Aprenda a viver, caminhando. Aprenda a caminhar, vivendo...
Autor Alex Possato
Assunto EspiritualidadeAtualizado em 7/11/2013 7:42:10 AM
Caminhando e cantando, e seguindo a canção.
Somos todos iguais, braços dados ou não.
Geraldo Vandré
Acabo de voltar de uma caminhada preparatória para o Caminho de Santiago de Campostela. Eu e minha amada, junto com um grupo de mais de quarenta pessoas, estivemos, durante, três dias, caminhando, caminhando, caminhando... Andamos cerca de cinquenta quilômetros. Gente de todos os tipos, todas as idades, profissões, credos, motivações e experiências diferentes, andando juntas, lado a lado, passada a passada.
Eu caminho pelo reencontro com minha fé. E com o poder criador que creio firmemente estar ao meu dispor, quando estou conectado com o Supremo. Lembro-me que desde pequeno, caminhava com o meu avô Orlando, quilômetros, indo até a represa de Suzano, percorrendo a estrada de ferro, e voltando... Passávamos quase o dia inteiro nesta andança... Depois, já adulto, encontrei no livro de Paulo Coelho, o Diário de um Mago, a primeira inspiração para fazer o caminho de Santiago – que ainda não realizei, rota milenar de peregrinos, atravessando toda a Espanha, desde a França, até o túmulo de São Tiago, apóstolo de Cristo. Nesta época, eu já havia feito o caminho inca, trilha super difícil que atravessa os Andes numa altitude entre três a quatro mil metros, chegando até as ruínas de Machu Pichu, no Peru. Naqueles tempos, eu muito jovem, farrista e descrente, não havia percebido a magia e o mistério daquela jornada. Mas foi neste caminho que conheci minha primeira mulher, uma estrangeira que o universo colocou em meu caminho para ser a mãe de meus dois filhos, trazer muitos aprendizados e ensinar-me a arte de ser terapeuta sistêmico.
Já nesta última jornada, no sul de Minas Geraes, lá estava eu com minha amada, a representação do sagrado feminino que mais uma vez o Universo me concede o privilégio de ter ao lado. O feminino que me ensina o dom da paciência, do cuidado, do equilíbrio, da constância...
A jornada da vida nos desperta a fé
Diz a antropologia que o planeta Terra foi povoado através de longas jornadas, realizadas a pé pelo homem primitivo. As grandes conquistas de Alexandre, César, Napoleão, Gengis Khan, foram a pé. O império persa, os árabes e os povos bárbaros fincaram raízes na Ásia e Europa, andando... Sabemos que o Brasil foi desbravado através das entradas e bandeiras, excursões realizadas em sua maioria pela força das pernas e vontade humana. Andar, viver e construir, guerrear e trazer a paz, portanto, faz parte do DNA humano.
Com a evolução da consciência humana que ocorre em paralelo com a evolução da nossa espécie, percebo hoje que a guerra é outra: estamos em luta dentro de nós mesmos, dominando os instintos distorcidos, combatendo a preguiça, o medo, a dúvida, e buscando forças para fazer o que viemos fazer neste mundo. Queremos e merecemos viver alegres, produtivos, prósperos, felizes, já que somos feitos a imagem e semelhança de Deus, que é “tudo de bom”, não é mesmo? Por isso, é preciso orar. Orar e caminhar. Agir. Percebo que sem a ajuda da nossa parte interna, conectada com o divino, essa jornada fica árdua demais, o caminho lento, íngreme e espinhoso, e principalmente, se em algum momento eu tiver que estender a mão para auxiliar alguém, não estarei pronto.
Não nos enganemos. Este mundo possui desafios, assim como a caminhada possui pontos bem difíceis. Mas todos estão aptos a caminhar. Nesta última viagem, tinha senhores e senhoras de mais de 70 anos de idade. Andando em seu ritmo. Todos ficam com dores, uns mais, outros menos. Havia os que falavam sem parar. E os calados. Os alegres e os instrospectivos... Mas era notório: todos que andavam reluziam em seus rostos o brilho da ação, da motivação, do esforço e da satisfação do objetivo alcançado. Mas mesmo o objetivo é transitório. No dia seguinte, começa tudo de novo. Não há vencedores nem derrotados. Até os que pararam, fazem parte da jornada. Assim como eu, algum dia, também não estarei mais caminhando...
Percebi que o corpo, enquanto andamos, tem o seu ritmo. Ele se move, do seu jeito, no seu passo. O problema surge porque a mente não está andando “de mãos dadas” com o corpo. Não respeita seu próprio ritmo, fica se comparando com os outros, deixa ser dominada pelas emoções distorcidas, seja o medo que paralisa ou a euforia que faz exagerar e se perder. Se abate pela preguiça e pelo cansaço. Quer fugir das dores inevitáveis da jornada. Não respeita as lideranças nem as ordens dadas no caminho. A mente “se acha”! Assim, é exatamente esta mente que precisa buscar Deus. Buscar centrar-se na parte interna que está em equilíbrio, conectada com o corpo, com o espaço ao redor e com os companheiros do caminho. A nossa vida nada mais é do que uma jornada de retorno ao Pai Criador e à Mãe Divina... que estão dentro de nós. É preciso ultrapassar a barreira que a própria mente cria, seja porque teceu fantasias a respeito de Deus, do bem e do mal, ou vive com tantas neuras que não consegue perceber a perfeição de tudo e de todos.
O poder criador surge
Domesticada, a mente vira o servo. Algo superior comanda, e ela obedece. Humildemente. É neste estágio que “as coisas começam a acontecer”. Sutilmente, tudo “começa a dar certo”. A velocidade entre aquilo que você traça como meta e a resposta que o Universo lhe dá é surpreendente. Tomar posse do poder criador que o Universo concede vem através de exercício: mente, corpo e espírito precisam estar totalmente alinhados com o Criador. Domesticar seus pensamentos e emoções, controlar a própria energia e acessar a intuição é um caminho longo, de acertos e erros. Não há outra forma. Quando você começa a se perceber dominando a si dentro do caminhar, tem ganhos, mas o ganho não tem mais tanta importância, porque o seu trabalho é continuar a caminhar. “Eu descanso caminhando”, me disse uma senhora de 78 anos de idade, que já havia feito o caminho de Santiago duas vezes, e estava ao meu lado, passo a passo, continuando, fazendo a parte que o Universo lhe concedeu como dádiva. Honrando o seu corpo, que já apresentava os sinais do cansaço, das dores e da velhice... Mas lá estava ela, continuando, continuando...
Creio firmemente que o mais importante é servir e caminhar. Cada um do seu jeito. Cada um no seu passo. Cada um com seus dons e talentos. Basta caminhar. A paisagem é muito bela. E os companheiros que estão caminhando são lindos. Todos eles.
Avaliação: 5 | Votos: 3
Terapeuta sistêmico e trainer de cursos de formação em constelação familiar sistêmica E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Espiritualidade clicando aqui. |
