O Revanchismo e a Espiritualidade
Atualizado dia 2/21/2007 4:29:12 PM em Autoconhecimentopor Fernando Tibiriçá
Em janeiro de 2006 escrevi sobre a doação da arrecadação de meu livro "Encontros e Desencontros do Caminho", para uma instituição (C.O.T.I.C.) que cuida do atendimento das crianças que são vítimas da violência em suas próprias casas e no meio de suas famílias. Na época, a campanha era a favor de um menino cujos pais tinham tentado afoga-lo numa banheira. É impossível acreditar, mas aconteceu. E acontece. Meu primeiro impulso foi achar os pais e fazer o mesmo que fizeram com o filho. Alguma coisa mexeu no meu interior e achei melhor deixar a punição para as autoridades que colaboram com a instituição. Mesmo assim, fiquei com a raiva do revanchismo, pois a mãe estava detida, mas o pai se encontrava foragido. Não sei o que aconteceu com os pais mas o menino continua vivo e viverá seu últimos dias numa U.T.I. sob cuidados médicos e o carinho de Deus. E os pais?
Só me controlei quando li, num livro, um comentário do Dalai Lama falando sobre um monge tibetano que viu sua família ser morta pelos chineses e passou vinte anos numa prisão. Quando solto foi questionado sobre se teria sentido medo. Disse que sim. Sentiu medo de perder a compaixão pelos chineses. É uma maneira de pensar diferente e difícil de entender por nossa parte, ocidentais, individuais e solidários no oportunismo.
Neste momento o noticiário mostra um garoto que foi arrastado por um automóvel dirigido por jovens-garotos; afinal, ter 16 ou 18 ou 20 ou 22 anos é tudo a mesma coisa. A diferença existe na pena ou punição. E na superlotação de nossos presídios, pois quase 80% dos mandados de prisão não são cumpridos pela falta de espaço nas cadeias e prisões. É o mal saindo vitorioso porque, mesmo a espiritualidade mais elevada não conseguirá vagas no sistema penitenciário e compreensão da coletividade que mostra pouco interesse na solidariedade, porque ninguém quer perder a vantagem obtida com a marginalidade.
Um homem matou e estuprou uma menina de 4 anos. Foi neste carnaval de 2007. Se for condenado dificilmente se recuperará em nosso sistema carcerário. E gozará de vantagens com nossas leis, podendo estar solto em alguns anos. Qualquer ser humano vai querer a revanche e não vai entender se falarmos em espiritualidade e compaixão.
As pessoas destroem famílias, inclusive as próprias e nada acontece. A família é a referência de vida. É o acordar no acordo de Deus. A família somos nós, parentes, amigos e amigas, colegas, vizinhos, enfim, a comunidade em que vivemos. Se destruirmos este laço, onde vai parar o nosso coração? Como trabalharão as nossas mentes? A partir deste momento, com a espiritualidade questionada, nasce a esperança no revanchismo.
Recentemente, uma catadora de lixo (de um aterro sanitário no Rio de Janeiro) foi convidada para um encontro num país africano para falar sobre os menos privilegiados, para os menos privilegiados do mundo. Numa entrevista deu para perceber que a catadora sabia se expressar bem e tinha a espiritualidade em seu coração, mostrando compaixão com seus colegas. Falou com nítida convicção que ser catadora de lixo deveria ser uma profissão como outra qualquer.
Fiquei envergonhado com diplomas e títulos que muita gente tem, mas não consegue ter a solidariedade e humildade das palavras que ouvi da catadora. Somos catadores ao procurarmos contas a pagar, cartas de amor, documentos, conselhos, beijos, abraços, carinho e etc... No caso da catadora, seus companheiros são urubus que dividem o espaço com seus colegas (outros catadores).
Somos a maior nação espírita do mundo, o maior país católico apostólico romano do mundo, um dos maiores países cristãos do planeta, temos uma mescla de religiões e doutrinas pouco encontrada em outros países e, mesmo assim, não conseguimos impedir o crescimento dos instintos que levam à barbarie. Nossa sociedade tem os que já sabem o que fazer e os que não querem fazer, mesmo sabendo o que têm a fazer.
Agora vão gastar, ou já gastaram, milhões e milhões de reais nos Jogos Panamericanos de 2007, que irão acontecer numa cidade deteriorada moralmente, fisicamente e espiritualmente. É o aval para o mundo sobre a incompetência de nossas autoridades. Será que este dinheiro não poderia ter um destino melhor? Será que as pessoas de bem, religiosos, ONGs, pensadores, gente de espiritualidade e otimismo avançados, foram consultadas no Rio de Janeiro e por todo o Brasil?
A catadora de lixo, que é carioca, gostaria de trabalhar numa área cercada, protegida, com máscara, luvas, serviço médico e sindicato. Deus, arcanjos e anjos já estão com ela, seus colegas e até com os urubus que, neste caso, são bons companheiros.
Leia:
"Fato Luminoso" (17/12/2006)
"Corpo a Corpo" (08/11/2006)
“Vem aí o Bolo da Vergonha” (08/11/2006)
“Muita Atenção!” (08/11/2006)
“A Ironia do Álcool” (24/09/2006)
“Saudades da Família” (12/09/2006)
“O Partido de Deus enfrenta o Diabo” (09/08/2006)
“Você conhece a do “brasileiro”? Eu tenho 6 para contar...” (14/07/2006)
“Política e Espiritualidade” (21/05/2006)
“A Caminho de Santiago de Compostela” (26/03/2006) - especial atenção com a parte 2 que fala sobre o Oriente Médio.
“O Futuro da Terra” (18/02/2006)
“Epidemia Incontrolável: Alerta Geral!” (04/02/2006)
“Encontros e Desencontros do Caminho” - desde a introdução (29/01/2006)
Texto revisado por Cris
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