaço super exíguo, apenas dois chuveiros, duas privadas e duas pias para todos. Realmente, um sufoco. Uma coisa são 30, 40, 50 peregrinos com um mesmo propósito, outra coisa é você não saber quem está dormindo ao seu lado ou de olho em você.
Por isso, os números de pousadas, hostais, pequenos hotéis e pensões crescem por todo o caminho. E os valores mudam. Os albergues estavam ficando caros por causa da quantidade de pessoas e as outras opções estavam ficando mais caras ainda. Mas nada muito exagerado: eu gastei em média entre 20 e 40 euros para me hospedar em um quarto com banheiro próprio. Havia albergues cobrando mais ou menos a metade disso por pessoa, mas sem oferecer privacidade, conforto ou segurança. Mas cada um é cada um. O que vale é o caminho agora, caso contrário, as dificuldades aumentarão. De qualquer jeito, o caminho está lá para ser feito e espera por você. Eu voltarei ao caminho.

Capítulo 9
Após Atapuerca, o sol era forte, o caminho, árido e a pouca sombra me preocupava. Sabia que passaria por etapas com bem pouca vegetação. Me lembrei dos filmes no deserto, na África ou em regiões áridas. Como já contei, eu quase fui parar na África como mercenário. Desistiria na primeira semana. Na época, a briga na África era entre governos corruptos, restantes de colonizadores europeus e aventureiros. O recrutador maior se chamava Steiner e foi enforcado em 1978 por Gaafar Numeiry, presidente do Sudão. Já pensou, passar todo aquele calor e morrer enforcado no Sudão? No mesmo Sudão onde se travam, atualmente, guerras étnicas e religiosas e o mundo não faz nada para ajudar. No caminho, quando me lembrava dessas histórias, me via como uma espécie de Brancaleone ou ainda como um Don Quixote de araque.
Na real, os mercenários não existem mais. Empresas super organizadas agora prestam esse tipo de serviço terceirizado. O mercenário romântico desapareceu. Hoje, são estudiosos, aplicados, usuários de alta tecnologia, têm um desempenho melhor do que as forças regulares e podem cometer crimes ou qualquer barbaridade sem punição. Afinal, sendo terceirizados, agregam gente de todo o mundo sem uma única bandeira. Eles lutam pela bandeira que os contratar e pagar melhor. E os mercenários matam se quiserem porque os contratantes ficam isentos de responsabilidades, afinal, num confronto, quem está matando são pessoas de países não diretamente ligados ao conflito. Que os maus governantes se cuidem e que os países arrogantes ou prepotentes se preparem porque, com alguns milhares de dólares, se pode ter uma força respeitável na sua captura.
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