Tirando pedaços de mim...
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Autor Fernando Tibiriçá
Assunto AutoconhecimentoAtualizado em 10/07/2008 00:38:33
Numa das noitadas do Manga Rosa, em fevereiro de 2000, eu estava na cabine de som, como costumo ficar sempre. De repente, me virei bruscamente sem perceber uma viga atrás de mim e bati a cabeça. Contrai os ombros e, num movimento brusco, “esgarcei” o ombro esquerdo, uma tal de cérvicobralguelgia, em outras palavras, uma lesão no trapézio esquerdo. Como estava aquecido, embora um pouco dolorido, não dei atenção. 48 horas mais tarde, estava em um ortopedista recebendo medicamentos, um colar ortopédico e uma lista de remédios e cuidados. No meio disso tudo, um remédio à base de morfina.
O Manga Rosa ia comemorar seu primeiro aniversário. Eu, juntamente com todo o time do Manga, preparava uma grande festa, que seria realizada no topo da Aldeia da Serra, à beira de um lago, com pista de dança, tendas, bares, raio laser etc etc etc. Como a direção do evento era minha, fui ao local para acompanhar a produção como se eu não tivesse me machucado, como se não houvesse nada. Ao invés de guardar repouso, trabalhei normalmente. No início de março, no alto da montanha, o calor era muito grande. Trabalha aqui, toma remédio ali, não percebi o que estava acontecendo.
A festa estava programada para sábado, 18 de março. A terça, 14, era véspera do meu aniversário e eu já não conseguia me mexer. Sentia fortes dores no ombro e no peito esquerdo e no lado direito do abdômen. Meu intestino não funcionava corretamente. Pensei numa lavagem intestinal, que ficou para o dia seguinte. Na madrugada de terça para quarta, fui acordado pelo meu filho e por sua namorada cantando parabéns para mim. Bolo e vela. Apaguei e apaguei. Dia seguinte, tentei retomar o ritmo, mas estava difícil. Procurei pelo meu ortopedista, mas ele estava em um congresso em Miami. Na quinta, 16, não agüentava mais. Comecei a delirar, vi pessoas estranhas querendo tirar pedaços do meu corpo. Liguei para o médico, mas ele ainda não tinha voltado de viagem. Um assistente me disse para eu ir ao pronto socorro do Sírio Libanês e procurar um médico conhecido. Ele veria o que estava acontecendo.
Já era noite. Um clínico geral me atendeu e eu pedi uma lavagem intestinal. Ele me disse que um médico logo me veria. Pouco depois, entra o dr. Marcelo Averbach, que me examinou, pediu uns raio-x e me disse para eu dormir no hospital. Fui internado, meu filho comigo, apreensivo. Nada de lavagem intestinal, graças a Deus, porque, senão, eu teria morrido. Às 6h da manhã de sexta, 17 de março, uns enfermeiros entraram no quarto para me preparar para uma operação. Falei que era engano, que não era comigo. Eles se entreolharam e acharam melhor chamar a enfermeira chefe. Alguma coisa estava errada.
A enfermeira chegou e me pediu desculpas pelo fato de não terem me avisado da operação. Pedi para falar com o dr. Marcelo, que logo foi chamado. Quando ele entrou no quarto, esfreguei uma mão na outra, como sempre faço quando estou animado, e perguntei a que horas teria alta. Disse ainda que tinha que voltar rapidamente para a produção da festa de um ano do Manga Rosa. Ele me olhou e calmamente confirmou que eu não sairia do hospital e que me lembrasse do caso do presidente Tancredo Neves.
Gelei. Meu filho Rodrigo quase desmaiou e os enfermeiros passaram a se preocupar com ele. O diagnóstico era um só: diverticulite.
Na verdade, só percebi a gravidade da situação quando comecei a sentir as dores do lado direito do abdômen. Como havia tomado muita morfina por causa do trapézio esquerdo, o remédio acabou mascarando a diverticulite. Agora era tarde. Fui operado. Quase morri. Quando acordei, me informaram que teria que usar uma bolsa, colostomia. Fiquei arrasado. No dia seguinte, fui tomar meu primeiro banho e vi a tal da bolsa pendurada no meu abdômen. Olhei no espelho do banheiro e realmente vi a morte. Ela estava ali comigo.
Fui à luta, em busca da recuperação. Foram dias e dias no hospital e mais três meses em casa. Consegui reverter a situação com muita paciência e ajuda do meu filho, dos meus irmãos, da minha família e amigos e da equipe médica e, principalmente, de Deus. E também com uma nova operação, que foi um sucesso. Perdi uma parte do intestino, mas fiquei bom, sem a bolsa. As dores no ombro só foram corrigidas com fisioterapia, johrei e muita reza. Tempos depois, com o Rolfing, aplicado por uma especialista chamada Nádia, consegui a cura completa do problema no ombro. Do intestino, ficaram marcas, cicatrizes e enormes despesas financeiras... (trecho extraído do livro "Encontros e desencontros do Caminho" - Fernando Tibiriçá)
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