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Autoconhecimento
Biodiversidade Psíquica
por Marco Moura
Vivemos sob a ilusão de que a poluição é algo do lado de fora — fumaça, plástico, esgoto. Mas o mundo externo é só o espelho. Há uma névoa mais sutil, tóxica e insistente que se instala nos corredores internos da mente. São pensamentos recorrentes, emoções mal digeridas, impulsos compulsivos que se reciclam sem que percebamos. E nos tornamos paisagens desmatadas por dentro.
Cada pensamento tem seu ciclo de vida. Mas ao invés de completá-lo, acumulamos. Arquivamos ressentimentos como quem empilha entulho no fundo do quintal. Falta compostagem emocional. Falta espaço para que o velho se dissolva e o novo possa brotar.
Nosso mundo interno também é feito de espécies. Algumas estão em extinção: o silêncio profundo, a escuta genuína, o entusiasmo sem propósito. Outras são invasoras: a pressa, a comparação constante, o excesso de opinião. Quando não cuidamos da biodiversidade psíquica, o que sobra é monocultura — uma mente árida, com pouca variação de paisagem.
E o pior: achamos isso normal. Chamamos de “maturidade” o embrutecimento. De “produtividade” a compulsão. E de “realismo” a desistência dos nossos
sonhos mais férteis. Vamos substituindo nossa floresta interna por cimento, pouco a pouco, achando que estamos evoluindo.
Mas há caminhos de recuperação. Como florestas regeneradas, é possível recuperar áreas da mente que já pareciam mortas. Basta trazer consciência. Observar. Não reagir imediatamente. Deixar o pensamento decompor-se no silêncio. Como folhas que viram húmus, há ideias antigas que precisam morrer para adubar a próxima estação.
Não é sobre forçar uma pureza mental. Idealizar seria outra armadilha da mente. Mas reconhecer os ciclos, permitir quedas de folhas, invernos emocionais e podas necessárias já é um começo. Talvez o que nos falte não seja mais um plano de metas, mas uma restauração ecológica interior por meio do autocultivo.
Só quem faz contato com sua própria floresta viva entende que existe uma inteligência orgânica operando por trás de tudo. E que sabedoria, às vezes, é saber sair do caminho — como o jardineiro que aprende a podar menos e observar mais.
Texto Revisado
Atualizado em 4/16/2025
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