DO MUNDO VIRTUAL AO ESPIRITUAL
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Autor Vicente Romano Mattos
Assunto EspiritualidadeAtualizado em 31/10/2008 16:24:04
De: Frei Betto
Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete,
da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos,
recolhidos em paz em seus mantos cor de açafrão. Outro dia, eu
observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera
cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos,
geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado
café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro
café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: Qual dos dois
modelos produz felicidade?
Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e
perguntei: Não foi à aula? Ela respondeu: Não, tenho aula à
tarde. Comemorei: Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir
até mais tarde. Não, retrucou ela, tenho tanta coisa de manhã...
Que tanta coisa?, perguntei. Aulas de inglês, de balé, de pintura,
piscina, e começou a elencar seu programa de garota robotizada.
Fiquei pensando: Que pena, a Daniela não disse: Tenho aula de
meditação!
Estamos construindo super-homens e supermulheres, totalmente
equipados, mas emocionalmente infantilizados. Por isso as empresas
consideram agora que, mais importante que o QI, é a IE, a
Inteligência Emocional. Não adianta ser um superexecutivo se não se
consegue se relacionar com as pessoas. Ora, como seria importante os
currículos escolares incluírem aulas de meditação!
Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960,
seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta
academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar
o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do
espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: Como estava o
defunto?. Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite! Mas como
fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade
amorosa?
Outrora, falava-se em realidade: análise da realidade,
inserir-se na realidade, conhecer a realidade. Hoje, a palavra é
virtualidade. Tudo é virtual. Pode-se fazer sexo virtual pela
internet: não se pega aids, não há envolvimento emocional, controla-se
no mouse. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma
amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu
vizinho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual, entramos na
virtualidade de todos os valores, não há compromisso com o real! É
muito grave esse processo de abstração da linguagem, de sentimentos:
somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais.
Enquanto isso, a realidade vai por outro lado, pois somos também
eticamente virtuais...
A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o
refinamento do espírito. Televisão, no Brasil - com raras e honrosas
exceções - é um problema: a cada semana que passa, temos a sensação
de que ficamos um pouco menos cultos. A palavra hoje é
entretenimento; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização
coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta
no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a
publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que
felicidade é o resultado da soma de prazeres: Se tomar este
refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa, comprar este
carro, você chega lá! O problema é que, em geral, não se chega! Quem
cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba precisando de um
analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.
Os psicanalistas tentam descobrir o que fazer com o desejo dos
seus pacientes. Colocá-los onde? Eu, que não sou da área, posso me
dar o direito de apresentar uma sugestão. Acho que só há uma saída:
virar o desejo para dentro. Porque, para fora, ele não tem aonde ir!
O grande desafio é virar o desejo para dentro, gostar de si mesmo,
começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento
globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor.
Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis:
amizades, auto-estima, ausência de estresse.
Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Se alguém vai
à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma catedral, deve
procurar saber a história daquela cidade - a catedral é o sinal de
que ela tem história. Na Idade Média, as cidades adquiriam status
construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping
center. É curioso: a maioria dos shopping centers tem linhas
arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de
qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingos. E ali
dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças
de rua, sujeira pelas calçadas...
Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno,
aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos,
todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo,
acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista,
sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a
crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se
não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente,
terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa,
com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do McDonalds..
Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas:
Estou apenas fazendo um passeio socrático. Diante de seus olhares
espantados, explico: Sócrates, filósofo grego, também gostava de
descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando
vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: Estou apenas
observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz.
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Massagista, Reflexologia, Acupunturista, Mestre em Reiki, trabalho com Aletiômetro. Sou facilitador da E.F.T. (Técnica de Tranformação Emocional) conhecida também como acupuntura emocional sem agulhas e ministro palestras, cursos e atendo pessoalmente com hora marcada. E-mail: [email protected] | Mais artigos. Saiba mais sobre você! Descubra sobre Espiritualidade clicando aqui. |